António Marujo, in Jornal Público
O Papa Bento XVI diz que "é um dever de justiça, ainda antes de ser um gesto de caridade", que os cristãos socorram as populações necessitadas. O apelo à partilha que a Igreja Católica faz "ressoa com maior eloquência nos países cuja população é composta, na sua maioria, por cristãos, porque é ainda mais grave a sua responsabilidade face às multidões que penam na indigência e no abandono".
Na sua mensagem para a Quaresma deste ano, Bento XVI recorda que, segundo a doutrina católica, ninguém é proprietário dos bens que possui: "Não devem ser considerados propriedade exclusiva, mas meios através dos quais Deus chama cada um de nós a fazer-se intermediário da sua providência junto do próximo." E, citando o Catecismo da Igreja Católica, diz que "os bens materiais possuem um valor social, exigido pelo princípio do seu destino universal".
A Quaresma iniciou-se quarta-feira (designada "de Cinzas", para recordar o sentido da mortalidade), mas a liturgia assinala hoje o primeiro domingo deste tempo de preparação da Páscoa. E a Igreja Católica costuma "propor alguns compromissos específicos que ajudem" os crentes no seu "processo de renovação interior": "a oração, o jejum e a esmola".
O Papa diz que a prática da esmola é uma forma "de socorrer quem se encontra em necessidade" e "uma prática ascética para se libertar da afeição aos bens terrenos". Ela ajuda a "vencer a incessante tentação" de valorizar apenas as riquezas materiais, acrescenta Bento XVI. E educa "para ir ao encontro das necessidades do próximo e partilhar aquilo que, por bondade divina, possuímos".
Essa é a "finalidade das colectas especiais para os pobres", promovidas durante a Quaresma". Mas, adverte o Papa, na sociedade de predomínio da imagem, não se deve dar esmola para cada um se pôr em destaque nem reduzi-la a uma "simples filantropia". E pergunta: "Como não agradecer a Deus por tantas pessoas que, no silêncio, longe dos reflectores da sociedade mediática, realizam com este espírito generosas acções de apoio ao próximo em dificuldade?"
As colectas referidas pelo Papa são uma prática também em Portugal, já há anos, onde assumiram o nome de renúncia quaresmal. A ideia é que os cristãos se abstenham de determinados bens, convertendo essa renúncia em dinheiro para apoiar os mais necessitados. Vários países lusófonos são destinatários, este ano, do produto que vier a ser recolhido pela renúncia quaresmal. Projectos missionários de Cabo Verde, Angola, Guiné-Bissau, São Tomé e Timor irão receber o dinheiro de várias dioceses. Já Viana do Castelo, Évora, Beja, Funchal e Angra destinam os fundos aos atingidos pelas recentes cheias em Moçambique.