26.3.10

20% da violência doméstica já atinge os homens

Carlos Varela, in Jornal de Notícias

Os casos de violência doméstica aumentaram 10% em 2009, relativamente a 2008, segundo os dados divulgados, ontem, quinta-feira, no Relatório Anual de Segurança Interna. Feitas as contas, em Portugal há diariamente 84 casos de violência doméstica.

O RASI, que congrega os dados da segurança das várias forças policiais, informações e protecção civil, tinha sido inicialmente divulgado com dados parciais pelo ministro da Administração Interna, Rui Pereira, coadjuvado pelo secretário-geral do Sistema de Segurança Interna, Mário Mendes, na quarta-feira, mas só ontem, ao fim da tarde, os dados totais foram publicitados.

O relatório reporta uma descida geral da criminalidade da ordem dos 1,2%, mas, em contrapartida, na violência doméstica, os dados reportados pela PSP, GNR e PJ são cada vez mais. Se em 2008 eram 27773, já no ano passado os números subiram para 30571, se bem que em 2007 a subida tenha sido de 26,7%, conforme realça o documento.

Lisboa foi o distrito onde se registaram mais situações, com 7522, seguido do Porto, 6562, Setúbal, 2400, Aveiro, 1929, e Braga, 1635. Mas Setúbal e Braga são os distritos que entram já no grupo onde se verificou um aumento mais importante, com uma subida de 32,7% e 23,1%, respectivamente. Na mesma linha de subida surgem também Évora, de 297 para 387 casos, mais 30%, e Beja, de 224 para 275, mais 22,8%.

No universo das vítimas, 82,6% são mulheres, o que faz com que as agressões que atingem os homens correspondam já a um quinto do total dos casos. Ou seja, uma em cada cinco situações de violência doméstica teve vítimas no masculino. Em 2008, houve 5909 homens a queixar-se, enquanto que em 2009 esse número subiu para 6093. E os agressores são mulheres, que passaram de 3354 em 2008, para 4172 em 2009.

Estes dados acabam por corresponder também à convicção da Associação de Apoio à Vítima de Violência (APAV). "Temos a noção de que há cada vez mais homens a queixar-se de violência doméstica", apontou, ao JN, a propósito, João Lázaro.

No entanto, o responsável da APAV salientou que o crescimento estatístico "pode não significar que haja mais casos". Para João Lázaro, pode, sim, haver uma tendência para a vítima denunciar mais as situações de que é alvo.

Destaca da mesma forma que a legislação cobre agora também mais situações e que, além de pessoas do mesmo sexo, há situações de queixas entre namorados, "o que antes não acontecia". De facto, os dados dos RASI parecem contemplar esta realidade, pois se na maioria dos casos registados os intervenientes têm acima dos 25 anos, houve em 2008, no entanto, 1892 casos envolvendo intervenientes entre os 16 e os 24 anos, número que no ano passado subiu para 2163. João Lázaro reporta também os casos à volta de idosos a queixarem-se de agressões por parte dos filhos.

O aumento das queixas pode estar associado a maior número de campanhas de sensibilização, que levam a mais denúncias. Mas o responsável da APAVV entende, também, que "seria bom ver qual é o percurso que essas queixas seguem" ao longo dos inquéritos policiais e dos processos.

Subida do crime afinal abrangeu vários distritos de todo o país

O anúncio anteontem, pelo ministro da Administração Interna, Rui Pereira, e pelo secretário-geral, Mário Mendes, de que a criminalidade só tinha subido nos distritos do Porto e Viseu não é confirmado pelos dados no RASI. Com efeito, se no Porto houve uma subida de 6,9% e em Viseu de 14,5%, também em Viana do Castelo o crime subiu 11,4%, em Vila Real 10,8%, Coimbra 7,4% e Leiria 7,6%. Fernando Ruas, presidente da Câmara de Viseu, pediu desde logo um reforço dos efectivos policiais, ainda antes dos dados gerais serem divulgados e lembrou as várias cartas ao ministro da administração interna a solicitar reforço dos meios. O autarca considerou que deve abranger quer a GNR e a PSP, tendo em conta a tipologia do concelho. O Governo anunciou, entretanto, em Conselho de Ministros, a contratação de mais dois mil agentes para a PSP e a GNR, mas, em contrapartida, a Associação dos Profissionais da Guarda defendeu que a análise dos dados deveria ser feita por uma entidade independente, argumentando que só assim se teria uma verdadeira percepção da realidade. "Enquanto não conseguirmos uma entidade externa que faça uma análise rigorosa, isenta e objectiva dos dados, as visões do Governo e as nossas serão sempre diferentes", disse José Manageiro, presidente da APG, à Lusa.