31.3.09

Convergência entre Europa e EUA é muito maior que as matizes

Isabel Arriaga e Cunha, Bruxelas, in Jornal Público

Joaquin Almunia, comissário europeu responsável pelos assuntos económicos, diz que é prematuro falar em substituir o dólar como moeda de reserva


A União Europeia (UE) e os Estados Unidos (EUA) têm "um elevado grau de convergência" para a cimeira do G20 "inimaginável há três anos" tanto em matéria de regulação financeira como de estímulo à economia.

Esta posição foi ontem defendida por Joaquin Almunia, comissário europeu responsável pela economia e finanças, afastando assim qualquer ideia de divergência entre os Estados Unidos, que colocam a ênfase no combate à recessão económica, e a UE, que considera mais urgente reforçar a regulação do sector financeiro para impedir uma repetição futura da actual crise.

"Quando discutimos a regulação, os acordos são muito importantes e as matizes muito pequenas. Quando discutimos a abordagem macroeconómica, os acordos são muito mais importantes do que as matizes", afirmou Almunia em entrevista a alguns jornais europeus, incluindo o PÚBLICO.

"Há três anos, antes da crise, não podíamos imaginar este grau de consenso e de coordenação, este extraordinário e intenso processo de discussão entre os países do G20 sobre todas estas questões e sobre a forma de as enfrentar", prosseguiu, referindo-se à cimeira de líderes das principais economias mundiais dedicada ao combate à crise, que decorre quinta-feira em Londres. "É claro que os desafios são gigantescos, porque a crise é extraordinariamente séria, mas a forma como estamos a reagir de forma coordenada não pode ser de modo algum subestimada", defendeu. "Muitas coisas estão a mudar por causa da crise, e muitas coisas vão continuar a mudar, durante a crise e depois da crise, e isto é verdade para todos: europeus, americanos, chineses, direita, esquerda, mais liberais ou menos liberais", frisou.

Segundo Almunia, a cimeira "mostrará um elevado grau de consenso sobre as políticas macroeconómicas - monetária e orçamental - necessárias para combater a recessão", uma "determinação política clara para afastar o proteccionismo", e uma "longa lista de acordos" para melhorar a regulação e a supervisão dos mercados financeiros.
Ao mesmo tempo, o comissário espera "resultados concretos" em termos de reforço da capacidade de acção do FMI e outras instituições financeiras para solucionar os problemas, embora reconhecendo que as funções que lhes foram atribuídas em 1944 terão de ser reformadas, nomeadamente para "integrarem as preocupações sobre a estabilidade financeira".

No entanto, considerou, "a questão mais urgente" para Londres será "aumentar a capacidade de empréstimo do FMI" porque "a lista de países que pedem apoio financeiro aumentou muito rapidamente".

Reforço do FMI

Almunia considera possível que o G20 vá mesmo além da duplicação pedida pelo FMI da sua capacidade de empréstimo, actualmente limitada a 250.000 milhões de euros.
A expectativa resulta dos compromissos já assumidos pela UE e Japão de um reforço de 100.000 milhões cada, quando os EUA e a China ainda não anunciaram a sua contribuição.

O comissário reconheceu que o empenhamento dos países emergentes face ao FMI está dependente de um reforço da sua participação na governação do Fundo de uma forma mais adequada ao seu peso económico, considerando que a UE "deve estar pronta para esta discussão".

É prematuro trocar o dólar

Em contrapartida, considerou que a proposta do banco central chinês de criar uma moeda de reserva alternativa ao dólar, baseada nos direitos de tiragem especiais do FMI, é prematura. "É uma velha ideia de Keynes que merece ser revisitada" e que "deve ser analisada e estudada, mas não é para o curto prazo. No curto prazo é preciso reconhecer de forma realista que a moeda de reserva mundial é o dólar e que vai continuar a sê-lo".

Almunia reiterou por outro lado a recusa dos Vinte e Sete em reforçar para já os planos nacionais contra a recessão. "A UE reagiu como devia" com um estímulo, em 2009, de quase 1,5 por cento do PIB europeu. "Estamos a aplicar estas decisões, e é prematuro fazer cálculos sobre o seu impacto", o que só acontecerá na cimeira de líderes da UE de Junho, afirmou. "As decisões de política monetária e de política orçamental precisam de um certo prazo para transmitir os seus efeitos à actividade, procura, emprego ou investimento", e "há um facto que produz um atraso adicional, que é o bloqueio do crédito", frisou, concluindo: "estamos prontos a fazer mais se necessário. Não estamos pré-determinados a fazer mais, mas estamos determinados a fazer mais se for necessário".