Foi ali, no Tortosendo, que nasceu um manual escolar, validado pela Direção Geral da Educação, que aborda a cultura cigana. A Renascença foi conhecer Tiago, Mário, António, Rosa e outros ciganos. Celeste não é cigana, mas casou com um elemento desta comunidade.
Em Tortosendo, vila do concelho da Covilhã com 5.600 habitantes, há uma comunidade cigana composta por cerca de 200 pessoas (50 famílias). A ligação próxima com o presidente da Junta, aliada ao culto da fé e aos cursos de formação constantes, tem contribuído para uma verdadeira e recíproca integração da comunidade que ali nasceu e vive, fruto de uma geração com mais de um século de vida.
O culto da fé numa improvisada garagem tem sido o motivo de mudança para muitos dos jovens da comunidade cigana do Tortosendo.
“Ele era um vadio, um ‘estroina’, só noitadas, não parava. Entrou no culto, vai ser pastor, está como candidato no período de 5 anos em que tem de demonstrar um comportamento adequado”, conta o pastor evangélico, Mário Fernandes, de 48 anos, representante da comunidade cigana do Tortosendo.
Falava de Tiago Gonçalves, 29 anos, casado e três filhos. Agora, está a tirar um curso (frequentado por 30 pessoas da comunidade cigana) na Casa da Vila do Tortosendo, na área da agricultura. Trata-se de um curso de operador agrícola, de 300 horas, do Programa Operacional do Emprego e Inclusão social (POISE).
O valor que recebe varia de mês para mês. A bolsa de formação mais o subsídio de alimentação varia entre 150 a 200 euros.
“Estamos a tentar formar-nos para arranjar emprego para a ciganada toda. Sou cigano com muito orgulho”, começa por sublinhar Tiago, que nega receber o Rendimento Social de Inserção (RSI), admitindo apenas ter o apoio do abono das crianças.
“Nem todos os ciganos são subsídio-dependentes, trabalhei toda a vida. Recebi o RSI um ano ou dois, vivo no meio da vila. Pago 235 euros de renda e recebo o abono dos miúdos”, conta Tiago à Renascença.
“Muita gente pensa que os ciganos não trabalham. Passei pelas feiras – ser feirante é uma profissão como as outras – e sempre descontámos. Atualmente, estou desempregado, mas já trabalhei no Continente e numa unidade hoteleira”, realça ainda, sem deixar de admitir que arranjar emprego é difícil.
“Uma vez conheci um empregador que, quando percebeu que era cigano, desistiu de me dar emprego”, lamenta Tiago, que considera que o trabalho do cigano pode e deve passar pela agricultura.
“Acho que o cigano está bem no trabalho do campo. Já há muitos anos que ando a trabalhar na agricultura, na apanha da cereja, do pêssego, a fazer trabalhos de campo. Estamos agora a aprofundar os conhecimentos na agricultura, a aprender muito e estou a gostar de estar inserido na sociedade”, defende.
“Há muita gente que nos discrimina por não querer trabalhar ou não nos querermos formar, mas graças ao presidente da Junta estamo-nos a inserir e a formar”, enaltece Tiago Gonçalves, reforçando que gosta de viver no Tortosendo.
“Temos amigos por todo o lado. Não criamos desacatos e tentamos manter a paz, somos pessoas de Deus”, conclui.
“No tempo dos meus bisavós era complicado”
Tiago Gonçalves faz parte do grupo de 30 pessoas da comunidade cigana que frequentam o curso de formação em agricultura na Casa da Vila do Tortosendo. Graciosa Vicente, 53 anos, e Talita Vicente, de 28, completaram o 4º ano de escolaridade.
“Gostamos de trabalhar nestes cursos. Já não trabalhamos nas feiras e é melhor assim. Somos muito respeitados e a gente também os respeita. Já não há tantas tradições, os casais já se juntam já se casam com quem querem”, afirma Graciosa.
“No tempo dos meus bisavós é que era complicado. Hoje já está tudo nas escolas, tudo sabe escrever e eu no meu tempo já fui à escola, mas sendo