30.4.08

Mais de cem lares de idosos foram encerrados no ano passado

Andreia Sanches, in Jornal Público

Nenhum dos equipamentos encerrados era gerido pela Segurança Social, ao contrário daquele onde um incêndio provocou ontem duas mortes


O Instituto de Segurança Social (ISS) detectou no ano passado falhas em 105 lares de idosos que acabaram mesmo por receber ordens para fechar as portas. As principais causas de encerramento relacionam-se com "a verificação de deficiências graves que põem em causa os direitos dos utentes ou a sua qualidade de vida", fez saber o ISS.
Os estabelecimentos fechados apresentavam "condições precárias relacionadas com a instalação, segurança, funcionamento, salubridade, higiene e conforto". Regra geral sofriam, simultaneamente, de várias falhas, explica Helena Silveirinha, assessora de imprensa do ISS.

A maioria eram lares lucrativos ilegais, propriedade de entidades privadas, acrescenta. Alguns encerramentos, nota ainda, "foram feitos voluntariamente pela entidade proprietária, após comunicação do instituto para cessarem a actividade". Nenhum era gerido pela Segurança Social.

Os lares geridos pelo Estado são, de resto, uma minoria dos que existem no país, nota. O Centro de Recolhimento da Encarnação, em Lisboa, onde ontem morreram duas pessoas na sequência de um incêndio, é um dos poucos que estão nessa situação (ver texto ao lado).

O ISS recusa que tenha havido falhas de segurança que tenham contribuído para o desfecho trágico do incêndio. Em declarações à Lusa, a directora distrital da Segurança Social do distrito de Lisboa, Rosa Maria Araújo, garantiu que, apesar de se tratar de um edifício muito antigo (que desde os anos 30 recebe idosos), tem condições para funcionar e está apto para responder em necessidade de socorro.
Os bombeiros presentes no local apontaram, contudo, falhas.

O tenente-coronel Carlos Fernandes, comandante das operações no local, criticou, aliás, o quadro legal em vigor: "Temos de ser cautelosos a fazer uma avaliação geral sobre as condições de segurança contra incêndio nos lares, porque, entre bons e maus, há de tudo. Mas a legislação é um pouco insuficiente. Há normas que são implementadas e outras não, sem consequências. A lei não está bem definida: refere-se a casas de habitação e a unidades hospitalares, mas é relativamente omissa em relação aos lares, que tanto podem ser encaixados num tipo como noutro".

Carlos Fernandes diz esperar, por isso, que o novo regulamento geral de segurança contra incêndios seja publicado rapidamente, porque acredita que clarificará a situação.

O ministro do Trabalho e da Solidariedade Social afirmou, por seu lado, que, para além das investigações dos serviços competentes, o próprio ministério vai "recolher informação" e "serão desencadeados todos os processos para perceber quais as causas que estiveram na origem do incêndio" de ontem.

"É responsabilidade do Estado averiguar o que se passou e criar as melhores condições para todos aqueles que necessitem de apoio", disse o ministro Vieira da Silva aos jornalistas, em Beja.

Apesar de referir não dispor de "informação muito detalhada", Vieira da Silva fez saber que o centro tinha sido alvo de obras de manutenção "recentemente" e que os sistemas de prevenção de incêndios "estavam instalados conforme a lei estipula".

Há 1562 lares de idosos (dados de 2006, os únicos disponíveis), com mais de 61 mil utentes. Apenas 394 pertencem a entidades lucrativas. A maior parte é gerida por Misericórdias e instituições de solidariedade social. A comparticipação do Estado por idoso está fixada nos 330 euros mensais. E é ao Instituto da Segurança Social (ISS) que cabe fiscalizar as condições de funcionamento, pedindo apoio a entidades como bombeiros ou delegados de saúde para avaliar áreas que não domina. Todos os anos, o ISS elabora um plano de fiscalização. Mas não há nenhuma regra que determine que um lar, uma vez atribuído o alvará que lhe permite funcionar, tenha que ser alvo de inspecções periódicas, diz o ISS. A fiscalização também acontece em casos de denúncias - e que estão geralmente associadas ao funcionamento de lares ilegais.
com Catarina Prelhaz