Texto de Mariana Correia Pinto, in Público on-line (P3)
Estuda o envelhecimento e quer ajudar a construir sociedades mais felizes, onde todos tenham espaço. Preparar a chegada à terceira idade é fundamental, defende a docente e investigadora de 30 anos que trabalha de forma precária e intermitente
Há muitas perguntas para as quais Teresa Martins continua em busca de resposta. Mas há pelo menos uma a que — "infelizmente" — reage sem qualquer hesitação: ainda tratamos mal os nossos idosos? "Muito mal. Infelizmente essa pergunta tem uma resposta fácil", disse ao P3, dias depois de ter sido distinguida com o prémio Jovem Investigador no XXVII Congresso Internacional de Pedagogia Social, com um trabalho que fala precisamente sobre os idosos — e sobre o envelhecimento, que é "um processo contínuo" pelo qual todos estamos a passar a todo o momento.
Esse "processo" é um bom ponto de partida para prender a atenção das pessoas no assunto. "Costumo dizer que se não pensarmos sobre a questão pelos outros, que pensemos a partir de nós. Todos havemos de chegar à velhice, há que pensar nela, na velhice que queremos ter e que podemos e devemos preparar", defende a docente da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico do Porto (ESE), que foi reconhecida pelo trabalho “A reforma e laço social. Encontros e desencontros de uma transição”, decorrente da sua tese de mestrado.
A vontade de trabalhar na área da Gerontologia vem de longe: depois da conclusão da licenciatura em Educação Social e de começar a trabalhar como técnica na faculdade onde se formou, Teresa Martins apostou num mestrado que explorava a questão do voluntariado entre os mais velhos, e está agora no segundo ano do doutoramento, onde quer descobrir mais sobre a intervenção cívica dos idosos na política — isto apesar desta aposta na educação e numa carreira universitária quando se tem 30 anos não ser para o bolso de todos (já lá vamos). O fascínio pelo tema é fácil de explicar: "Estudar o envelhecimento é muito mais do que estudar a velhice e muito mais do que cuidar das pessoas mais velhas — apesar desse lado ser fundamental", diz Teresa Martins que realça não querer ser a "porta-voz de uma realidade", mas apenas "dar-lhes visibilidade".
No trabalho agora premiado, Teresa Martins centrou atenções na saída do mercado de trabalho e nas alterações que esse momento acarreta para a vida das pessoas. Problema identificado: a visão estereotipada que existe das pessoas que entraram na terceira idade. "Eu própria talvez tivesse uma visão muito estereotipada do que é trabalhar com estas pessoas antes de o começar a fazer", admite a jovem natural de Oliveira de Azeméis. O mestrado da investigadora, ponto de partida para este trabalho, tentou desmontar essas ideias: "Falei com pessoas que decidiram dedicar o seu tempo ao voluntariado e com isso mostrar que existem experiências de vivência da velhice diferentes daquelas que são o estereótipo comum: da inactividade, da improdutividade, da pessoa que só consome recursos. Isto é uma injustiça brutal e de uma violência e ingratidão difíceis de compreender."
Docente precária e intermitente
Quando Teresa não hesita ao dizer que tratamos mal os idosos em Portugal sabe bem do que fala. Exemplo do dia-a-dia: "A semana passada uma das senhoras que mora na minha rua disse-me que andava no dentista para pôr uma placa nos dentes e que a neta lhe tinha dito 'mas por que é que vais gastar tanto dinheiro nos dentes se vais morrer?' Isto é brutal, isto é mal-tratar as pessoas" Mas há mais: tratamos mal os idosos quando as ignoramos, quando os vemos como inferiores, quando aceitamos que "60% vivam com um rendimento até 500 euros". O último ponto não é apenas um problema geracional — Teresa Martins sabe-o por experiência própria. Trabalha precária e intermitentemente como docente na ESE, ocupação que vai conciliando com outras actividades que vão permitindo a continuação no ensino e na investigação e permitam viver condignamente. Aprendeu, com o tempo, a "gerir a incerteza" e não põe de lado a ideia de emigrar. "Não estou fechada a opções. Não posso estar. Obviamente gostava de ter uma estabilidade diferente."
Para já, a investigadora não pretende parar de investigar. E gostava de ver a sociedade a apostar de forma mais concertada na "preparação da velhice": "Podemos pensar agora com mais tempo do que as pessoas que são agora idosas. Já sabemos que a nossa esperança média de vida é elevada, enquanto muitas das pessoas que hoje têm 80 anos não esperavam chegar a esta idade." E preparar a velhice significa exactamente o quê? "É uma boa pergunta, para a qual também ando à procura de resposta", sorri a investigadora, acrescentando: "Uma das coisas que vários estudos vão indicando e que os resultados que fui tendo também indicam é que, por exemplo, as pessoas que ao longo da vida vão estando envolvidas em algumas actividades cívicas, comunitárias, desportivas ou outras, provavelmente vão ter mais vontade de as continuar depois da reforma."
Que alterações incentivar para que os idosos sejam um grupo etário valorizado é uma indagação complexa. "A questão é mais 'para que sociedade é que estamos a contribuir que tem tanta necessidade de criar guetos para toda a gente'. Se todas as pessoas tiverem lugar para continuarem a exercer papéis — sejam os que elas quiserem —essa questão não se coloca." Teresa Martins percebeu, por exemplo, que, quando "desafiadas", as pessoas envolviam-se mais facilmente no voluntariado: "As pessoas falavam de um clique que era em quase todos os casos o facto de alguma instituição se dirigir a elas e as convidar a serem voluntárias."
Pensar sobre este grupo etário é também uma forma de afastar medos — "As pessoas têm relutâncias porque está associado a coisas más: a doenças, a perdas físicas, a perdas das pessoas de quem gostamos. Tudo isto existe, mas pode acontecer em qualquer etapa da nossa vida." E mais: "O caminho que vamos fazendo ao longo da vida vai ter um impacto na forma como vamos experimentar a nossa vivência da velhice" — e por isso, pede a investigadora, era bom que pensássemos sobre o assunto.