Filomena Fontes, in Jornal Público
Presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social, D. José Alves, diz que os cristãos têm direito ao respeito por parte do poder político
As recentes críticas da Igreja ao Governo voltaram ontem a pairar na abertura da Semana Nacional da Pastoral Social, que decorre até quinta-feira em Fátima. E levaram mesmo Maria José Nogueira Pinto a exortar as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) ligadas à Igreja Católica a contratualizarem com o Estado "uma carta de princípios", sob pena de se avizinharem conflitos.
"Temos de ser agentes de Deus no reino de César. Temos de fazer com César um contrato de parceria, mas estabelecendo uma carta de princípios. Temos de nos deixar de negociações casuísticas", defendeu a ex-provedora da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, enquadrando a proposta naquilo que qualificou como "uma verdadeira parceria público-privada".
"No sistema da segurança social, o braço da solidariedade é grandemente contratualizado com as IPPS e as misericórdias, assenta numa rede de matriz cristã e, muitas vezes, esta rede não pode impor ao Estado os seus valores", explicou ao PÚBLICO Maria José Nogueira Pinto. A título de exemplo aponta os casos da eutanásia, da adopção por casais homossexuais ou as salas de injecção assistida, que poderão vir a ser aprovadas por lei na Assembleia da República e que confrontariam as IPSS e as misericórdias com novos problemas.
"Não podemos viver sistematicamente na objecção de consciência", observa Maria José Nogueira Pinto, considerando que se a relação entre as instituições e o Estado ficar contratualizada, tudo fica mais claro. "Se não houver clareza, geram-se equívocos", anota.
A ex-provedora faz questão de sublinhar que não se trata de condicionar a definição de políticas públicas, que cabem ao Estado, mas sim acautelar "um conjunto de princípios, que constituem um núcleo de valores, que não são negociáveis".
O encontro de Fátima ocorre dois meses depois de a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) ter dirigido sérias críticas ao Governo, acusado de falta de diálogo, em áreas como a educação, a solidariedade social e a regulamentação da concordata. Dois dias depois, José Sócrates reunia-se com a presidência da CEP, dissipando o atrito com a Igreja católica.
Ontem, o presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social, D. José Alves, regressava indirectamente ao tema, ao afirmar não ser intenção dos cristãos, que intervêm na acção social, "impor aos outros" as suas opções. Todavia, frisou, os cristãos consideram-se com "o direito de serem aceites e respeitados pelos outros, inclusive pelo poder político".
Na sua intervenção, Maria José Nogueira Pinto balizou a intervenção das IPSS. "Não vamos perguntar a quem precisa o que é que pensa de Deus. O cuidar de alguém não tem guichet, não tem horário, mas tem preocupação permanente", afirmou.
Também o presidente da CEP, D. Jorge Ortiga, apelou a um testemunho de fé por parte de todos os membros das IPSS. "Não devemos ter medo de falar de Cristo. Só o humanismo integral consegue proporcionar condições de felicidade autêntica", disse. Com Lusa
Nogueira Pinto deixou o alerta aos agentes da Igreja: "Temos de nos deixar de negociações casuísticas" com o Estado


