Por Isabel Tavares, in iOnline
O não cumprimento das regras dá multas até seis mil euros. As transportadoras apontam o dedo ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras
No dia 1 de Novembro entra em vigor uma norma que obriga todas as companhias aéreas que voam de fora do espaço Schengen com destino a Portugal a entregar ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, antes da aterragem, uma lista com a identificação dos passageiros a bordo. O problema é que o SEF só fala português, os sistemas informáticos não estão preparados e a protecção de dados impõe restrições. De repente, aquilo que podia parecer fácil transformou-se numa dor de cabeça para as transportadoras nacionais e estrangeiras e as multas são pesadas.
O controlo agora imposto - APIS - Advanced Passenger Information System (sistema de informação antecipada de passageiros) -, já existe noutros países do mundo e, no caso, resulta da transposição de uma directiva comunitária para o direito nacional. O SEF quis aplicar a lei a partir de 25 de Junho, mas as reclamações foram tantas que acabou por concordar com um período de teste, a decorrer até final de Outubro, mas apenas depois de a IATA - Associação Internacional de Transporte Aéreo, ter entrado em campo.
Uma portaria publicada em Diário da República no dia 27 Maio dá conta dos objectivos legais - essencialmente, "combater a imigração ilegal e melhorar o controlo de fronteiras e dos fluxos migratórios". Para isso, define os parâmetros a que o SEF deve obedecer na fixação dos procedimentos e soluções tecnológicas a adoptar pelas transportadoras aéreas para transmissão da informação dos passageiros alvo de comunicação antecipada obrigatória.
Logo aqui, começaram os problemas. Várias companhias queixaram-se de receber informação apenas em português, um língua que poucos falam. Por exemplo, só no caso da operação da TAP, isto representa 17 países envolvidos, 34 escalas onde é necessário garantir a recolha de dados e a operacionalidade dos sistemas de DCS (Departure Control System) utilizados para processar e enviar os dados.
O SEF disse ao i que "o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras comunica em português com as companhias aéreas sedeadas em Portugal". Acontece que, a cada dúvida, e como não existe documentação traduzida para inglês, uma língua universal, são as companhias nacionais, TAP e Sata, Ground Force e Portway, quem tem de explicar, traduzir e assumir a responsabilidade por uma lei que não criou e à qual também têm de obedecer. E o pior, queixam-se as transportadoras, o SEF demora muito tempo a responder a dúvidas (e, uma vez mais, tudo em português, mesmo que estas sejam colocadas por uma companhia russa, como a Transaero Airlines, ou inglesa, como a Thomson Airways).
Outro embaraço é o facto de a lei portuguesa não permitir a menção do género do passageiro, quando todos os programas informáticos estão, a nível mundial, preparados para receber informação básica, como o tipo de documento, a data de emissão, a data em que expira, a data de nascimento, o nome e, também, o género. A partir daqui, há países que pedem ainda dados adicionais. Acontece que o campo "género" não pode ser simplesmente apagado ou não preenchido, uma vez que o programa obriga a preencher com F (female) ou M (male). Uma alternativa exige um novo programa que, por seu lado, vai ser incompatível com outros países.
O SEF admite que "a questão relativa à ausência da menção do género do passageiro não é exclusiva de Portugal, tendo-se colocado também nos Países Baixos", mas acrescenta que na directiva comunitária de 2004 não é referido o género, "tendo a república portuguesa procedido à sua transposição ipsis verbis".
O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras adiantou ao i, contudo, que "há soluções técnicas que o SEF está a desenvolver com as companhias aéreas que permitem resolver esta questão".
Por fim, coloca-se ainda outra questão, que se prende com a protecção de dados: as informações sobre os passageiros devem ser destruídas 24 horas depois da aterragem do voo em causa. O cumprimento desta norma é quase impossível, dada a quantidade de servidores por onde passa a informação e a localização dos data centers, muitos deles fora da Europa, controlados por terceiros.
Apesar de todas as queixas recebidas, o SEF garantiu ao i que "o processo está a ser assegurado em diálogo com as companhias aéreas" e "não há registo de qualquer queixa formal", além de que, com o alargamento do prazo "o projecto piloto que tinha decorrido ficou sem efeito" e só depois disso voltarão a ser aplicadas multas.