8.3.23

A região onde o emprego vai à procura do aluno

Francisco de Almeida Fernandesin Expresso


Interior: repovoar os territórios de baixa densidade é um desígnio para distritos como Portalegre, onde 70% dos estudantes do ensino superior são de outras paragens. Reter jovens é o desafio

Nos últimos 10 anos, o Alto Alentejo perdeu mais de 13.500 habitantes, uma realidade que está alinhada com a tendência de redução de residentes em toda a região do Alentejo. Esta última foi, de acordo com o Censos 2021, a zona do país que mais encolheu em população. A exceção à regra verificou-se em Odemira, eleito o concelho que mais cresceu, em virtude do aumento da imigração para as atividades agrícolas, um espelho de como a dinamização económica local pode ser a chave para atrair mais pessoas. No distrito de Portalegre, Luís Loures considera que o instituto politécnico que lidera ajuda “à fixação de jovens” e que “é o principal contribuinte líquido para a atração” dos mais novos. “Cerca de 70% dos nossos estudantes vêm de fora do Alentejo”, apontou o presidente da instituição de ensino superior durante a conferência itinerante que assinala os 50 anos do Expresso, que decorreu em Portalegre.

Se considerarmos o número de habitantes da capital do distrito, cerca de 22 mil pessoas, entre alunos e funcionários o Instituto Politécnico de Portalegre representa 20% do capital humano do município. O desafio, porém, é reter os jovens ali formados, uma missão que Luís Loures tem procurado tornar bem-sucedida através da criação de uma oferta formativa com forte ligação à economia real. “Temos unidades de investigação em paralelo com a oferta formativa e através desses projetos facilitamos aos estudantes a possibilidade de desenvolverem as suas competências ao nível da investigação e inovação”, aponta. Além disso, a proximidade com empresas como a Delta ou a Softinsa (subsidiá­ria da IBM) permite absorver no território uma parte da mão de obra qualificada. “Em muitos domínios [do ensino] não é o aluno que vai à procura de emprego, é o emprego que vai à procura do aluno. Isso é uma vantagem”, acrescenta Luís Loures.

Do lado das organizações, a proximidade aos centros académicos é vista como estratégica num momento em que a escassez de talento é um problema real. A Softinsa, afirma Henrique Mourisca, pretende contratar 15 a 20 pessoas por ano para o centro de inovação instalado no campus do Politécnico de Portalegre. “Existe uma apetência [por talento] em termos de mercado e não temos nenhuma limitação em termos de negócio [para recrutar mais trabalhadores]”, garante o diretor-geral. A Delta, nascida e criada em Campo Maior, considera “importante” manter a sede nesta zona do país e assegura que continuará a empregar localmente. “Nos últimos dois anos investimos mais de €20 milhões nas nossas unidades produtivas na região e o objetivo é crescer”, diz Miguel Ribeirinho, corporate affairs da empresa.

Fundos comunitários são oportunidade

Um dos maiores entraves ao desenvolvimento da região prende-se com a falta de infraestruturas rodoviárias e ferroviárias, o que faz de Portalegre a única capital de distrito sem ligação direta à autoestrada. “As acessibilidades são um problema que está mais do que sinalizado em termos estratégicos para o território”, reconhece Carlos Nogueiro, secretário executivo da Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo (CIMAA). A eletrificação da linha ferroviária do Leste é igualmente uma prioridade para “reforçar o transporte de passageiros para o Alto Alentejo, mas sobretudo de mercadorias”. O abandono que pinta as paredes e a envolvente da atual estação de comboios de Portalegre, a cerca de 15 quilómetros do centro histórico, é um indicador do necessário investimento nestas infraestruturas. O Plano Ferroviário Nacional, cuja consulta pública terminou a 28 de fevereiro, é um balão de esperança para os autarcas locais.

De acordo com a CIMAA, a região está atenta às agendas mobilizadoras do Plano de Recuperação e Resiliência para canalizar investimento para o desenvolvimento do Alto Alentejo. “Esta comunidade intermunicipal, no quadro do Portugal 2020, é das que tem maior taxa de execução. Temos 97% e uma taxa de compromisso de 17%”, assinala Carlos Nogueiro. Será assim, por via da dinamização da economia regional, que o território conseguirá atrair mais jovens e população qualificada.

Sustentabilidade como oportunidade

Ambiente Além da instalação de uma nova barragem na região, com produção hídrica e fotovoltaica, Portalegre destaca-se no tema do hidrogénio. O Instituto Politécnico criou, em 2021, a Academia do Hidrogénio, para a formação de talento nesta área, e dispõe, através da incubadora BioPip Energia, de equipamentos para experimentação e investigação.

11,5%

é a percentagem de residentes que Portalegre perdeu na última década. Nisa foi o município com maiores perdas, enquanto Castelo de Vide e Campo Maior foram os que menos habitantes perderam. Com um território cada vez mais envelhecido, o maior desafio do Alto Alentejo é inverter a tendência e apostar em estratégias de atração e retenção de jovens.

Portalegre quer mais empresas

Incentivos A capital do distrito quer tirar partido da localização triangular entre três importantes cidades ibéricas — Lisboa, Porto e Madrid —, bem como do talento formado no território. O município oferece redução de 70% em taxas de realização, reforço e manutenção de infraestrutura, de 30% no IMI e 0% de taxa de derrama para empresas no parque industrial.


€171

milhões é o valor da construção da barragem do Pisão, um sonho antigo da região. Cerca de €120 milhões têm origem no PRR, num investimento que deverá ocupar mais de 10 mil hectares


Melhores frases

“Temos de mostrar que é possível a partir de territórios do interior fazer a diferença e criar as condições para que os mais jovens e menos jovens se possam fixar e constituir família aqui”

Luís Loures
Presidente do Instituto Politécnico de Portalegre

“O problema [do desenvolvi-mento do interior] não está na estratégia, está na capacidade que as pessoas [que decidem] têm para desenvolver estes projetos”

Carlos Nogueiro
Secretário-executivo da Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo (CIMAA)

“Temos de passar o conhecimento da academia para a economia. Penso que esse é o grande desafio”

Ricardo Campos
Presidente do Fórum Energia e Clima

Conferências 50 anos

À boleia do roadshow que faremos pelo país, inserido nas comemorações do 50º aniversário, o Expresso organiza várias conferências para perceber os desafios e as estratégias de desenvolvimento das diferentes regiões. Portalegre foi a última paragem, em parceria com o Instituto Politécnico de Portalegre.

Textos originalmente publicados no Expresso de 3 de março de 2023