20.3.09

Deficiente espera por casa há dez anos

Ana Trocado Marques, in Jornal de Notícias

"Um dia cai-me a casa em cima". Com o à-vontade de quem repete um gesto habitual, Glória Ramos enfia as joelheiras e, arrastando-se pelo chão, mostra, ao JN, a casa em risco de ruína, uma das nove ainda habitadas nos terrenos da antiga Narfil, junto à antiga estação da CP. Ali, com as duas pernas amputadas e cega, vive com o marido.

"A Câmara de Vila do Conde e a empresa empurram um para o outro e andamos nisto", desabafa o marido, António Azevedo, "há dez anos à espera" de uma habitação social e, "farto de correr para a Câmara". Glória vai contando: a diabetes levou-lhe as pernas e a visão. Agora, uma insuficiência renal obriga-a à hemodiálise. Durante 26 anos, trabalhou como tecedeira na Narfil. O marido como fogueiro. A renda da casa era paga em horas extras de trabalho. Não havia papéis. A Narfil faliu.

Em 2005, a Coeprimob comprou os terrenos para ali edificar uma urbanização e Glória e António têm até ao próximo mês de Maio para sair dali. Em toda a casa, as paredes estão pretas da humidade. Ao lado, uma casa em ruína "puxa ratos e baratas". A cadeira de rodas de Glória não passa. Já está "habituada" a andar "a rastos". Na cozinha, aponta o tecto que caiu.

Têm 56 anos: ela, recebe 290 euros de reforma, ele tem que olhar pela mulher. Não sabem o que fazer. Ao JN, fonte da Coeprimob explica não cabe à empresa dar casas, além de que, "dada a dramática situação da casa, social e de saúde", o casal Azevedo, "já devia ter sido realojado pela Câmara". O presidente da Câmara, que diz ter sido alertado pelo JN para o agravamento da situação, promete, agora, realojar a família "dentro de dias". Quanto às restantes oito, Mário Almeida está em conversações com a imobiliária, mas, caso a Coeprimob não assuma a Câmara avançará com o realojamento.