11.7.22

Ser pobre determinou maior probabilidade de apanhar covid? Estudo português mostra que sim

Joana Ascensão, in Expresso

Após o primeiro confinamento geral, a incidência de covid foi 3,5 vezes maior para os mais pobres. Estudo da DGS, junto com o ISPUP e o INSA, prova que a situação socioeconómica das famílias determinou a probabilidade de infeção

O vírus não escolhe idades, geografias ou contas bancárias. Está correto. Mas apanhar o vírus, estar mais “a jeito” de se cruzar com ele, pode ser condicionado por estas determinantes.

E a prova disso é uma investigação publicada em fevereiro no Jornal Europeu de Saúde Pública que se debruçou nos primeiros meses de pandemia em Portugal para concluir que a situação socioeconómica dos portugueses influenciou a probabilidade de contraírem covid.19.

Por investigadores que trabalhavam para a Direção-Geral da Saúde (DGS), em conjunto com o Instituto de Saúde Pública da Universidade de Porto (ISPUP) e do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), foram estudados três períodos de tempo: um deles anterior ao primeiro Estado de Emergência, o do Estado de Emergência, que se fez coincidir com confinamento total da população, e um terceiro de pós-Estado de Emergência.

A dinâmica da infeção no país foi associada ao índice de privação socioeconómica, já caracterizado em cada freguesia portuguesa, para que os investigadores percebessem, em cada infetado, a sua condição socioeconómica, dividida em quatro grupos.

As conclusões fazem realçar um gradiente de incidência de infeção do grupo mais vulnerável para o menos vulnerável, com cerca do dobro do primeiro relativamente ao segundo para o período de confinamento total, que cresceu para 3,5 vezes mais no período de desconfinamento.

No Pré-Estado de emergência não se verificaram diferenças significativas porque quase todos os casos de covid-19 em Portugal foram importados.

João Magalhães, médico de saúde pública coordenador da investigação, acredita que na fase de emergência algumas condicionantes dos resultados prendem-se com a possibilidade de as pessoas com uma posição socioeconómica mais favorecida por norma terem mais oportunidade de fazerem teletrabalho, coisa que não estava ao alcance dos trabalhadores mais operacionais e dos trabalhadores essenciais.

No período de pós-confinamento geral, esse fator associado à comunicação de risco, “que nem sempre é fácil quando associada a uma menor literacia, terá agravado mais esta diferença”, admite.

“Isto é particularmente importante para nós, de cada vez que temos uma onda, para sabermos que medidas é que tomamos. Se não tivermos em conta os diferentes graus de literacia e de compreensão da população, estamos sempre a colocar muito mais em risco as mesmas pessoas”, declara ao Expresso.