28.6.10

“Somos a minoria menos amada em Portugal”

in Público On-line

No Dia Internacional do Cigano, presidente da Federação Calhim Portuguesa reconhece que principal problema ainda é o relacionamento

Comunidade existe no país "há mais de 500 anos" (Miguel Madeira)


Os ciganos constituem “a minoria menos amada em Portugal”, apesar de estarem no país “há mais de 500 anos”, afirma António Pinto Nunes, presidente da Federação Calhim Portuguesa e da Associação Cristã de Apoio à Juventude Cigana.

A propósito do Dia Internacional do Cigano, que hoje se assinala, o responsável considerou em declarações à agência Lusa que “os maiores problemas da comunidade continuam a ser os de relacionamento”.

“Muitas vezes o cigano não é bem aceite. Por culpa da pessoa ou da comunidade, ele continua a ser excluído”, declarou António Pinto Nunes, adiantando que “a comunidade cigana é fechada também como meio de autodefesa”.

“Nós sabemos que somos a minoria menos amada em Portugal. Temos amigos que são de cor, conversamos com pessoas dos PALOP [Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa], e apercebemo-nos de que, para o povo português, somos os últimos na escala. Estamos aqui há mais de 500 anos mas 90 por cento das pessoas não nos considera portugueses”, lamentou.

Segundo o presidente da Federação Calhim Portuguesa [‘calhim’ significa ‘cigana’ em romani, língua falada pela etnia], “qualquer estrangeiro que venha para Portugal conta com uma receptividade totalmente diferente, mesmo que não seja melhor do que os ciganos, pois entre eles também existirão boas e más pessoas, como entre nós”.

“Logo ao início, os pais ensinam os filhos a temer e a desprezar os ciganos. Somos uns intrujos, na sua concepção, o que é lamentável”, afirmou António Pinto Nunes, exemplificando que “basta ver num dicionário os significados de ‘cigano’, que ainda não foram apagados: ‘vagabundo’, ‘ladrão’, ‘ladino’”.

Para comprovar a discriminação, o responsável apontou o caso “do Rendimento Social de Inserção e de outros proventos que vêm do Governo”.

“O povo diz que só os ciganos é que os auferem, mas a percentagem de ciganos a receber esses subsídios é mínima. Todavia, quando se fala em restringir ou acabar com esses apoios, os holofotes viram-se logo para os ciganos”, assegurou, citando o provérbio “todo o pássaro come trigo e só quem paga é o pardal”.

De acordo com António Pinto Nunes, a ideia de que os ciganos são geralmente vendedores ambulantes dedicados à contrafacção também tem cada vez menos fundamento.

“Um cigano, se há-de estar na rua a vender uma porcaria falsificada, agora recorre a um mercado. E há pessoas a trabalhar noutros serviços. Só que muitas vezes não nos apercebemos porque eles não podem denunciar a sua pertença à etnia cigana. Se um patrão ou os colegas souberem, vão excluí-los desse tipo de trabalho”, afirmou.

Também a presidir à Associação Cristã de Apoio à Juventude Cigana, Pinto Nunes considera que “o Evangelho tem redimido, transformado a maneira de ser e de viver, de auferir proventos, de muitos elementos da comunidade”.

“Muitas vezes os ciganos andavam armados, mas 50 por cento deles deixaram de usar uma arma para usar uma Bíblia”, garantiu à Lusa, adiantando que -- mesmo com essas mudanças -- “na hora H”, um cigano é sempre visto como tal, com a carga “pejorativa” subjacente à frase “é cigano mas é bom rapaz”.

“Mas a tendência do cigano é para melhorar. Eu tenho fé nisso. Sobretudo com o Evangelho a apoiá-lo e desde que as pessoas também encarem cada cigano por aquilo que ele é e não pela sua etnia”, reiterou.