6.4.07

FMI reconhece que globalização gerou contenção salarial nos países mais ricos

Sérgio Aníbal, in Jornal Público

A oferta de mão-de-obra no mercado mundial quadruplicou em 25 anos. Em países como Portugal, o impacto é a contenção nos salários e no emprego


O Fundo Monetário Internacional (FMI) reconheceu, pela primeira vez, que o processo de globalização e, em particular, o aumento da mão-de-obra disponível na economia mundial estão a acentuar a desigualdade na distribuição de rendimentos nos países mais ricos e a provocar contenção salarial.

Num estudo integrado no relatório mundial de Primavera agora publicado, a entidade sedeada em Washington calcula que, durante os últimos 25 anos, a força de trabalho que compete nos mercados internacionais mais do que quadruplicou, com a maior parte da subida a registar-se já depois de 1990. A abertura das economias asiáticas e do Leste europeu ao exterior foram o principal motor deste aumento de mão-de-obra disponível e que é, na sua maioria, pouco qualificada.

O impacto deste fenómeno nos países ricos, sentido através de mais importações, deslocalizações da produção e imigração, é a contenção nos salários e na criação de emprego. "A globalização é um dos factores que têm levado à redução da parte do rendimento que é distribuído pelo factor trabalho nos países avançados", afirma o relatório.

Vários economistas têm vindo a assinalar que o aumento dos lucros registados pelas empresas do mundo desenvolvido não tem sido acompanhado por ganhos semelhantes por parte dos trabalhadores por conta de outrem. E alertam para a possibilidade de se poderem regressar as políticas económicas proteccionistas, se não se resolver esta situação.

Nos Estados Unidos, alguns dos candidatos mais bem sucedidos nas últimas eleições para o Congresso defenderam a aplicação de medidas que dificultem a entrada em massa de produtos chineses no país, alegando que estavam a prejudicar o mercado de trabalho interno. Na Europa, vários governos têm pressionado a Comissão Europeia para rever os acordos assinados com a China relativamente à importação de vestuário e calçado.

Portugal é nesta matéria um dos países mais afectados, uma vez que o peso das indústrias mão-de-obra intensivas é muito elevado. A sequência de deslocalizações de unidades produtivas, tanto no vestuário e calçado como no sector automóvel, tem contribuído para que se tivesse sentido no país, durante os últimos dois anos, uma forte contenção salarial. De acordo com o Eurostat, na indústria Portugal registou no ano de 2006 a variação mais baixa dos custos de trabalho em toda a União Europeia.
Apesar de reconhecer este efeito negativo, o FMI faz questão de salientar, no seu relatório, que os trabalhadores dos países mais ricos também retiraram vantagens da globalização. "Estão a beneficiar do maior bolo económico que agora existe, embora a sua parte nele tenha diminuído", afirma. Defende de igual modo que, para além da globalização, outros factores têm contribuído para o agravamento da desigualdade, nomeadamente as rápidas transformações tecnológicas.

O FMI recomenda que, "para fazer face ao impacto na distribuição do rendimento", os países devem apostar na educação e fortalecer o sistema de segurança social.