17.11.21

Os culpados do salário mínimo

Manuel Carvalho, in Público on-line

Desde a criação do euro, Portugal geriu a conjuntura. Fez pouco ou nada para sair da armadilha do rendimento medíocre.

A pobreza do salário mínimo ou a indigência do salário médio geram hoje um dos mais importantes debates sobre o país. Como tem acontecido regularmente, os valores baixos dos salários servem para se denunciar as precárias condições de vida de milhões de portugueses, criticar as políticas públicas e julgar as relações de força entre trabalho e capital. Nesta discussão, não se encara com o mesmo vigor as causas profundas deste quadro de pobreza: uma economia amarrada ao passado, que já não retrata a dinâmica ou a qualificação da sociedade portuguesa. Fala-se mais do sintoma do que da causa profunda da doença.

De pouco vale persistir em acusações maniqueístas que tanto passam culpas para os patrões e o capitalismo, como para os trabalhadores e o Estado sobre as causas que condenam um quarto dos trabalhadores portugueses a sobreviver com o salário mínimo. O problema existe porque Portugal se viciou há décadas em discutir muito a redistribuição e pouco a criação de riqueza. Até à troika, o rentismo e os sectores protegidos da concorrência internacional serviram de cortina para iludir o problema. Depois da troika, veio a ilusão de que bastava decretar o fim da austeridade para que a riqueza abundasse. Desde a criação do euro, Portugal geriu a conjuntura. Fez pouco ou nada para sair da armadilha do rendimento medíocre.

O debate em torno dos salários baixos é, por isso, inultrapassável, mas só será útil se der origem a um maior equilíbrio entre o indispensável discurso social e o obrigatório incentivo à actividade económica. Durante os anos da “geringonça”​, fez-se um e esqueceu-se o outro – era impossível querer mais quando os orçamentos dependiam de dois partidos hostis à iniciativa privada. Com mais ou menos apoio público, boa regulação, acertos fiscais, estímulos a jovens e à inovação, haverá escolhas na esquerda ou na direita moderadas para definir um rumo. O salário mínimo deve aumentar, tem de aumentar, mas era bom que aumentasse porque o país enriqueceu e não porque o Governo quer.

O valor deste debate está por isso na sua própria existência. As prioridades políticas do próximo Governo têm de considerar a economia como factor crítico do progresso social. Com mais tempero à esquerda ou à direita, mais ou menos liberalismo ou intervenção pública, tudo é possível. O que não é possível é continuar a lamentar a pobreza que persiste junto de quem trabalha, como nos mostrou a reportagem da jornalista Natália Faria deste domingo, e acreditar que o problema está na gula dos patrões e a solução na sensibilidade do Estado. Não está. O problema está num modelo económico que