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Na educação, foram estudados 10.249 casos e 91 por cento destes profissionais revelam risco grave de sobrecarga
Os trabalhadores portugueses sentem-se cada vez menos recompensados e reconhecidos, revela um estudo, que regista uma degradação do envolvimento das pessoas no trabalho e identifica riscos graves ou moderados de falta de energia, sobrecarga e exaustão.
O estudo, promovido pela Associação Portuguesa de Psicologia da Saúde Ocupacional (APPSO) e que analisou quase 33.900 casos entre 2010 e 2013, concluiu ainda que o trabalho é cada vez mais encarado apenas como forma de obter um rendimento no final do mês.
Segundo dados de 2012 do estudo, que avalia os riscos psicossociais em empresas portuguesas, 73 por cento dos trabalhadores sentiam que o seu esforço não era recompensado pelo salário, nem reconhecido pelas chefias e colegas.
86 por cento dos trabalhadores apresentavam risco elevado de perda de energia, 79 por cento de falta de vigor e 71 por cento tinham um fraco sentimento de justiça social e laboral.
"Há uma degradação do envolvimento das pessoas face ao trabalho. Cada vez mais as pessoas usam o trabalho numa perspetiva instrumental e esse objetivo mais instrumental, que muitas vezes é o ordenado ao fim do mês, começa a não ser suficiente para que as pessoas o considerem uma boa recompensa. As pessoas consideram que as recompensas que vão recebendo pela sua atividade laboral não equilibram o esforço que têm feito", disse à agência Lusa João Paulo Pereira, presidente da APPSO.
Por tudo isto, segundo João Paulo Pereira, os trabalhadores apresentam elevados riscos de fadiga, exaustão e complicações emocionais como o esgotamento (burnout).
Segundo o estudo, 63 por cento dos trabalhadores (62,5 no caso das mulheres e 76,3 no caso dos homens) apresentavam risco de sobrecarga, 62 por cento de exaustão (84,1 no caso das mulheres e 82,7 no caso dos homens) e 38 por cento de burnout (12,7 por cento nas mulheres e 31,6 por cento nos homens).
Por setores, João Paulo Pereira destaca os riscos acrescidos entre os profissionais da saúde e da educação.
Na saúde, o estudo analisou 12.725 casos e concluiu que 92 por cento destes evidenciam falta de energia, 88 por cento correm risco grave de exaustão e 61 por cento risco moderado de burnout.
78 por cento não se sentem recompensados.
Na educação, foram estudados 10.249 casos e 91 por cento destes profissionais revelam risco grave de sobrecarga, 82 por cento risco moderado de exaustão e 79 por cento risco moderado de esgotamento.
Entre os profissionais do comércio, serviços e distribuição, o risco grave de sobrecarga atinge 94 por cento dos 10.917 trabalhadores avaliados, enquanto o risco de esgotamento abrangia 64 por cento.
97 por cento dos trabalhadores deste setor não se sentiam recompensados pelo seu trabalho e 73 por cento tinham um fraco sentimento de justiça laboral.
A mudança da filosofia e das normas tradicionais do mercado de trabalho, a menor estabilidade social e a pressões como o aumento do horário laboral são apontadas como algumas das causas que influenciam o envolvimento das pessoas no trabalho.
"A pressão sobre o cumprimento de mais horas de trabalho em que a recompensa não vai progredir na mesma percentagem tem uma influência determinante em termos emocionais", sublinhou.
João Paulo Pereira destacou ainda que o estudo revela que, apesar destes resultados, os trabalhadores evidenciam "forte capacidade" para dar a volta aos momentos menos bons.
"As pessoas continuam a ter um sentimento de realização (68 por cento dos trabalhadores sentia-se realizados) que os protege da chegada a estados limite. Não evita o aumento [do consumo] de antidepressivos e ansiolíticos, de substâncias como o álcool, tabaco e outras, mas dá um potencial grande de intervenção e de alertar a sociedade para que existem condições para inverter esta tendência mais negativista em relação ao trabalho", disse.
O estudo completo será apresentado durante o Congresso Internacional da Associação Portuguesa de Psicologia da Saúde Ocupacional, que decorre quinta e sexta-feira em Lisboa, subordinado ao tema "Felicidade e sentido de vida no trabalho".