30.8.22

Há mais portugueses a prever cortar em compras importantes e empresas estão menos confiantes

Vitor Ferreira, in Público online

Inquéritos de conjuntura do INE mostram que as famílias estão cautelosas e que só o sector dos serviços viu o indicador de confiança aumentar em Agosto.
Victor Ferreira30 de Agosto de 2022, 10:58

As expectativas económicas das famílias e das empresas portuguesas continuam longe do que eram antes do início da guerra na Ucrânia. Ao fim de seis meses de conflito, o indicador de confiança dos consumidores estabilizou, segundo os dados de Agosto, mas num patamar muito abaixo daquele em que se situava em Fevereiro, antes da invasão da Ucrânia pela Rússia. Já do lado dos empresários, há menos confiança nos sectores da indústria, do comércio e da construção, devido às perspectivas mais negativas em relação a diversos indicadores de negócio.

Começando pelas famílias, o indicador de confiança manteve em Agosto o mesmo valor de Julho. Quando olham para a frente, e perspectivam a evolução nos próximos 12 meses, os consumidores parecem agora acreditar mais numa melhoria do clima económico do país e numa evolução mais favorável da situação financeira dos seus agregados. Porém, enchem-se de cautelas quando estimam os níveis de consumo, havendo mais famílias a avaliar a necessidade de cortarem em compras importantes nos próximos 12 meses.

Quando se olha para os dados de Agosto corrigidos de sazonalidade, torna-se ainda mais evidente que a degradação da confiança registada em Março, logo depois de a Rússia ter invadido a Ucrânia está longe de uma inversão de tendência. Pelo contrário, as respostas sobre a situação económica do país nos próximos 12 meses apontam para uma curva cada vez mais negativa, com os valores a manterem uma trajectória de aproximação aos valores mínimos de confiança registados em Outubro de 2012, mas menos negativos do que os registados durante as fases mais críticas da pandemia em 2020 e 2021.

Com base nos valores corrigidos de sazonalidade, o mês de Agosto revelou que as famílias acreditam menos na sua capacidade de pouparem no momento actual, perspectivam um mercado laboral ligeiramente melhor, mas mostram-se menos confiantes numa evolução favorável dos preços ao longo do próximo ano. Tudo isto talvez ajude a explicar por que razão há mais consumidores a referir a necessidade de conter despesas, cortando em compras importantes no futuro próximo.

O mesmo pode ser dito quando se analisa as respostas dos empresários. Face às cautelas dos consumidores e às condicionantes de produção, há um maior número de sectores económicos com uma evolução desfavorável no indicador de confiança do que o contrário. Como já se referiu, só mesmo o sector dos serviços apresenta uma evolução positiva face a Julho.

O indicador de confiança da Indústria Transformadora tinha caído em Julho e, de forma mais intensa, desceu também em Agosto, recuando para um nível próximo do observado em Abril de 2021 – quando o país saía do seu segundo confinamento geral por causa da covid-19.

Todas as componentes contribuíram negativamente para este indicador, salienta o INE. As perspectivas sobre a produção de bens de consumo e bens intermédios baixaram de forma significativa na indústria transformadora, reflectindo os receios de uma recessão que diminua a procura mas também os problemas de fornecimento de matérias-primas, seja pela escassez ou pela alta de preços. Somente os bens de investimento contrariaram esta tendência.

As perspectivas de emprego para os próximos três meses melhoraram, mas continuam abaixo do nível em que se situavam antes do início da guerra na Ucrânia.

Quanto aos preços de venda no próximo trimestre, o indicador de confiança continuou a recuar, tal como tem vindo a acontecer desde Abril.

No sector da Construção e Obras Públicas, a confiança também diminuiu em Agosto, retomando o movimento descendente iniciado em Fevereiro. Neste caso, regista-se um sentimento menos favorável em relação à carteira de encomendas e, sobretudo, uma deterioração do indicador de confiança no nível de emprego para os próximos três meses, que cai nas três componentes deste sector (promoção imobiliária e construção de edifícios; engenharia civil; e actividades especializadas de construção). Isto apesar de se ter mantido estável a confiança sobre os preços de venda nos próximos três meses.

Quanto ao comércio, o indicador de confiança do comércio desceu em Julho e em Agosto. Porém, a evolução não foi uniforme. No comércio por grosso, houve uma descida, mas no comércio a retalho, as perspectivas até melhoraram em Agosto face ao mês anterior.

Há, no entanto, um sentimento ligeiramente mais negativo face à perspectiva de vendas nos próximos três meses, com o volume de stocks a piorar de forma mais significativa no comércio por grosso. As perspectivas de emprego caem para o valor mínimo deste ano, tal como sucede em relação à confiança sobre encomendas a fornecedores e preços de venda.

Pelo contrário, nos serviços, o indicador de confiança aumentou em Agosto, após ter diminuído em Julho. A perspectiva sobre a procura no próximo trimestre melhorou, mas está muito longe aos valores pré-guerra, a confiança no emprego teve uma evolução semelhante, e a única descida no indicador de confiança é quanto aos preços de venda para os próximos três meses.

O sector dos serviços é o que mais pesa na economia portuguesa em termos de valor acrescentado bruto (VAB) – isto é, o valor gerado pelas empresas depois de pagas as matérias-primas e outros consumos na produção, representando 38,1% do VAB da economia.

Para a obtenção destes dados, o INE recolheu respostas de cerca de 1200 a 1400 empresas da indústria, do comércio e dos serviços e cerca de 600 empresas da construção.