16.5.14

'Lobbying' português tem pouco peso na União Europeia

Raquel Albuquerque (texto) e Sofia Miguel Rosa (infografia), in Expresso

São poucos os lobistas portugueses a atuar na União Europeia e o que acontece decorre a nível interno, ainda em Portugal, e não diretamente na UE


A frágil sociedade civil e a ausência de tradição de 'lobbying' acentuam a fraca representatividade portuguesa de uma prática legal, aponta um estudo europeu.


São cerca de seis mil as organizações internacionais registadas e acreditadas como lobistas na União Europeia (UE). Entre elas, 62 têm sede em Portugal, correspondendo a 2% do total de entradas no Registo de Transparência, uma base de dados online onde as organizações que tentam ter impacto nas instituições da UE se encontram registadas.

O número de organizações portuguesas fica abaixo da média de 98 registos de países com dimensão semelhante, como se conclui no estudo europeu "Participação na tomada de decisões da UE: Portugal numa perspetiva comparativa", de Richard Rose e Alexander Trechsel, apoiado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS). Portugal aproxima-se de países como a Grécia, Bulgária ou República Checa (com uma média de 48 associações), ficando distante da Áustria, Holanda ou Suécia, com uma média de 165 organizações registadas.

Para além do Registo de Transparência, há outros canais de representação dos grupos de interesse, mas em geral o lobbying português é fraco. A ausência de tradição de lobbying em Portugal, acompanhada por uma sociedade civil frágil e com dificuldades em fazer-se representar a nível europeu, é a principal razão apontada.

Apesar de não se fazer lobbying em Portugal como nos Estados Unidos, ele existe. "Temos alguma tradição, mas está pouco estudada e acontece de forma informal", explica Luís de Sousa, presidente da TIAC (Transparência e Integridade, Associação Cívica) e coordenador de um projeto de investigação sobre a prática de lobbying na Europa.

O investigador aponta serem poucos os lobistas portugueses a actuar na União Europeia e o que acontece decorre a nível interno, ainda em Portugal, e não diretamente na UE. "O que há é escritórios de advogados com muita informação dos processos de decisão, quer através de pareceres que são solicitados, quer através dos elementos que têm nas listas para o Parlamento", diz.

Quem são?

A maior parte das 62 organizações portuguesas são associações sindicais e profissionais ou organizações não-governamentais (ONG). As principais áreas a que se dedicam são a energia, ambiente, concorrência e direitos dos consumidores, transportes e emprego. Pelo contrário, desporto, cultura, agricultura e pescas são as áreas menos mencionadas. REN, EDP, Sonae, UGT, Quercus, Ordem dos Enfermeiros ou CIMPOR são algumas das organizações registadas.




Há duas outras formas representação dos grupos de interesse: o Comité Económico e Social Europeu (CESE) e o Comité das Regiões (CoR). Neles podem estar sindicatos, organizações empresariais, regionais ou sectoriais. No caso português, aponta o estudo, os mais empenhados no CESE são os sindicatos e as associações patronais.

Quando se fala dos sindicatos, há um obstáculo: a baixa densidade sindical (ou seja, a percentagem de trabalhadores portugueses sindicalizados no total da população ativa). Em Portugal, menos de um quinto dos trabalhadores estão sindicalizados e a proporção desceu 2,3% desde 1990.

"É evidente que a precariedade e o desemprego têm contribuído em larga medida para uma baixa densidade sindical", aponta ao Expresso Catarina Tavares, secretária internacional da UGT, lembrando também que a tradição sindical portuguesa não é, à partida, como noutros países europeus.

Apesar disso, a dirigente não considera que a baixa densidade seja necessariamente um obstáculo. A UGT marca presença no Diálogo Social Europeu, faz parte do CESE e da Confederação Europeia de Sindicatos, onde considera ter "um papel ativo na tomada de decisões". Quanto à presença no Registo de Transparência, Catarina Tavares considera "importante" que as associações sindicais se assumam como "defensoras de determinados interesses". "Ao fazê-lo, a UGT está a alavancar a sua presença."

Mas são os empregadores, aponta o estudo, que conseguem ter uma estratégia mais forte a nível europeu, em parte pela aposta em terem uma representação permanente em Bruxelas.

A CCP já teve, mas deixou de ter, devido a uma "alteração de estratégia", explica ao Expresso a secretária-geral Ana Vieira. Houve três razões: "Evolução das tecnologias de informação e comunicação", a filiação na Eurocommerce - cuja atividade é de "grande proximidade junto da Comissão Europeia, do Parlamento e do próprio Conselho" - e o facto de terem um representante permanente em Bruxelas, membro do CESE.

Impacto negativo

O estudo conclui que não é só sobre os comités consultivos que as associações portuguesas não exercem pressão suficiente, mas também sobre o Parlamento Europeu, a Comissão e o Conselho. "Isso deve-se, principalmente, ao facto de o lobbying continuar a ter, em Portugal, uma conotação negativa".

"Os representantes da sociedade civil portuguesa não têm uma estratégia institucionalizada articulada com outros canais institucionais", defendem os autores, referindo que o fraco lobbying português, coordenado informalmente, "tem um impacto significativamente negativo na estratégia portuguesa em Bruxelas".

Para a CCP, a falta de eficácia do lobbying "pode conduzir a soluções, nomeadamente legislativas, menos adequadas aos interesses que representamos". "Em última instância, traz, em determinadas situações, custos acrescidos, quer em termos económicos, quer sociais."


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