10.2.23

Novo apoio à renda para quem perde rendimento


David Dinis e Rita Dinis, in Expresso

Governo cria incentivos ao arrendamento de casas devolutas e em Alojamento Local. E avalia dados sobre renegociação de créditos

O Governo vai anun­ciar um novo “mecanismo permanente de apoio à renda” para famílias com quebras de rendimentos. A medida, sabe o Expresso, vai fazer parte do novo pacote legislativo sobre habitação em que o Governo está a trabalhar e que vai aprovar no Conselho de Ministros da próxima quinta-feira, 16 de fevereiro. A ideia é garantir que nenhum jovem ou família, no balanço entre os rendimentos e a prestação da casa, veja disparar a sua taxa de esforço caso tenha uma quebra abrupta de rendimento motivada por situações como divórcio, desemprego ou doença. A medida aplica-se ao arrendamento. Para as prestações do crédito à habitação, que têm disparado apesar da obrigatoriedade dos bancos de renegociarem com os clien­tes, o Governo está ainda a estudar os dados do Banco de Portugal sobre o impacto real da subida das taxas de juro nas prestações, sendo que os dados mais recentes têm indicado que apenas 8,8% das famílias com baixo rendimento têm crédito à habitação.

António Costa sabe que a dicotomia existe: a economia cresce (6,7% no ano passado) e a taxa de empregabilidade aumenta, mas muitas pessoas vivem cada vez mais aflitas com a subida das taxas de juro. No seu entender, contudo, “não há nenhuma contradição” entre as duas realidades, como disse no Parlamento. “O mecanismo de renegociação [com os bancos] está em vigor, mas temos um Conselho de Ministros sobre habitação e não deixaremos de considerar estas questões”, disse em resposta aos deputados que o tinham questionado sobre o que ia o Governo fazer perante subidas de prestações na ordem dos “€200, €300 ou €400”, ao mesmo tempo que a banca “obtém lucros escandalosos”.

Desde novembro está em vigor o diploma que obriga os bancos a renegociar os créditos sempre que a taxa de esforço ultrapassar os 36%, mas a Deco tem sublinhado que a medida não está a ser inteiramente cumprida, e, entre socialistas, todos comentam que é insuficiente. Em janeiro, o PS apresentou mesmo um projeto de lei que impõe regras mais apertadas aos bancos na renegociação dos empréstimos, mas a votação está pendente de pareceres escritos de várias entidades, que terão mais duas semanas para os apresentar. Esta semana também deviam ter sido votados dois outros diplomas que o BE e o Livre apresentaram há meses para limitar a variação da taxa de esforço, por um lado, e obrigar os bancos a disponibilizar taxas fixas, por outro (coisa que alguns bancos, como o Santander, não estão a fazer). Acontece que o PS adiou a votação das propostas porque, ao que o Expresso apurou, o Governo pediu mais tempo para as analisar — precisamente por estar a estudar medidas sobre o tema no pacote legislativo de apoio à habitação que vai aprovar na semana que vem. A banca, contudo, não sabe ainda de nenhuma intenção do Governo nesse sentido.

Governo vai acabar formalmente com vistos Gold no Conselho de Ministros do dia 16

Em curso está um estudo feito pelo INE e o Banco de Portugal que avalia o impacto real da subida das taxas de juro nos créditos em função dos diferentes tipos de contrato e dos vários níveis de rendimento, cujos resultados não são públicos mas que o Governo tem usado como base de trabalho. “Temos estado a receber as avaliações do Banco de Portugal de aplicação do regime criado”, diz ao Expresso fonte das Finanças. Também António Costa recomendou no Parlamento que o governador, Mário Centeno, fosse ouvido (coisa que o PSD já tinha pedido), para que as leis sejam feitas com base em “dados concretos”. Em dezembro, Mário Centeno dizia que era “um mito” haver famílias com baixo rendimento com crédito à habitação.

O pacote que será aprovado no dia 16 vai ainda contemplar uma medida simbólica: o há muito prometido fim dos vistos gold, que já em novembro António Costa dizia já “terem cumprido a sua função”. E vai incidir sobre outros eixos. Ao que o Expresso apurou junto de fonte do Governo, outra das medidas em cima da mesa passa por estimular, através de incentivos fiscais, a colocação no mercado de arrendamento de casas até aqui destinadas a Alojamento Local e também de casas devolutas (“reforçando a segurança dos proprietários”).

Os novos instrumentos de política de habitação considerados de “emergência” passarão também pela criação de incentivos (designadamente fiscais) à construção, ou reabilitação, de habitação por privados, “para aumentar a oferta pública de arrendamento acessível”. O Governo também vai aumentar os solos e edifícios para habitação, permitindo que solos e edifícios até aqui destinados apenas a comércio e serviços possam vir a ser usados pelos municípios para fins de habitação.
O sector da construção e do imobiliário, que deverá reunir-se com o Executivo dois dias antes do Conselho de Ministros, quer que o Governo vá mais longe e que crie mecanismos que permitam aos municípios acelerar os processos de licenciamento de novos projetos de habitação — sendo que cada ano de atraso numa licença em Lisboa, por exemplo, pode encarecer o preço final da casa em mais €500 por metro quadrado. O sector defende também o fim do imposto adicional ao IMI, assim como a redução da taxa de IVA na construção de novas habitações para a classe média. Outra medida esperada é a redinamização da figura das ‘cooperativas de habitação’, que já foi muito importante nos anos 80 e 90 mas caiu no esquecimento e, segundo fontes do mercado, poderia vir a ajudar a resolver muitos dos problemas de falta de habitação que entretanto se acumularam.

COM VÍTOR ANDRADE