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8.6.22

Agenda para o Trabalho Digno continua a dividir parceiros sociais

in Público

Patrões, centrais sindicais e Governo têm visões diferentes sobre as alterações ao Código do Trabalho que é preciso fazer.

O acordo em torno das alterações à lei laboral no quadro da Agenda do Trabalho Digno dificilmente será alcançado. A CGTP diz que documento não responde aos problemas do país, a UGT quer reversão das medidas da troika e do lado dos patrões também se ouvem críticas com o Turismo a rejeitar a proposta por não resultar do diálogo com os parceiros.

O acordo em torno das alterações à lei laboral no quadro da Agenda do Trabalho Digno dificilmente será alcançado. A CGTP diz que documento não responde aos problemas do país, a UGT quer reversão das medidas da troika e do lado dos patrões também se ouvem críticas com o Turismo a rejeitar a proposta por não resultar do diálogo com os parceiros.

É neste contexto que está a decorrer, nesta quarta-feira, a reunião da Comissão Permanente de Concertação Social para discutir três pontos da Agenda do Trabalho Digno que o Governo reconhece que não foram debatidos com os representantes das confederações patronais e sindicais.

Em causa está o aumento de 18 para 24 dias da compensação paga pelas empresas quando os contratos a prazo cessam; a reposição do pagamento de horas extraordinárias em vigor até 2012 a partir das 120 horas anuais e o alargamento da arbitragem necessária.

Porém, na última reunião, a ministra do Trabalho e da Segurança Social, Ana Mendes Godinho, reconheceu que será difícil chegar a um entendimento. “Queremos conciliar ao máximo e equilibrar ao máximo as diferentes posições. Hoje, ouvimos na reunião posições muito diferentes em relação a algumas das matérias, o que procuramos é garantir que esta agenda seja eficaz e rapidamente implementada para promover o trabalho digno”, destacou no dia 11 de Maio.

Para a CGTP, “continuam a faltar soluções para responder aos problemas dos trabalhadores e do país”.

“Sem prejuízo de um ou outro conteúdo de carácter positivo, aquilo que resulta das medidas do Governo é a intenção de não devolver aos trabalhadores os direitos que lhes foram retirados sob a égide da troika durante o período da governação PSD/CDS”, afirma a CGTP na posição enviada ao Governo, tal como estava previsto, antes da reunião de hoje.

Segundo a central sindical, seria essencial que as alterações contemplassem a revogação do regime da caducidade e sobrevigência da contratação colectiva; a reposição plena do princípio do tratamento mais favorável; a redução do tempo de trabalho para as 35 horas semanais sem perda de retribuição; a revogação dos regimes de adaptabilidade e de bancos de horas; a delimitação da possibilidade de laboração contínua às actividades socialmente imprescindíveis que a justifique; a limitação dos fundamentos para o despedimento colectivo e a reposição do valor das indemnizações por despedimento.

O princípio de que a um posto de trabalho permanente tem de corresponder um vínculo de trabalho efectivo e a consagração de 25 dias úteis de férias para todos os trabalhadores são outras das reivindicações defendidas no documento, a que a Lusa teve acesso.

Embora com uma posição mais moderada, a UGT também não está satisfeita com o documento do Governo e entende que “uma verdadeira Agenda do Trabalho Digno deveria contemplar e articular um conjunto mais vasto de áreas, desde a adequação dos regimes de protecção social à redução da jornada de trabalho e dos tempos de trabalho, da reversão de medidas da troika como o regime dos despedimentos ou a reposição do regime de férias, não esquecendo as matérias associadas ao futuro do trabalho e ao cumprimento de compromissos anteriormente acordados e que concorrem para o mesmo fim, como a concretização da taxa por rotatividade excessiva de contratação precária”.

“Naturalmente, não poderá igualmente deixar de estar presente a discussão relativa à valorização dos salários e rendimentos do trabalho, dimensão essencial do trabalho digno”, defendeu na posição enviada ao Governo.

Do lado patronal, a Confederação do Turismo de Portugal (CTP) comunicou ao Governo que rejeita o documento na globalidade, por não resultar do diálogo social.

Na posição enviada ao Governo nos últimos dias, a CTP reitera que “não pode validar um conjunto de alterações retrógradas e pouco equilibradas à legislação laboral decorrentes de um processo ideológico discutido no âmbito de acordos políticos fora do espectro do diálogo social”.

Segundo a confederação patronal, a Agenda do Trabalho Digno é um documento do Governo acordado com os anteriores parceiros de coligação política, PCP e BE, que foi discutido fora do espaço da CPCS, o que lamentou.

A confederação lembrou no documento a que a Lusa teve acesso que o Governo avançou em Outubro com a proposta de lei que procede à alteração da legislação laboral no âmbito da agenda do trabalho digno, que consta da Separata BTE n.º 33, e que as novas medidas apresentadas a 11 de Maio não trazem mudanças.

Para o Turismo, o documento do Governo “não pretende encetar nenhum processo negocial sobre as três medidas em apreço, mas tão-somente criar a ilusão de uma negociação em espírito de diálogo social”.

22.2.22

Imigrantes nas estufas do Alentejo assumem luta por trabalho mais digno

Ana Dias Cordeiro (texto) e Nuno Ferreira Santos (fotografia), in Público on-line

As más condições de trabalho nas explorações agrícolas em Odemira não são uma novidade . “A novidade aqui é que houve 300 trabalhadores que perderam o medo e foram pedir explicações à administração, no fim da jornada de trabalho. Foram em grupo, ordeiramente, num movimento espontâneo”, diz Alberto Matos, da Solidariedade Imigrante “Isto cria pressão.”

Estar vigilante tornou-se parte da natureza —​ e da condição — de Birat Khatri. Cinco anos a trabalhar nas estufas da empresa Sudoberry, no litoral alentejano, mostraram a este nepalês de 32 anos que há várias formas de silenciar os imigrantes que chegam desejosos de trabalho a Portugal, mas sem nenhum conhecimento da língua, das leis do trabalho ou dos seus direitos individuais.

São formas difusas de intimidação; e de tal forma enraizadas que, só muito recentemente, Birat começou a fazer-lhes face. Passam-se meses, ou anos, em que não se ouve uma queixa.

Em 2021, as más condições em que imigrantes trabalhavam ou estavam alojados, nas próprias instalações de algumas grandes empresas, motivaram reacções quando um surto de covid-19 entre os trabalhadores trouxe a realidade laboral em Odemira para as primeiras páginas dos jornais.

Neste mês, foi diferente. As queixas fizeram-se ouvir pelos próprios trabalhadores. “O copo encheu”, como dirá o representante da Solidariedade Imigrante em Beja, Alberto Matos, que conheceu Birat esta semana.

No dia 11 de Janeiro, no final da jornada de trabalho, Birat Khatri e largas dezenas de trabalhadores dirigiram-se aos escritórios da empresa para falar com a administração. O movimento ganhou força pela visibilidade dada por uma reportagem da SIC (a estação que esteve no local refere 300 manifestantes).

Ao falarem para a câmara, tanto Birat como a Pramila Bamjan, de 35 anos, tornaram a sua revolta pública e, sem medo, colocaram as suas queixas na agenda da Sudoberry, no centro das preocupações da associação Solidariedade Imigrante e no foco das prioridades da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT). De forma assertiva, denunciaram o contrato “pouco transparente” o que, quanto a eles, abre a porta a abusos.

Nesse protesto pacífico, em movimento compacto, quiseram perguntar por que motivo, para as mesmas horas de trabalho, receberam uma menor quantia no mês de Janeiro; entre 200 e 400 euros a menos consoante os casos.

Um imposto sem explicação

Birat, Pramila, Robin Thapa e Urmila Bamjan contam que a empresa justificou com algo que estaria fora do seu alcance: a suposta aplicação de um imposto novo decidido pelo Governo português, dizem ao PÚBLICO. “Foi isso que nos foi transmitido”, insiste Birat. “Mas nós não sabemos se isso é verdade, não sabemos de que imposto se trata, continuamos à espera de uma explicação”, completa Pramila.

Para Alberto Matos, dirigente da Associação Solidariedade Imigrante e representante desta associação de defesa dos direitos dos imigrantes na delegação em Beja, “este foi mais um problema de uma situação sistemática” criada por “abusos sobre os direitos dos trabalhadores que esta e outras empresas consideram estar na sua dependência”.

“A novidade aqui é que houve 300 trabalhadores que perderam o medo e foram ao escritório da administração, pedir explicações, no fim da jornada de trabalho. Foram em grupo, ordeiramente, num movimento espontâneo”, diz Alberto Matos. “Isto cria pressão.”

A novidade aqui é que houve 300 trabalhadores que perderam o medo e foram ao escritório da administração, pedir explicações, no fim da jornada de trabalho. Foram em grupo, ordeiramente, num movimento espontâneo Alberto Matos, Solidariedade Imigrante

“É importante sermos nós a luta pelos nossos direitos”, diz ao PÚBLICO Pramila Bamjan, de 35 anos. Também por isso, a sua irmã mais velha Urmila Bamjan e o amigo Robin Thapa juntaram-se neste projecto. “Nesta luta, devemos ser como uma família”, acrescenta. São queixas por “excesso de horas de trabalho sem contrapartidas financeiras”, “com pausa de apenas 30 minutos” em cada jornada completa de trabalho.

Os trabalhadores sentem-se igualmente injustiçados por nunca lhes ter sido explicado como são contabilizadas as horas; e quando calculados os totais, não percebem por que são retiradas quantias (apresentadas como subsídios de vários tipos) aos 6,22 euros que o trabalhador julgava ser o valor líquido a receber por hora. Enquanto descrevem a situação, comprovam o que dizem mostrando os recibos de vencimento.

“Não podemos confiar em ninguém”, diz outro trabalhador que pede para não ser identificado. “São eles que decidem se nós temos trabalho ou não, e eu preciso deste trabalho. Viemos para trabalhar e trabalhamos para ganhar dinheiro. O problema é vermos o total do vencimento reduzido sem qualquer explicação, como aconteceu em Janeiro. Sentimos que não querem saber de nós.”
Mais depressa, mais depressa

O contrato prevê um horário flexível, em que o trabalhador é convocado de véspera. Da mesma forma, pode ser dispensado, se a mensagem pretendida pelo patrão for de penalização ou intimidação. Além de tudo isto, aquilo que mais perturba alguns dos manifestantes do dia 11 de Fevereiro, em frente à própria empresa, é “a permanente pressão psicológica”.

“Querem que a gente ande cada vez mais depressa, a colher as bagas com movimentos dos braços sem parar. Estão em cima de nós, a gritar: ‘Mais depressa, mais depressa’”, diz Robin Thapa, também nepalês, disposto a protestar.

“É muito duro. Estamos a trabalhar num ambiente quente, dentro das estufas, e só podemos beber a água que trazemos de casa. Às vezes por mais de oito ou 10 horas”, diz Pramila. “Se bebemos toda a que trazemos, pedimos, mas eles não nos dão, recusam. Se protestamos, chegam a mandar-nos para casa”, salienta Pramila. “A pressão psicológica faz-nos mal.”

Quem não cumpre o objectivo de encher um determinado número de caixas numa hora, ou percorrer uma determinada distância nesse mesmo intervalo, sem deixar uma só baga na árvore, é dispensado para o resto do dia, e no seguinte, segundo os testemunhos de vários trabalhadores. “Alguns colegas têm medo de falar, mas eu não aceito estas condições, não tenho medo de falar. Sei que posso perder o trabalho”, continua Pramila.

Birat identifica uma dependência, mas nos dois sentidos. “A empresa precisa de nós. Os portugueses não aceitam estes trabalhos, nem a maioria dos imigrantes.”

De acordo com os dados mais recentes do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, conhecidos ontem, no ano passado foram atribuídas autorizações de residência sobretudo a cidadãos indianos, brasileiros, nepaleses, italianos, franceses e alemães. Além disso, os nepaleses e os indianos surgem em segundo e terceiro lugares, logo a seguir aos brasileiros, na lista das nacionalidades com mais autorizações de residência para exercício da actividade profissional.

Num dos contratos assinados pelo empregado e empregador, e que o PÚBLICO leu, está expresso que, no caso de trabalho acima do máximo diário de oito horas, “o trabalhador terá direito a compensação”. As horas extras são apresentadas como “eventual trabalho prestado em acréscimo”, e que essa compensação pode ser na forma de uma redução de trabalho ou “mediante o pagamento em dinheiro” das horas extra.

Oportunidade para juntar dinheiro

Estar na apanha da fruta dez ou 12 horas seguidas, na época alta entre Março e Julho, pode ser visto por alguns como algo positivo, uma forma de juntar mais dinheiro em pouco tempo, para enviar para a família no Nepal ou na Índia, ou para garantir meios para os meses de Inverno em que não há muito — ou mesmo nenhum — trabalho. São os meses de Outubro a Dezembro.

“Alguns não se queixam que são demasiadas horas porque provavelmente estão nessa lógica de ganhar mais dinheiro. O que não pode acontecer é que, nessas circunstâncias, o trabalho não seja mais bem pago”, diz Alberto Matos.

Pramila vem de Sarlahi, no Nepal, já trabalhou na Holanda, e reconhece aqui “um tratamento inaceitável”. Além das horas extraordinárias e dos feriados pagos de forma não diferenciada, lamenta a situação de um colega que quando partiu o braço a trabalhar, a empresa não accionou o seguro por acidente de trabalho; antes, exortou-o a apresentar a situação como um acidente doméstico, obrigando-o a meter uma baixa.

Os objectivos definidos pela empresa são conhecidos de todos mas, por vezes, impossíveis, de cumprir. E não constam dos contratos lidos pelo PÚBLICO, como está previsto na lei. Na época alta da framboesa, quem não colhe pelo menos cinco quilos deste fruto em cada hora, é dispensado no momento, fica com a jornada de trabalho reduzida a uma hora, ou poucas mais, faz o percurso de vários quilómetros a pé para casa, e não é chamado a trabalhar no dia seguinte. Quem completa o dia, tem transporte para casa.
Empresa indisponível

Contactada pelo PÚBLICO, a Sudoberry não esclareceu as dúvidas sobre a quantia retirada aos trabalhadores em Janeiro nem se queixas de pressão psicológica se justificam. A directora dos Recursos Humanos, Mónica Rosendo, não respondeu às perguntas colocadas por escrito e transmitiu não estar disponível por se encontrar em reunião, tanto pelo telefone como num contacto presencial.

Os trabalhadores andam durante anos a pagar os milhares de euros cobrados por quem os trouxe para Portugal aliciando-os com supostas condições de trabalho favoráveis. E as ameaças são reais. É-lhes incutido o medo de falar Alberto Matos, Solidariedade Imigrante

A Sudoberry tem mais de 500 trabalhadores (que chegam aos mil na época alta da Primavera e Verão) e dispõe de dezenas de hectares de plantações. No Alentejo, há pelo menos 130 campos agrícolas, o que justifica que todos os dias esteja no terreno uma equipa da Autoridade para as Condições de Trabalho. A ACT já abriu um processo de averiguações a esta empresa, como já fez no passado a outras.

No centro de São Teotónio, numa conversa informal sobre as condições de trabalho, “Routine Stars” surge como um exemplo de uma agência de emprego temporário a que alguns prefeririam não estar ligados.

Em silêncio, um jovem de nacionalidade indiana, há pouco tempo em Portugal, escreve o nome numa folha, indica Malavado como local da empresa, e não responde a mais nenhuma pergunta. Com um sorriso aberto, nega ter medo de falar. “Não, não, não”, diz em inglês antes de abandonar a conversa para não mais voltar.

Na Internet, esta agência não tem registo de morada. Mas em Malavado, é fácil encontrar a casa com tectos baixos, os vidros de trás partidos, e um pátio, a que todos chamam “o escritório da Routine Stars”, embora sem qualquer indicação.

Aqui, não há qualquer escritório, mas vivem nove pessoas em dois quartos e nenhumas condições de higiene ou conforto. Na mesma aldeia mas numa grande vivenda, vive o dono da “Routine Stars”. Diz o nome — Tilak — mas não o apelido e esquiva-se a perguntas sobre a actividade da firma com vários anos.

Garante que, com ele (que diz estar em Portugal há 20 anos), ninguém foi trazido do Nepal, da Índia ou do Paquistão. “Os meus trabalhadores encontraram-me aqui.” Só trata da regularização dos documentos no SEF, quando os trabalhadores não podem e não cobra nada por isso. Apresenta-se como alguém que ajuda os seus contratados, pagando renda e alimentação, quando eles são dispensados de um dia para o outro.
Gabinetes de apoio

Sabita Karki foi dispensada de um dia para o outro, ao fim de três meses de trabalho. Pensava ter um horizonte, não colhendo fruta por estar grávida, mas empacotando-a — foi o que fez nos últimos meses. Sabita e o marido, Hum Bahadur, estão por isso no Centro Local de Apoio à Integração de Migrantes (CLAIM) de São Teotónio, onde já vieram várias vezes, para pedir aconselhamento.

Este é um dos 120 gabinetes em todo o país pertencentes ao Alto Comissariado para as Migrações, mas “um dos que não têm apoio jurídico”, diz a responsável Tânia Guerreiro. “Quando nos surgem estes casos, encaminhamos directamente para a ACT [Autoridade para as Condições do Trabalho].”

Algumas empresas de emprego temporário funcionam de forma totalmente ilegal e são “as mais ameaçadoras” perante o trabalhador por quem a empresa produtora não se responsabiliza, diz Alberto Matos.

“Nos intermediários, os chamados prestadores de serviços, a situação é pesada”, acrescenta. “Os trabalhadores andam durante anos a pagar os milhares de euros cobrados por quem os trouxe para Portugal aliciando-os com supostas condições de trabalho favoráveis. E as ameaças são reais. É-lhes incutido o medo de falar.”

Com supostas ligações a redes criminosas em países do Sudeste Asiático, continua o representante em Beja da Solidariedade Imigrante, algumas dessas agências mantêm-se m Portugal “para garantir que o dinheiro é cobrado”.

Na Sudoberry, a realidade é distinta, e a contratação é feita directamente com o trabalhador, na maioria dos casos, sobretudo desde que a ACT há uns anos impôs essa condição.

Mesmo assim, quando se pergunta a um dos contratados para colher framboesas, pensando que vinha para uma das melhores na zona em matéria de cumprimento dos direitos laborais, diz: “Nesta empresa? Nunca nada vai melhorar.”

11.10.21

Liga Operária Católica realiza videoconferência "Trabalhar e ser pobre não é digno"

Ana Lisboa, in RR

Esta iniciativa decorre esta quinta-feira, a partir das 21h00.

Para assinalar o Dia Mundial pelo Trabalho Digno, a Liga Operária Católica/Movimento de Trabalhadores Cristãos em Portugal promove esta noite uma videoconferência.

Terá como oradores a Diretora da Organização Mundial do Trabalho em Lisboa, Mafalda Troncho e ainda o Presidente da Confederação Portuguesa de Voluntariado, Eugénio Fonseca.

Neste debate, estão previstos ser apresentados testemunhos nacionais e internacionais no âmbito deste tema.

Quem quiser participar nesta iniciativa da LOC/MTC, deverá inscrever-se online aqui https://sites.ecclesia.pt/loc-mtc/conferencia-sobre-o-dia-internacional-pelo-trabalho-digno/ para poder receber o link para o evento na plataforma Zoom.

5.10.21

Sociedade: Trabalhadores Cristãos alertam para «retrocesso» provocado pela «negação dos direitos laborais»

in Agência Ecclesia 

Movimento mundial assinala que organizações de trabalhadores e os sindicatos «devem lutar pela justiça social»

Lisboa, 03 out 2021 (Ecclesia) – O Movimento Mundial de Trabalhadores Cristãos (MMTC) alertou para um “retrocesso provocado pela negação dos direitos laborais” e “a violação dos direitos humanos”, na mensagem para o próximo Dia Internacional pelo Trabalho Digno.

“A perspetiva do ‘trabalho digno’ resume as aspirações das pessoas na sua vida laboral, implica oportunidades de trabalho produtivo ao proporcionar um salário justo”, explica o MMTC, num texto enviado à Agência ECCLESIA pela Liga Operária Católica/Movimento de Trabalhadores Católicos (LOC/MTC) de Portugal.

A nota destaca a necessidade de segurança no lugar de trabalho e “proteção social para as famílias”, liberdade para que as pessoas “expressem as suas preocupações”, se organizem e participem nas decisões.

Na mensagem para o Dia Internacional pelo Trabalho Digno 2021, que se assinala a 7 de outubro, o Movimento Mundial de Trabalhadores Cristãos alerta para a deterioração da democracia, “a violação dos direitos humanos” e a negação da justiça social, a rejeição do pluralismo, “o fomento do ódio político e a manutenção do fundamentalismo”.

O Movimento Operário Cristão da Índia, que assina a mensagem, explica que o crescimento sustentável “requer boa saúde, boa nutrição e uma boa educação”, que pode promover a transição de atividades de” baixa produtividade e sustento para trabalhos dignos e altamente produtivos”, e da economia informal à economia formal.

“Uma segurança social adequada fomenta o investimento em capital humano tanto para os empregadores como para os trabalhadores”; assinala o texto.

Os trabalhadores cristãos indicam que para a legislação integral de proteção social evoluir “é necessário garantir uma rede de proteção social mínima” para todos os trabalhadores, e fatores como a “despesa social, a tributação progressiva e o funcionamento dos direitos laborais” devem ser essenciais para medir o compromisso do governo em “promover a equidade e reduzir as desigualdades”.

A mensagem recorda que o Banco Mundial advertiu que a pandemia de Covid-19 criou uma “nova geração de pobreza e mal-estar” por causa da dívida, enquanto o Fundo Monetário Internacional (FMI) indicou que os países em desenvolvimento “corriam o risco de retroceder uma década”.

O vírus aumentou também as diferenças dos salários ou de riqueza em função da classe, raça e género e as mulheres foram “bastante afetadas”, a sua a participação na população ativa caiu para níveis mais baixos desde meados dos anos 80.

O Movimento Mundial de Trabalhadores Cristãos foi criado em 1966 e reúne mais de 70 organizações espalhadas por quatro continentes; A Liga Operária Católica/Movimento de Trabalhadores Católicos (LOC/MTC) é membro fundador do MMTC.

No âmbito da Jornada Internacional pelo Trabalho Digno 2021 a LOC/MTC Portugal vai promover a videoconferência ‘trabalhar e ser pobre não é digno’, a partir das 21h00, do dia 7, na plataforma Zoom.

CB/OC

4.10.21

Portugal: Liga Operária Católica promove conferência «trabalhar e ser pobre não é digno»

in Agência Ecclesia

Lisboa, 03 out 2021 (Ecclesia) – A Liga Operária Católica/Movimento de Trabalhadores Cristãos (LOC/MTC) em Portugal vai promover uma videoconferência sobre ‘Trabalhar e ser pobre não é digno’, a partir das 21h00 de quinta-feira, Dia Internacional pelo Trabalho Digno.

Numa nota enviada à Agência ECCLESIA, a LOC/MTC informa que a conferência vai ter como oradores a diretora da Organização Internacional do Trabalho Lisboa (OIT), Mafalda Troncho, e o presidente da Confederação Portuguesa de Voluntariado, Eugénio Fonseca.

Na videoconferência ‘Trabalhar e ser pobre não é digno’, os participantes vão também ouvir testemunhos nacionais e dois internacionais, quatro no total, e ter oportunidade para o debate.

Para participar nesta iniciativa no Dia Internacional pelo Trabalho Digno 2021 é necessário inscrição online, para receber o link para o evento na plataforma Zoom, e a Liga Operária Católica Portugal informa que há limite de participantes.

Para assinalar este dia, o Movimento Mundial de Trabalhadores Cristãos (MMTC) preparou uma mensagem onde alerta para os efeitos da pandemia Covid-19, que criou uma “nova geração de pobreza e mal-estar por causa da dívida”, aumentou as diferenças dos salários, e ainda uma oração.

A LOC/MTC é um movimento nacional, que teve a sua origem nos primeiros Círculos Católicos de Operários, a partir de 1912.

Em 1936, com a criação da Ação Católica Portuguesa, transforma-se na Liga Operária Católica, em representação do setor operário adulto do meio trabalhador.

A LOC/MTC nasce da fusão de dois Movimentos, a LOC Feminina, fundada em Portugal em 5 de maio de 1936, e da LOC Masculina, fundada a 12 de dezembro do mesmo ano.

22.7.21

Governo quer contratos sem termo para trabalhadores de empresas de trabalho temporário

Por Nuno Guedes, in TSF

Objetivo é acabar com os abusos no recurso a empresas ao trabalho temporário.

Governo pretende mais rigor nas regras de renovação dos contratos de trabalho temporários e apertar o controlo das empresas

O Governo quer obrigar as empresas de trabalho temporário a fazerem contratos sem termo aos trabalhadores que são sucessivamente cedidos a diferentes empresas. A proposta foi entregue pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social aos parceiros sociais (sindicatos e confederações patronais), no âmbito de um plano para promover o "trabalho digno", com especial enfoque no combate à precariedade.

O documento, a que a TSF teve acesso, detalha que um dos objetivos é avançar com a "obrigatoriedade de celebrar contrato por tempo indeterminado para cedência temporária entre a empresa de trabalho temporário e o trabalhador sempre que este seja cedido ao abrigo de sucessivos contratos com diferentes utilizadores".

Por outro lado, a proposta também diz que pretende "combater a fraude" no recurso abusivo ao trabalho temporário, sendo explicado que um dos objetivos é acabar com as práticas de empresas que usam outras empresas do mesmo grupo para contratar trabalhadores temporários, evitando, assim, contratos sem termo.

O Governo pretende ainda mais rigor nas regras de renovação dos contratos de trabalho temporários e apertar o controlo das empresas de trabalho temporário, com "certificação de qualidade" e verificação da idoneidade dos seus sócios e gerentes.

Uma das metas é acabar com o uso injustificado de trabalho não permanente, reforçando as regras contra a sucessão de contratos a termo e "impedindo a nova admissão ou afetação de trabalhador através de contrato (a termo, temporário ou prestação de serviços) cuja execução se concretize, no mesmo posto de trabalho, para o mesmo objeto ou na mesma atividade profissional".

11.9.19

O futuro do trabalho. Vamos todos ser precários?

Catia Mateus, Sónia M. Lourenço, in Expresso

Nas próximas décadas a flexibilidade vai marcar o mercado laboral. Especialistas defendem a criação de direitos mínimos universais e a aposta na negociação coletiva. Os desafios serão muitos

Na Europa, cerca de 10% da população adulta utiliza plataformas colaborativas para prestar serviços profissionais, como a Uber, a Cabify ou a Deliveroo. Portugal supera a média com 15,6% dos trabalhadores inseridos no que se designa economia das plataformas. Um modelo de trabalho que se caracteriza pela inexistência de vínculo laboral estável, grande flexibilidade, ausência de rendimento fixo e um nível de proteção social inferior ao dos trabalhadores por conta de outrem.

Em 2018 era assim. Como será nas próximas décadas? Caminhamos na direção de uma economia marcada por relações de trabalho mais precárias e de curta duração? E o que é que isso significa sob o ponto de vista das relações de trabalho?

18.7.19

O trabalho digno entre promessas e realidades (*)

Hermes Augusto Costa, in Focussocial

Ao longo da história, a noção de “trabalho” tem sido objeto de múltiplas análises de âmbito disciplinar que evidenciam a diversidade de características que lhe estão associadas. Se, por um lado, se pode analisar o trabalho colocando ênfase em dimensões comportamentais, tecnológicas, organizacionais, ocupacionais, ou simplesmente relacionadas com processos de mobilização e luta por direitos, etc., por outro, torna-se difícil equacionar o trabalho sem estabelecer multiplicidade de conexões, com a natureza, a produção, a prestação de serviços, a troca e a criação de bens, o tempo, a demonstração de capacidades, a construção de identidades, etc.
Neste texto pretendo chamar a atenção, em primeiro lugar, para o legado histórico da construção do direito do trabalho e para as teses em torno da centralidade/perda de centralidade do trabalho. Em segundo lugar, recupero algumas noções convergentes com a ideia de dignidade no trabalho para, em seguida, evidenciar o choque de contradições inerente a dois mundos: o mundo do tipo ideal de trabalho o do seu oposto, de contornos reais. Como corolário do ponto anterior, é incontornável falar da presença avassaladora da precariedade nas relações laborais contemporâneas. Por fim, e para que a dignidade do trabalho não continue a ser um projeto adiado ou apenas cumprido parcialmente como até aqui, enuncio alguns desafios regulatórios a que considero importante dar prioridade.

Legado histórico do trabalho e teses em confronto
Depois de uma visão de indignidade a que o trabalho esteve votado na Antiguidade Grega – pois estava relegado para a esfera do indigno, executado por escravos –, na Idade Média o trabalho passou a ser tolerado como um mal necessário. Mas só a partir dos séculos XVII e XVIII passou progressivamente e ser conotado como algo digno, que valoriza o homem, que lhe confere sentido de organização num cenário contemplado por direitos e deveres. Foi, na verdade, com a Revolução Industrial que o “direito do trabalho” se construiu, em resultado da massificação da produção, da migração da população rural para os centros urbanos industrializados e, consequentemente, da busca de trabalho num contexto de ausência de poder de negociação/reivindicação face ao patrão. Tratou-se, na verdade, de um longo e difícil percurso que culminaria na aprovação de leis do trabalho direcionadas para os mais desprotegidos, como mulheres e crianças (a partir de 1819, em Inglaterra).

Alguns marcos importantes nessa estratégia de dignificação foram: a conquista das 8 horas de trabalho diárias/48 h semanais, a criação da Organização Internacional do Trabalho (em 1919) e a suas convenções (a primeira delas foi precisamente sobre o horário de trabalho), a Declaração de Filadélfia (1944), nos termos da qual se sustenta, como princípio prioritário, que “o trabalho não é uma mercadoria”, ou a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). No contexto europeu, em especial no pós-Segunda Guerra Mundial, o Estado-Providência e o objetivo do pleno emprego configuraram-se (no ocidente) como mecanismos redistributivos essenciais, ao passo que o neocorporativismo permitiu a formação de consensos entre o governo e os interesses organizados, tendo-se o fordismo constituído como modelo de relação salarial dominante. Mas em especial a partir da crise desse modelo de organização do trabalho na década de 70 do século XX, começaram progressivamente a ser confrontadas duas teses sobre o futuro do trabalho. Por um lado, discursos sobre o fim do trabalho, que colocam ênfase no fim da sociedade assente no salário, na perda de identidade, no caráter permanente dos trabalhos temporários, ou na perda de laços sociais associados ao trabalho. Por outro lado, a centralidade do trabalho rivalizou com essa perspetiva, tendo-se baseado na ideia de ajustamento do mundo do trabalho à sociedade da informação, na necessidade de não confundir perda de consistência do trabalho com perda de importância do trabalho, ou ainda na construção de consensos entre parceiros sociais em nome de um contrato social de sentido emancipatório.

De uma cartografia conceptual de dignidade ao confronto entre utopia e realidade
A necessidade de adjetivar o trabalho como sendo digno, mais não é, afinal, do que o reconhecimento implícito de que “sozinho” o trabalho está longe de atingir os patamares de dignidade desejáveis. Por outro lado, há um conjunto de conceitos que, na linha do trabalho digno, apontam para uma cartografia conceptual de dignidade de que o trabalho deve ser parte integrante. Dou apenas exemplo de três: a noção de “direitos humanos” e as várias gerações de direitos que lhe estão associados (civis, políticos, sociais, culturais…); a noção de “cidadania”, igualmente balizada por bases civis (liberdade individual ou de discurso, entre outras), políticas (participação no exercício do poder político), ou social (padrão de bem-estar e segurança); e a noção de “democracia laboral”, traduzida, por exemplo, na capacidade do trabalhador influenciar as suas condições de trabalho ou dispor de autonomia e criatividade no local de trabalho.

O melhor dos mundos conduzir-nos-ia ao “tipo ideal” de trabalho, de sentido weberiano, isto é, enquanto resultado de uma projeção de condições perfeitas, quer do ponto de vista do trabalho, quer da empresa, quer das relações laborais, etc. Nesse cenário ideal (de trabalho e de empresa) podemos encontrar o trabalhador da “empresa X” que, por exemplo:
é licenciado/a em gestão de marketing e vendedor/a de produto;
apesar de se encontrar no início da sua vida profissional, ganha quatro vezes mais e ainda beneficia de várias regalias sociais (carro, telemóvel, computador, etc.);
beneficia de 5 meses de licença de parto (extensível aos pais), 27 dias de férias por ano, duas pontes e o dia de aniversário, creche, ginásio, farmácia, distribuição de fruta fresca pelos locais de trabalho, apoio à vida familiar;
Porém, como cada um de nós, no seu dia a dia, está sempre sujeito ao confronto entre expectativas perfeitas e realidades imperfeitas, o reverso do cenário anterior coincide com as características do trabalho na “Empresa Y”. E aí podemos encontrar um outro perfil de trabalhador que:
possui menos qualificações e controla a produção de um determinado produto;
apesar de trabalhar há mais de 20 anos da empresa, aufere um salário de 600 €, acrescido de subsídio de refeição;
é obrigado a estar de pé durante 8 horas, apenas dispõe de uma hora para almoço, tendo ainda por função verificar uma média de 100.000 peças de um produto por dia, procurando encontrar nele defeitos.
Em resumo, a insegurança (se é que existe) do primeiro trabalhador supera as melhores condições de segurança (muito pouco percetíveis) do segundo. Porventura a única segurança (digna desse nome) que resta ao segundo trabalhador é poder conservar o seu posto de trabalho. A sua dignidade assenta, pois, num patamar de “serviços mínimos”.

A precariedade como fator de distanciamento da dignidade
A precariedade – entendida no sentido laboral, promotora de desigualdades, mas também percecionada como modo de vida – concretiza-se num conjunto de formas de trabalho: da economia informal (à margem da formalidade e sem pagar impostos), ao trabalho flexível (que combina distintas rotinas de trabalho, organização de funções e gestão do tempo), do trabalho das gerações mais jovens (de caráter temporário, parcial e que não valoriza adequadamente as qualificações escolares) às adaptações aos setores tecnológicos, potencialmente geradores de formas de “ciberproletariado” (com lhe chamou Ursula Huws). Como tal, ainda que a mudança de ciclos políticos possa ser importante no modo como se lida com os desafios da precariedade, as suas várias modalidades estão longe de dissipar-se, inclusive no quadro de conjunturas políticas, como a atual, desde o início muito vocacionada para “virar a página da austeridade”. A contratação a termo, os recibos verdes, o trabalho a tempo parcial involuntário, o trabalho temporário, a precariedade induzida pelo Estado (estágios, bolsas e contratos de emprego-inserção) não se dissociam de formas de precarização que, por sinal, tendem a perpetuar-se.

Por vezes, a ideia de flexibilidade laboral, independentemente das várias acções que adquire (numérica, funcional, de tempo de trabalho, etc.), abre igualmente a porta para a precariedade. Por exemplo, no domínio da conciliação entre trabalho e família, é ainda frequente em Portugal o desrespeito pelo tempo de descanso: receber emails e telefonemas fora das horas de trabalho; ter reuniões fora do período normal de trabalho; dificuldade em faltar em caso de doença; horários rígidos em sem flexibildade para levar o filho à escola ou dar assistência a um familiar que precise, etc. Mesmo que possa admitir-se o cenário inverso – isto é da “boa” flexibilidade – e que existam empresas do ramo publicitário, tecnológico ou outros a promover uma total flexibilidade de horários e a propiciar trabalhar remotamente, em Portugal o “direito à desconexão” está longe de estar consagrado, quer do ponto de vista jurídico, quer do ponto de vista social.

Desafios regulatórios para dignificar o trabalho
São múltiplos os desafios regulatórios que se jogam no mundo do trabalho para que as promessas de trabalho digno se convertam em realidades concretas:
remover obstáculos normativos (como, por exemplo, no caso português, os que ainda persistem da lei 23/2012 e que não garantem o princípio do tratamento do mais favorável do trabalhador);
criar condições de reforço do papel interventivo e em tempo útil da Autoridade para as Condições de Trabalho;
criar condições de maior diálogo entre o poder político e as organizações sindicais, de modo a que a insatisfação laboral que tem vindo a ser intensificada ao longo do último ano, mais do que pôr ao rubro o incumprimento de promessas, se possa converter em compromissos realistas (para ambas as partes) quando ao futuro do trabalho digno;
combinar instrumentos normativos – como a lei 55/2017, que aprofunda o regime jurídico da ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho (instituído pela lei 63/2013), ou o Programa de Regularização Extraordinária de Vínculos Precários na Administração Pública (PREVPAP), consagrado na lei 112/2017 e que estabelece os termos da regularização previstos no PREVPAP, abrangendo pessoas em exercício de funções precárias que “correspondam a necessidades permanentes da Administração Pública, de autarquias locais e de entidades do setor empresarial do Estado ou do setor empresarial local, sem vínculo jurídico adequado” – poderia favorecer os preceitos de uma regulação social emancipatória mais abrangente.

proceder a uma regulação urgente do trabalho era do trabalho digital (da indústria 4.0), desde logo para lidar com os problemas da diluição de fronteiras entre trabalho e não trabalho, entre público e privado ou entre baixo-custo e elevado-custo de produção de bens, etc. Por exemplo, as várias formas de trabalho geridas por plataformas online (crowdwork) transportam consigo o risco da criação de um mercado de trabalho paralelo com direitos sociais mais pobres e distantes do modelo social europeu. A necessidade imperiosa de reconhecer o estatuto de “trabalhador” associado a uma relação de emprego, de garantir uma remuneração decente e condições de trabalho justas ou de monitorizar o trabalho de tais plataformas (por exemplo, averiguar se tais plataformas pagam impostos e contribuem para a segurança social) são apenas alguns desafios a considerar.
No ano em que a Organização Internacional do Trabalho celebra o seu centenário, um importante tributo que se pode prestar à sua missão é o contribuir para traçar caminhos efetivos de modo a que agenda do trabalho digno seja mais do que um kit de promessas passageiras e se converta numa aposta estratégica de governos, empresas, trabalhadores e cidadãos em geral.

Nota (*): Este artigo reúne uma síntese de alguns argumentos resultantes da conferência “Emprego digno: de que falamos?” que proferi no âmbito da X Fórum Nacional de combate à pobreza e exclusão social, intitulado Trabalho digno: um alicerce para a paz social, Foz do Arelho, 17 de outubro de 2018.

22.10.18

Trabalho digno

Ana Paula Laborinho, in JN

Em 2013 e 2014, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) publicou vários estudos sobre os países europeus mais afetados pela crise internacional, centrando a atenção na queda drástica do número e qualidade de postos de trabalho. Passados cinco anos, a OIT analisou a resposta à crise em Portugal, destacando a recuperação do mercado de trabalho, a diminuição das taxas de desemprego e o retorno à negociação coletiva. O relatório apresentado esta semana destaca os múltiplos fatores que impulsionaram estes resultados: desde a política monetária do BCE e o forte crescimento das economias dos parceiros comerciais, a fatores internos como a dinâmica das empresas exportadoras, a reestruturação do setor público ou o rápido progresso dos níveis de escolaridade e formação.

Existe um impacto positivo do emprego nas contas públicas, com menos subsídios de desemprego e mais contribuições para a Segurança Social. Também o aumento do salário mínimo tem servido para contrariar a ideia de uma competitividade baseada em salários baixos, apostando-se na qualificação das pessoas.

Mas, como sublinha a OIT, Portugal não pode dormir à sombra dos louros conquistados: desempregados de longa duração e jovens mantêm a dificuldade em aceder ao mercado de trabalho e o número de trabalhadores precários é muito elevado. Além disso, continuamos a privilegiar o trabalho intensivo em vez de um desempenho por objetivos: é ainda bem visto passar muitas horas no local de trabalho mesmo com baixa produtividade. Basta o exemplo das empresas mais competitivas para confirmar que temos de investir em trabalho de qualidade, estruturado em resultados e capaz de conciliar vida profissional e pessoal.

Arrastamos uma pesada herança de estereótipos sobre trabalho e família. Nem há 50 anos, o livro da 1.a classe desenhava este quadro: "A única tristeza da nossa casa é que o meu pai não esteja sempre connosco, pois que trabalha todo o dia, longe de nós, para nos sustentar". A família pobre, humilde, esforçada, o pai chega cansado da longa jornada, a mãe prepara o jantar.

O modelo social mudou e cada vez mais as famílias partilham responsabilidades, mas falta muito caminho para um trabalho digno, com trabalhadores mais qualificados, menos precariedade e melhores salários. A trajetória de Portugal tem mostrado que existem alternativas para as crises, desde que as pessoas sejam colocadas em primeiro lugar.

17.10.18

Mais de um milhão de portugueses trabalham, mas são pobres

in Revista Sábado

Esta quarta-feira assinala-se o Dia Internacional de Erradicação da Pobreza.

A Rede Europeia Anti-Pobreza alertou esta quarta-feira para mais de 1,1 milhões de portugueses que têm trabalho, mas são pobres, apontando que um emprego não basta e que é preciso uma aposta na educação e em melhores qualificações.

Em entrevista à agência Lusa, por ocasião do Dia Internacional de Erradicação da Pobreza, que se assinala hoje, o presidente da EAPN Portugal adiantou que um trabalho digno é o tema que a ONG escolheu para chamar a atenção para a data.

"Em Portugal, temos 10,8% de trabalhadores que são pobres, achámos que era necessário chamar a atenção para esta realidade, de que não basta ter um emprego para sair da pobreza", apontou o padre Jardim Moreira.

Uma em quatro crianças em risco de pobreza na União Europeia
O responsável sublinhou que "não basta ter um qualquer dinheiro para ter uma vida adequada à dignidade humana, é preciso ter um rendimento adequado, que possibilite satisfazer as necessidades familiares".

Por outro lado, salientou que há muita gente que tem dificuldade em aceder a empregos mais bem pagos porque lhes falta as qualificações necessárias.

Nesse sentido, defendeu que falar da necessidade de um trabalho digno implica também uma política de formação em educação, sobretudo pensada nos mais novos, "para que eles não fiquem fora do emprego qualificado".

"Senão, não conseguimos sair desta situação", avisou.

O responsável pela EAPN Portugal apontou as melhorias verificadas nos últimos dois anos com impacto "no nível de vida de muitos pobres", desde logo pelo aumento dos rendimentos disponíveis ou pelo aumento do valor das reformas.

"Mas a verdade é que ainda continuamos com 18,3% de pobres de rendimentos e chegam aos 23,3% os excluídos", destacou, considerando que "apesar da melhoria, de modo global, os números não são ainda satisfatórios".

Jardim Moreira defendeu que é preciso emprego com capacidade de respostas para as necessidades da pessoa ou da família e que, para isso, é preciso que as pessoas tenham mais e melhores qualificações.

"Não basta ter emprego, é preciso qualificar as pessoas para elas poderem ter acesso a empregos mais bem remunerados e terem mais rendimentos", defendeu o padre Jardim Moreira.

De acordo com o presidente da EAPN Portugal, a pobreza em Portugal é estrutural e, por isso, requer "uma intervenção transversal de vários ministérios".

Salientou que uma das maiores preocupações são as mães solteiras, um problema para o qual também é necessária uma aposta na educação, na formação e na integração familiar.

"É preciso insistir na formação dos mais jovens para a integração familiar porque fora da família nem se realizam, ficam marginais, não conseguem ter condições de trabalho porque lhes falta toda esta solidariedade familiar que é fundamental para o desenvolvimento das pessoas que a constituem", explicou.

Sublinhou também que a solução pela educação também tem a ver com o facto de o abandono escolar ainda ser muito elevado e o aproveitamento escolar fraco, havendo "muita gente que passa pela escola e chega ao fim quase sem qualquer qualificação".

Quanto ao facto de não haver uma estratégia nacional de combate à pobreza desde 2015, Jardim Moreira frisou que isso foi não só um retrocesso em relação ao trabalho que estava a ser feito, como o "ignorar e fechar os olhos à realidade nacional".

"Foi um erro de justiça para com as pessoas mais vulneráveis", rematou.

Durante o dia de hoje, a EAPN Portugal vai estar na Foz do Arelho, para o seu X Encontro Nacional, que conta com a presença do ministro do Trabalho, da Solidariedade e de Segurança Social, José Vieira da Silva, e onde vai decorrer o seminário "Trabalho Digno: um alicerce para a paz social".

29.6.16

Países africanos reunidos para aprovar estratégia sobre trabalho digno

in Notícias ao Minuto

Representantes de 15 países africanos estão reunidos hoje na cidade da Praia, Cabo Verde, no primeiro de dois dias de um encontro que visa discutir e validar uma estratégia para o trabalho digno nos países de rendimento médio.

O encontro, organizado pelo escritório regional para África da Organização Internacional do Trabalho (OIT), conta com a participação de representantes de países como São Tomé e Príncipe, Zâmbia, Ilhas Maurícias, Suazilândia, Costa do Marfim, Camarões, Tunísia, Gabão, Argélia, Egito, Quénia, Nigéria, África do Sul, Sudão e Cabo Verde.

De acordo com as Nações Unidas, 26 dos 54 países africanos estão classificados como países de rendimento médio, concentrando 56% da população do continente.

O PIB 'per capita' elevou-se a 4.058 dólares (3.696,56 euros) e a percentagem média de cidadãos dos países de rendimento médio que vivem abaixo da linha de pobreza é de 38,6%, ligeiramente abaixo da taxa média de pobreza no continente, que se situa nos 44%.

Por isso, durante a sua intervenção na sessão de abertura do encontro, o diretor regional da OIT para África, Aeneas Chuma, considerou "vital" a execução de uma Agenda para o Trabalho Digno nos países de rendimento médio à semelhança da já aprovada para os estados frágeis de África.

"O trabalho decente sintetiza as aspirações das pessoas nas suas vidas de trabalho, incentiva oportunidades de trabalho que sejam produtivas e que correspondam a um rendimento justo, à segurança no local de trabalho e à proteção social das famílias".

Aeneas Chuma lembrou que a Estratégia de Trabalho Decente para os Países de Rendimento Médio resulta de um conjunto de alargado de consultas em vários países e apelou aos participantes para que, além da validação da estratégia, pensem, desde já, num modo de a operacionalizar.

"Uma estratégia só é boa se a sua implementação também for", disse.

Por seu lado, o primeiro-ministro de Cabo Verde, Ulisses Correia e Silva, sublinhou o facto de o encontro decorrer numa altura em que o país debate a aplicação interna da Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável, assumindo como prioritária a erradicação da pobreza, o emprego, a educação e a segurança.

"Não existem outras escolhas que não passem pela criação de condições para o trabalho decente, não só do ponto de vista salarial e laboral, mas da liberdade das pessoas para serem autónomas e autossuficientes na sua relação com o Estado e com o poder político", disse.

Ulisses Correia e Silva exprimiu ainda a ambição de "através de um crescimento económico inclusivo e sustentado criar condições para o pleno emprego numa década"

"Cabo Verde não almeja gerir o trabalho precário, muito menos a pobreza que deste emana. Queremos um crescimento económico sustentado em trabalho decente e digno, que erradique a pobreza", disse.

O encontro, que conta ainda com representantes das entidades patronais e sindicais africanas, prossegue terça-feira, devendo no final validar a Estratégia Trabalho Digno em Países de Rendimento Médio.