26.10.07

O povo mais desconfiado da Europa Ocidental

Leonor Paiva Watson, in Jornal de Notícias

Portugueses desconfiam do Estado. A economia reflecte isso, diz João Loureiro


Os portugueses são o povo mais desconfiado da Europa Ocidental e este sentimento "é mensurável e afecta a economia e a sociedade em geral", concluem dois economistas franceses no seu mais recente livro, denominado "A Sociedade da Desconfiança", que visa vários países. A obra cita um estudo da OCDE que, entre outras coisas, concluiu que 20% dos portugueses entendem que para se alcançar algum sucesso é preciso ser corrupto.

Os portugueses são ainda dos mais desconfiados segundo uma outra sondagem realizada, entre 1990 e 2000, pela «World Values Survey», também citada no livro, que inclui os países membros da OCDE, nomeadamente os EUA, Japão, Austrália e Canadá. Apenas os turcos conseguem ser mais desconfiados do que nós. Ao contrário, os suecos são o povo com mais confiança nos outros e nas suas instituições. O livro não se reporta à realidade portuguesa exclusivamente, mas deixa o aviso de que esta desconfiança prejudica a economia e a sociedade de forma transversal.

"Nos países onde há muita burocracia, há mais desconfiança. Desconfiam os cidadãos e as empresas do Estado; e desconfia este dos outros. Este determina a burocracia a cumprir e isto implica custos. Com estes custos, chegam os serviços e bens a preço mais elevado. O cidadão fica descontente e toda a gente paga o preço da desconfiança. Depois, associada à burocracia está apequena corrupção. Isto contraria o crescimento económico, paralisa a concorrência e gera mais desconfiança. Um outro exemplo desta pequena corrupção é que a maioria dos empregos são conseguidos através da pequena cunha", explicou o economista João Loureiro.

Para o sociólogo Ivo Domingues o assunto não é visto de uma perspectiva muito diferente. "Há uma ligação profunda entre a produção de leis, a sua fiscalização e o seu juízo, que cria disfunções e gera desconfiança. Imagine um candidato a uma promoção de carreira que sente que alguém lhe passou à frente por questões exteriores ao mérito. Ele pode recorrer às instâncias judiciais, mas o assunto pode levar de dois a quatro anos a ser resolvido. O que é que acontece? O concurso acaba por ficar sem efeito material e as instituições que precisam de quadros mais qualificados acabam por não os ter. O empregado, sabendo disto e sabendo que terá que trabalhar sentindo-se desprotegidos perante colegas e chefias, não recorre. Esta desconfiança gera subordinação".

Diplomatas abusam da imunidade

Diz o estudo da OCDE, referido no livro "A Sociedade da Desconfiança", que - segundo o comportamento registado entre os diplomatas de 146 países nas Nações Unidas no que respeita ao cumprimento das regras de trânsito,entre 1997 e 2005 - os diplomatas portugueses foram os que mais infracções cometeram mas beneficiando de imunidade.


Pouco cívicos e dados a ilegalidades

Os portugueses não são os menos cívicos, mas apenas são ultrapassados por mexicanos e franceses, ocupando também a terceira posição entre os povos que acham legítimo receber apoios estatais indevidos (baixas por doença, subsídios de desemprego etc.), adquirir bens roubados ou aceitar favores no exercício das suas funções.