Ana Rute Silva, in Público on-line
Escola de Gestão da Universidade Católica criou um laboratório de investigação experimental com uma loja fictícia
Saber o que pensam, como se comportam numa loja, por que decidem comprar determinado produto e rejeitar outro, para onde olham, como circulam dentro do espaço comercial, quanto tempo demoram a decidir o que comprar. Das empresas do retalho, às marcas da indústria, investigadores e especialistas de marketing, todos querem traçar o perfil do consumidor, observá-lo ao detalhe, escrutiná-lo, dissecá-lo. Entrar na mente de quem vai às compras significa melhores resultados na caixa registadora. E, numa altura em que o preço dita quase todas as decisões das famílias na hora de ir as compras, conhecer em detalhe o comportamento do consumidor ganha nova relevância.
"Nos últimos 20 anos, tem havido uma evolução muito grande do estudo do comportamento do consumidor. Se olharmos para os trabalhos de investigação dos anos 1980, vemos que são de grande simplicidade. Nessa altura, o estudo nesta área era incipiente", diz Rita Coelho do Vale, professora auxiliar da escola de Gestão da Universidade Católica, em Lisboa, e responsável pelo recém-inaugurado Laboratório de Investigação Experimental.
Analisar expressões faciais
Instalado no primeiro piso da escola numa sala de aulas remodelada, o Lerne (sigla para Laboratory of Experimental Research in Economics and Management) promete dar uma ajuda a investigadores e empresas na observação directa e em "ambiente controlado" de experiências de compra. Servirá não só para estudos sobre o retalho alimentar, como do comércio alimentar. E ajudará a perceber, dentro de alguns anos, o que mudou no consumidor com a crise e a evolução do sector.
Em cubículos forrados de tecido azul, há computadores de ecrã plano onde se vê o sítio do Orix, um supermercado online fictício, criado de raiz, e que está a servir para investigar o impacto da embalagem das marcas da distribuição na escolha do consumidor. "São experiências em software que permitem aferir a reacção a estímulos num ambiente controlado. À distância, não conseguimos apurar o tempo que se demora a escolher um determinado artigo, nem saber em que ambiente é feita a pesquisa", diz Rita Coelho do Vale.
No laboratório experimental, tudo é analisado em detalhe, incluindo as expressões faciais. Há câmaras nos computadores que monitorizam os rostos dos participantes nos estudos. Os programas de software também servem para perceber como olhamos para uma embalagem e a associamos a determinada categoria de produto. Por exemplo, cronometra o tempo que um consumidor demora a identificar a embalagem como sendo de uma garrafa de água ou detergente.
Numa pequena sala, há um minimercado com prateleiras, carrinho de compras e câmaras a vigiar os participantes. "Conseguimos perceber os efeitos das promoções, a influência da disposição dos produtos na prateleira ou até os impactos do tamanho dos carrinhos de compras", explica Rita Coelho do Vale. Num supermercado, não há produtos colocados ao acaso. As bolachas infantis estão quase sempre posicionadas nas prateleiras em baixo, na zona do joelho, para que as crianças as vejam e convençam os pais a comprá-las, exemplifica.
A professora de marketing vai mostrando o Lerne, pensado há quatro anos e financiado em grande parte por um antigo aluno que hoje trabalha no retalho mas preferiu manter o anonimato. As janelas podem ser tapadas com painéis que travam a luz natural, explica Rita Vale, lembrando-se do caso do Wal-Mart, a maior empresa de retalho do mundo.
"Fizeram um estudo em duas lojas. Numa colocaram luz natural numa secção, noutra mantiveram a luz artificial. Concluíram que, na que tinha luz natural, as pessoas demoravam mais tempo a fazer compras e gastavam mais", diz.
O laboratório está pensado para as empresas de retalho e para os investigadores. E é uma ferramenta que pode ajudar a Católica no recrutamento internacional de professores. Ter um pequeno supermercado "era um factor crítico para recrutar" e fundamental "na investigação de topo", diz Rita Vale.