Os últimos dados sobre a pobreza em Portugal são um murro no estômago. De acordo com a Pordata, a população em risco de pobreza ou de exclusão social aumentou 12,5% em 2020 face ao ano anterior, passando para 1,9 milhões de pessoas. E sem transferências sociais, teríamos 4,4 milhões de pobres (com rendimentos abaixo do limiar de pobreza, 554 euros) no nosso país, mais de 10% deles com trabalho.
Trata-se da primeira subida do número de pobres desde 2014 e coloca Portugal entre os piores países europeus neste indicador: 8.º lugar, melhorando um pouco com as transferências sociais (10.º lugar). A precariedade da habitação (25% da população vive em alojamentos sem condições), a pobreza energética (16% é incapaz de aquecer convenientemente a casa) e a privação alimentar (6% não consegue assegurar uma refeição de dois em dois dias) são as faces desta emergência social.
O país está, assim, mais longe da meta que se propôs atingir até 2030: menos 765 mil pobres. O impacto da pandemia no tecido económico e social explica, em parte, esta dramática subida da pobreza. Mas o problema é estrutural e tem a ver, sobretudo, com a estagnação económica, a desigualdade na distribuição de rendimentos, a precariedade do emprego, os baixos níveis de qualificação e a exiguidade salarial.
Sendo fundamentais e imprescindíveis, as transferências sociais não resolvem o problema da pobreza e o seu aumento é condicionado pela sustentabilidade das contas públicas. A solução passa, necessariamente, por um maior dinamismo económico. Acontece que, como sabemos, as perspetivas de crescimento são pouco animadoras no tumultuoso contexto geopolítico de hoje.
A inflação pode, aliás, agravar a situação da pobreza em Portugal. O aumento dos preços afeta particularmente as famílias de menores recursos, cujos rendimentos são direcionados para os bens de primeira necessidade, como a alimentação e a energia, que já subiram mais de 20%. E são também estas famílias que têm níveis de poupança mais baixos, não podendo por isso acomodar o crescimento das despesas domésticas.
Na atual crise inflacionista, o esforço do país deve ser orientado para os mais vulneráveis, salvaguardando os seus rendimentos e fornecendo-lhes apoios extra, nomeadamente para acesso a produtos alimentares e energéticos. Por outro lado, há que preservar a capacidade produtiva e a competitividade das empresas, de forma a defender o emprego e a garantir alguma progressão salarial.