Por Duarte Garrido, in iOnline
Fim do milagre chinês? Recuperação europeia? Abrandamento global? Afinal em que ponto estamos?
O mundo está a mudar. Os conquistadores do passado são os PIGS do presente. Os BRIC de hoje serão os PIGS de amanhã. Este ano, pela primeira vez em duas décadas, vai assistir-se a uma estagnação de países cujo crescimento tem aumentado a um ritmo de um ponto percentual por ano.
Há não muito tempo, as grandes economias emergentes foram compactadas num só acrónimo - BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) - e foi-lhes prometido um lugar ao lado dos gigantes económicos que por essa altura lideravam o mundo.
O século xxi trouxe consigo o milagre do crescimento de uma China rendida ao capitalismo. Mão-de-obra extremamente barata e baixos custos de produção foram responsáveis por um crescimento do PIB chinês de 10,5% por ano entre 1993 e 2007.
A seguir veio a omnipotência do Brasil no Mercosul, a que se juntou a indústria de serviços e energia na Índia e a recuperação russa no pós-Guerra Fria. Unidos pelo crescimento, os BRIC careciam de um líder. Enquanto os países do G7 olham para Washington à espera de uma decisão, os BRIC permanecem na sua, separados, e hoje menos fortes.
Apesar de estas economias se terem afastado da crise do Ocidente, as características que as unem não são as melhores. Os BRIC têm em comum regimes políticos débeis, grandes assimetrias sociais, altos índices de corrupção, e sobretudo uma elevada dependência do estrangeiro. Mas foram crescendo. A sua percentagem no PIB mundial passou de cerca de 25% nos anos 90 para 50% este ano. Em 2001, as economias deste grupo de países eram as únicas fora da OCDE com valores do PIB a rondarem os biliões de dólares - a par dos EUA. Os BRIC transformaram o mercado mundial, fazendo disparar os preços das matérias-primas e baixando o custo do trabalho para valores desumanos.
PIGS Entretanto, na Europa, outro acrónimo nasceu, fruto de situações menos felizes. Os países do Sul da Europa entraram em recessão. Aumentaram as suas dívidas para valores insustentáveis, perderam o controlo sobre a sua própria economia e foram chamados PIGS. O acrónimo é a palavra "porcos" em inglês e serve para descrever as economias mais débeis da zona euro - Portugal, Itália, Grécia e Espanha. Em Julho de 2012, Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu (BCE), prometeu fazer "o que for preciso" para salvar os países periféricos. Hoje, um ano depois, os PIGS parecem ver uma luz ao fundo do túnel. Se ela existe, ou se é apenas uma miragem, ainda é cedo para saber.
O Peterson Institute diz que países como a Alemanha e a Áustria se manterão estáveis, e os PIGS pouco mais podem fazer que seguir as indicações da troika e tentar evitar uma crise política. Mas as opiniões são convergentes: anuncia-se o fim da era dos BRIC, uma recuperação europeia e o aparecimento de novos candidatos ao pódio emergente.
Entre os novos candidatos, as opiniões dividem-se entre os PC16 (16 pós-China), e os N11 (Novos 11). Comuns aos dois, há países como o México e o Vietname, que ameaçam ocupar o lugar que a China há duas décadas reclamou como seu. Se as coisas serão exactamente assim, só o futuro o dirá.
riscos novos e velhos No início de Julho, o FMI (Fundo Monetário Internacional) publicou o "World Economic Outlook", um estudo acerca do estado da economia mundial, especificando países, problemas e possíveis soluções.
De acordo com o documento, o PIB mundial vai crescer pouco mais de 3% em 2013, menos do que era previsto em Abril deste ano. O FMI aponta duas razões principais para esta diminuição do crescimento - riscos novos e velhos.
Os velhos já se conhecem: a Europa está em recessão e a procura interna está a diminuir. Os novos prendem-se sobretudo com as economias emergentes: os BRIC estão a desacelerar para níveis preocupantes, as tensões políticas nas economias emergentes estão a afastar investidores e os juros cobrados para compra de dívida soberana no mercado secundário não param de aumentar.
Acrescentem-se a estes dois problemas a maior contracção orçamental americana e a estagnação da economia africana. Ou seja, o mundo está progressivamente a crescer menos.
OS BRIC
Brasil. Reformas políticas, precisa-se!
Avizinham-se problemas para a capital do samba. O crescimento do PIB tem sido fraco nos últimos dois anos, passando dos 7,5% registados em 2010 para valores a rondar 1% nos últimos dois anos. O próximo ano não será melhor. A inflação está alta e diz-se que o país terá já atingido o seu potencial de crescimento máximo para as infra-estruturas existentes. Os tumultos sociais recentes são reflexo de um Brasil que cresceu para o lado errado.
Índia. A capital do outsourcing perdeu mercado
Há seis anos era considerada a próxima China. Escapou ao seu triste destino ultrapopu-loso com estratégias de outsourcing e baixo custo dos serviços. Previa-se um crescimento do PIB entre os 8% e os 10% a partir de 2010. A realidade puxou esse valor para perto dos 6% e este ano não deverá ultrapassar os 5%. Os investidores fogem das suspeitas de corrupção e regulações draconianas que têm de ser resolvidas pelo governo indiano.
Rússia. Uma democracia autoritária
Podia dizer-se que o maior problema da Rússia é o seu governo semi-autoritário, no qual Putin favorece empresas que lhe são “queridas” e afugenta investidores mais sérios. Mas os problemas da Rússia não são só políticos. O crescimento do PIB diminuiu para perto dos 2% nos últimos dois anos, enquanto a inflação e o desemprego aumentam e o investimento e a procura externa tendem a desaparecer. Tudo tem que mudar na Rússia, inclusive Putin.
China. A noite escura do Sol nascente
Demasiado investimento e pouco consumo – o resultado não podia ser bom. A China cresceu mais do que podia e está a braços com um modelo falhado, enquanto surgem acusações de manipulação dos números oficiais. Os investidores afastam-se de um país que se está a tornar cada vez mais hostil para as empresas estrangeiras. Um crescimento do PIB abaixo dos 8% pode não parecer grave, mas no caso da China, pode ser um prelúdio de morte.
OS PIGS
Portugal. O bom aluno está na escola errada
As crises políticas, as reformas adiadas e, mais recentemente, as polémicas têm vindo a minar a confiança dos portugueses nos partidos. A verdade é que Portugal se sujeitou às regras impostas pela troika, fazendo o que devia e o que não devia. Os sinais de recuperação começam a chegar à energia, às PME, esperando-se um regresso ao crescimento económico e aos mercados. O país aguarda agora a oitava e a nona avaliações da troika e o corte dos 4,7 mil milhões.
Espanha. Empregos, precisa-se!
Espanha junta-se a Itália nos campeões do crescimento negativo da zona euro nos próximos anos. A competitividade e as exportações têm vindo a aumentar, tentado amenizar o efeito de uma taxa de desemprego que ronda 26,8%. São mais de seis milhões de desempregos, maioritariamen-te jovens. O facto de a dívida pública ter diminuído para 84% do PIB e as medidas para baixar o défice fiscal em 0,8% podem explicar o crescimento negativo.
Grécia. Na base da cadeia alimentar
Apesar de os elogios feitos pelo FMI às reformas do défice e à política orçamental gregas, a quarta avaliação da troika ao programa grego descobriu que os países da zona euro têm de perdoar uma dívida no valor de 7,4 mil milhões de euros para que a Grécia se volte a levantar. Perante um “não” taxativo da chanceler Angela Merkel ou de qualquer outro partido alemão, afiguram-se tempos difíceis para o país. A dívida grega está actualmente avaliada em 156% do PIB.
Itália. Muito melhor, mas muito mal
Foram feitas reformas necessárias para restaurar a confiança nos mercados. No entanto, as perspectivas de crescimento assumem valores negativos, os bancos pararam de conceder empréstimos, o desemprego está alto e a Itália está gradualmente a ganhar um lugar junto dos seus parceiros do Sul. Este ano, o crescimento vai ser de -1,8%, com esperanças de que 2014 traga uma ligeira recuperação. Os tumultos políticos não ajudam à imagem externa do governo italiano.