16.11.21

86% das pessoas quer acabar os dias em casa

 Fátima Ferrão, in Expresso

Portugal tem que criar uma economia da longevidade, que seja um dos pilares fundamentais da sociedade e um eixo de desenvolvimento económico. Uma conclusão com a concordância de todos os peritos presentes na conferência “Parar para Pensar: Longevidade”, integrada no ciclo de oito debates, que juntam o Expresso à Deco Proteste, e que contam com o patrocínio da Google. Conheça as conclusões da conversa de hoje no edifício da Impresa

Portugal é o quarto país mais envelhecido do mundo e, segundo as previsões de evolução demográfica, será o terceiro entre 2030 e 2040. Uma realidade que coloca um conjunto de desafios sociais e económicos ao sector público, mas também às empresas e ao privado. “É preciso garantir a dignidade no envelhecimento”, defende António Lacerda Sales, um dos convidados da conferência “Parar para Pensar: Longevidade”, que decorreu hoje no edifício sede da Impresa. Para o secretário de Estado Adjunto e da Saúde, depois dos 65 anos e da reforma, as pessoas continuam a querer – “e muito bem” -, participar na vida ativa com projetos e escolhas. No fundo, acredita, “a longevidade é uma sementeira que começa na concepção, e que se reflete e determina tudo o que fazemos ao longo da vida”. Isto significa, diz ainda o governante, que “temos que olhar muito seriamente e com muita responsabilidade para esta questão”.

Ana Sepúlveda, socióloga e fundadora do 40+ Lab, consultora para os temas do envelhecimento e da longevidade, acredita que, apesar de ainda haver um longo caminho a percorrer em Portugal na abordagem a estas temáticas, no último ano, “foram dados passos muito grandes”. A criação da rede Repensa, que junta o trabalho realizado pelos quatro centros de estudos dedicados à questão do envelhecimento que, anteriormente, trabalhavam de forma isolada, foi “um grande avanço”. Ainda assim “não olhamos para a economia da longevidade que, em alguns países, já foi colocada como um dos pilares fundamentais da organização económica e social”.

Na opinião de Maria da Luz Cabral há, de facto, muito a fazer para transformar mentalidades e para mudar a estrutura da sociedade, de forma a dar resposta ao aumento da esperança média de vida das pessoas. Nas empresas, exemplifica, é necessário flexibilizar a saída do mercado de trabalho e preparar essa nova fase da vida que, não obrigatoriamente será menos ativa. A coordenadora do projeto de políticas públicas na longevidade da Santa Casa da Misericórdia acredita que “é preciso capacitar os profissionais a partir da experiência e do conhecimento dos mais velhos, que é obrigatório continuar a integrar nas empresas e na sociedade”. Uma opinião partilhada por Carlos Lobo, sócio fundador da Lobo Vasques, sociedade de advogados especializada em direito fiscal. “É uma oportunidade vivermos mais tempo, mas estamos a transformar o que podia ser um ativo, num passivo”, diz, acrescentando que “temos que mudar mentalidades e o atual anátema da velhice”.

Outras conclusões:

Maria da Luz Cabral revela que, segundo um estudo realizado no projeto que coordena na Santa Casa da Misericórdia, 86% das pessoas inquiridas manifestaram desejo de terminar os dias na sua casa. Mas para concretizar esta vontade será necessário apostar no reforço de estruturas como o apoio domiciliário, mas num formato personalizado de acordo com cada um. “Temos que criar uma sociedade que cuida bem, com cuidado humano”, diz. Carlos Lobo complementa: “Toda a estrutura do Estado tem que ajustar-se para ter mais pessoas a cargo”.

“Temos que evitar que a vida depois dos 65 anos seja de solidão e de falta de atividade”, afirma António Lacerda Sales. E “será necessária uma maior confluência intergeracional, e uma estratégia na área do envelhecimento ativo e da economia da longevidade”. E esta mudança tem que começar de cima para baixo, acrescenta Ana Sepúlveda. “Do poder económico, para o poder público, Portugal tem que encontrar o seu espaço neste mundo”.

António Lacerda Sales recorda também os desafios que se colocarão em Portugal com a concretização das projeções que apontam para que, em 2070, o país tenha dois milhões de pessoas a menos, dois terços da população com mais de 65 anos e quatro milhões de pessoas ativas. A solução, defende, tem que começar a ser pensada desde já, criando uma estratégia nacional para a longevidade, articulada com uma estratégia europeia, uma vez que todos se debatem com os mesmos problemas.


“Longevidade é uma mentalidade emergente”