Governo devia criar "planos de recuperação que reforcem as estruturas com meios que permitam tentar recuperar os níveis de funcionamento" de algumas pessoas, defendem duas professoras universitárias.
Rosa Marina Afonso, professora de Psicogerontologia na Universidade da Beira Interior (UBI), com investigações sobre o impacto da Covid-19 nos profissionais das Estruturas Residenciais Para Pessoas Idosas (lares), considera “ser imperativo” pensar “uma fase pós-pandémica” para esta população, mas também para pessoas com deficiência ou em cuidados de longa duração.
À semelhança do que está a acontecer com a economia ou a educação, a investigadora defende a criação, por parte do Governo, de “planos de recuperação que reforcem as estruturas com meios que permitam tentar recuperar os níveis de funcionamento” de algumas pessoas.
Assunção Vaz Patto, neurologista e professora no mesmo estabelecimento de ensino superior, onde leciona cadeiras de Geriatria, frisou que a pandemia veio mostrar “as fragilidades do sistema“, o “problema gravíssimo de idosos dependentes” e afirmou ser “a altura certa” para se pensar em novas respostas, novas maneiras de encarar o envelhecimento, como pensar num envelhecimento ativo e saudável.
A investigadora salientou o agravamento do estado de pessoas que já manifestavam limitações. Com o isolamento, devido à pandemia, há uma degradação “em termos cognitivos e motores, porque as pessoas deixaram de ser estimuladas, e a parte afetiva acaba por influenciar tudo o resto“.
Eu tenho doentes que simplesmente não conseguem entender porque é que os filhos deixaram de os visitar. Tenho observado nas consultas que há um agravamento muito grande a nível cognitivo e motor, com o sofrimento todo que isto provoca”, destacou Assunção Vaz Patto, em declarações à agência Lusa.
Rosa Marina Afonso lamentou os diferentes ritmos a que o desconfinamento está a ser feito, com prejuízo para os residentes em lares, onde em várias instituições existem ainda muitas limitações e algumas atividades foram interrompidas.
A professora do Departamento de Psicologia e Educação da UBI preconizou a necessidade de “planos de recuperação dessas pessoas ao nível da fisioterapia, de estimulação cognitiva, de retomar os laços intergeracionais“, entre outras áreas de intervenção.
Rosa Marina Afonso vincou o esforço feito pelos funcionários das ERPI, uma profissão “pouco valorizada em termos de salários e de condições de trabalho” e que “foram uns heróis“, agora “esgotados pelo esforço feito“. À agência Lusa, a investigadora acrescentou a dificuldade de a maioria das instituições, individualmente, terem recursos para assegurarem esse reforço de meios para ajudar a recuperar capacidades perdidas. A investigadora considera dever ser o Estado a “dar ajuda adicional, quer a nível de recursos financeiros, quer na dotação de meios técnicos”.
“Vejo isto como uma necessidade. Há técnicos que se esforçaram imenso e deve haver uma previsão de recursos adicionais para conseguirem continuar o seu percurso”, salientou, à agência Lusa, Rosa Marina Afonso, para quem é fundamental repensar os cuidados prestados e “centrá-los mais em cada pessoa, em vez de ser uma atenção padronizada“.
A docente da UBI sustentou ser necessário “alertar que tem de se fazer uma intervenção muito dignificante junto das pessoas mais velhas e em particular para as que estão nas instituições, mas não só”, porque “as pessoas, à medida que vão envelhecendo, precisam mais desse treino das suas funções“.
“Acho que devia haver um estudo, um Plano de recuperação específico para ERPI, mas alargado a todas as pessoas com vulnerabilidades e que estiveram mais confinadas, não só idosas, porque há por exemplo pessoas com deficiência ou em cuidados de longa duração”, defendeu a docente de Psicogerontologia.
A investigadora chamou ainda a atenção para “as assimetrias” no desconfinamento, tendo em conta as diferentes faixas etárias.
“Fala-se nas crianças que estiveram no ensino online, que é preciso pensar como vão ser supridas estas lacunas. Então e em relação às pessoas que estão nos lares, que têm vulnerabilidades, mas que devem continuar a ter os seus direitos e também ficaram com muitos mais défices?”, questionou Rosa Marina Afonso, que advogou a implementação de “Cuidados redobrados“. Para Assunção Vaz Pato: “Temos de começar a encontrar soluções para o que temos em mãos, que é mau”.