A ministra da Saúde foi ouvida no Parlamento por requerimento do Chega, da IL e do PCP. Reiterou a confiança na reforma do SNS e recusou privilegiar o sector público.
A
ministra da Saúde admitiu esta quinta-feira que o Serviço Nacional de Saúde (SNS)
acusa cansaço, mas garantiu que ainda não desistiu das medidas de reforma do sector da saúde já apresentadas pelo Governo. Marta Temido falava em audição no Parlamento por
requerimento do Chega, da IL e do PCP.
“O que temos é um SNS, que apesar das dificuldades que tem (...), deveria acusar o cansaço. Era absurdo pensar que isso não iria acontecer, é uma daquelas coisas que talvez não tivéssemos antecipado, mas que é marca evidente dos tempos que correm”, afirmou. A ministra assegurou, contudo, que ainda não atirou “a toalha ao chão”.
Embora o requerimento fosse de outros partidos, algumas das críticas mais contundentes vieram da bancada do PSD. Em particular, da deputada Fátima Ramos que acusou a ministra de privilegiar o sector público face ao sector privado e social, “por razões ideológicas”, falando mesmo de uma “postura de autoritarismo” e de ausência de “diálogo” por parte do Governo.
A ministra recusou a acusação: “Tendemos a só recorrer a terceiros quando esgotámos a capacidade disponível no sector público. Não é por qualquer preconceito ideológico, é por uma questão de eficiência da gestão”, disse, frisando que não foram interrompidos quaisquer acordos com as misericórdias ao longo do país.
Na audição parlamentar foi à secretária de Estado da Saúde que competiu anunciar uma das novidades mais importantes: existem agora
272 médicos de medicina geral e familiar prontos a integrar o SNS. Maria de Fátima Fonseca declarou ainda que o despacho do Governo que permite que as vagas vazias possam ser ocupadas através de concursos desenvolvidos pelas administrações regionais de saúde entrará em vigor ainda esta quinta-feira, notando que a segunda época do concurso para médicos de medicina geral e familiar ocorrerá em Novembro ou Dezembro.
A secretária de Estado respondia ao deputado do PCP, João Dias, que questionou o executivo sobre a contratação de profissionais de saúde e a colocação de médicos em zonas carenciadas, acusando a ministra da Saúde de andar a “apagar fogos” e de criar uma ideia de “inevitabilidade” das dificuldades do SNS.
Também a coordenadora do Bloco de Esquerda censurou o Governo por não ter ainda conseguido avançar com as estratégias que traçou para responder à crise do SNS, uma vez que um terço das vagas para médicos de família ficou por ocupar, não conseguiu chegar a
acordo com os sindicatos sobre as remunerações dos profissionais, nem articular as urgências obstétricas. “O que existe é um
site”, disse.
“O Governo tem considerado que se não abrir vagas obriga [os médicos] a ir para zonas carenciadas, mas está a ficar sem médicos em todo o país. Vai deixar contratar [as administrações regionais] para vagas que já sabe que vão ficar vazias. Se nunca resulta porque é que se insiste?”, questionou Catarina Martins.
A ministra reiterou as respostas previstas para o SNS ao longo da audição - a
contratação, remuneração e formação, não esquecendo a
referenciação ou a
autonomia - e lembrou que “não basta actuar sobre a oferta, é preciso actuar sobre a forma como organizamos o trabalho médico”.
Investigação sobre a mortalidade em 2020
Já o Chega, que pediu a criação de uma
comissão eventual de inquérito à mortalidade não covid, quis ouvir a ministra sobre as conclusões de um relatório da Direcção-Geral da Saúde (DGS) que analisou a mortalidade entre Dezembro de 2019 e Janeiro de 2021, e que indica que só
dois dos seis períodos de excesso de mortes neste ano podem ser explicados pela pandemia.
O deputado Pedro Frazão relembrou que em 2020 houve mais 14% de mortes face à média dos seis anos anteriores e que os picos de mortalidade derivam, além da covid-19, da actividade gripal, de uma onda de calor e de temperaturas altas, sendo que para o quinto pico de mortalidade o relatório não apresenta justificações.
Em resposta, o secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales, explicou que a investigação sobre esse excesso de mortalidade deve ser feita em “períodos longos”, entre cinco a dez anos, de maneira a excluir que se trata de um “fenómeno pontual”, mas não deixou de notar que a pandemia “tem um efeito nocivo em condições pré-existentes”.
O governante recusou também que estes picos possam estar relacionados com a falta de acesso a cuidados de saúde que, diz, “não resulta em mortalidade aumentada”, mas numa dificuldade adicional de protecção”, explicando a diminuição da procura de cuidados por parte dos portugueses em 2020 com, por exemplo, o medo da pandemia.
A IL
centrou-se no relatório de auditoria do Tribunal de Contas à resposta do SNS a doentes oncológicos entre 2017 e 2020, que concluiu que o acesso a cirurgias oncológicas se degradou nestes anos. Nesta matéria, Marta Temido assegurou que, no que diz respeito às recomendações da auditoria, já foi assegurada a funcionalidade para identificar a confirmação ou suspeita de doença no sistema de informação de saúde, que estará implementado “até ao final do ano”. E recordou que, embora a resposta no acesso a cirurgias tenha baixado em 2020, uma das metas do PRR é a implementação de rastreios ao cancro da mama, do colo do útero e do cólon e recto.