João Nogueira, in JN
É numa tenda que Amélia Ferreira, 66 anos, e o filho Daniel Tato, 41 anos, pernoitam desde setembro de 2022, na praia de Matosinhos. Foram despejados da casa onde residiam, em Gaia. Já sinalizados, estão desesperados por uma solução e procuram habitação de renda acessível.Até ao ano passado, Amélia e o filho residiam numa casa arrendada em Gaia. O cenário mudou quando o senhorio morreu e a filha herdeira encetou uma ação de despejo, forçando-os a uma "saída inesperada". Sem posses para pagar os preços "exorbitantes" das rendas, a família está "desesperada".
"Eu não quero nada de graça. Só peço uma casa que esteja dentro dos meus rendimentos", explicou Amélia em lágrimas, que recebe pensão e reforma de viuvez, que "não chega a 500 euros".
Atualmente têm um pedido de habitação social na Gaiurb, empresa municipal do urbanismo e habitação em Gaia. "Dizem-nos que estamos sinalizados, mas que não há nenhuma habitação disponível", declara Daniel.
É "debaixo de chuva e frio" que Amélia e Daniel dormem há mais de quatro meses. Como o espaço é pequeno, dormem apertados e sem condições. "Nós apanhamos uma gripe enquanto estamos a recuperar de outra", desabafou Amélia.
Há dias em que só fazem uma refeição, que lhes é oferecida pelo Lar de Sant'Ana, em Matosinhos. "São o nosso apoio. Temos a refeição e também é lá que fazemos a nossa higiene", disse Daniel. "Durante o dia vamos para outro sítio, para nem nos lembrarmos disto", acrescentou Amélia.
A agravar o cenário complicado, a família sente-se insegura durante a noite. Inclusive, chegaram a invadir a tenda e roubaram o computador de Daniel. "Entraram e levaram. Agora quando saímos levo sempre as coisas mais importantes numa mochila, como documentos ou dinheiro", revelou.
Depois do despejo, Amélia conseguiu arrendar uma garagem, em Gaia, por 115 euros. No entanto, o espaço não pode ser usado para outros fins.
Depois do pedido de habitação social em Gaia, Daniel e a mãe tentaram fazer um pedido no balcão da Segurança Social de Matosinhos. "Foi recusado porque a nossa morada fiscal ainda é em Gaia, apesar de vivermos na rua", explicaram.
A família também procurou acolhimento num Centro de Alojamento de Emergência Social (CAES). No entanto, e segundo Daniel, o tempo de permanência que conseguiriam seria muito reduzido.
Só dois dias num Hostel
Mariana Marinho é amiga de infância de Daniel. Na véspera da passagem de ano, descobriu que Daniel estava numa situação que adjetivou de "beco sem saída". Depois de visitar o local onde Daniel e a mãe vivem, ficou "lavada em lágrimas".
Dado o temporal que atingiu o Porto nesses dias, decidiu contactar a Proteção Civil e pedir ajuda para a família. Através da Segurança Social, conseguiram disponibilizar um quarto de um hostel, no Porto, mas só durante dois dias.
Reconhecendo a situação difícil do amigo, Mariana sublinha que apesar de "todos os dias vemos pessoas nesta situação, ficamos indiferentes": "Quando é connosco, a história é outra, e por isso devíamos ajudar porque amanhã não sabemos se vamos ser nós em tal situação", acrescentou.