4.8.20

Só 766 pediram estatuto de cuidador informal

Ana Cristina Pereira, in Público on-line

“Mesmo considerando os 30 concelhos dos projectos-piloto, há muito mais pessoas a cuidar”, suspira a vice-presidente da Associação Nacional de Cuidadores Informais, Maria dos Anjos Catapirra.

Até ao final de Julho, só 766 pessoas solicitaram ao Instituto de Segurança Social (ISS) o reconhecimento do Estatuto de Cuidador. Uma pequeníssima parte de um universo estimado em 800 mil cuidadores, 240 mil dos quais a tempo inteiro.

O número foi avançado pelo gabinete da ministra do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, Ana Mendes Godinho, a pedido do PÚBLICO. Nos 30 concelhos escolhidos para os projectos-piloto, o estatuto pode ser requerido desde o dia 1 de Junho. No resto do país, começou no dia 1 de Julho.

Os últimos dados revelados pelo PÚBLICO diziam respeito a 27 de Julho, altura em que o ISS contava 637 requerimentos. Presumia-se que houvesse uma corrida na última semana, já que no dia 31 de Julho terminava o prazo para quem mora nos 30 municípios-chave requerer o estatuto com direito a retroactivos desde 1 de Abril, isto, claro, nos casos em que há direito a subsídio (os rendimentos de referência do seu agregado familiar têm de ser inferiores a 1,2 Indexante dos Apoios Sociais, o que no ano em curso corresponde a 526,57 euros).

Recorrer a autarquias e a polícias

"Por amor de Deus”, suspira a vice-presidente da Associação Nacional de Cuidadores Informais, Maria dos Anjos Catapirra. “Mesmo considerando os 30 concelhos, há muito mais pessoas a cuidar. E aqui já estão pessoas que não pertencem aos projectos-piloto.”

Todos os dias, Maria dos Anjos Catapirra recebe telefonemas de cuidadores. “Passo o dia ao telefone”. Esclarece dúvidas, ouve desabafos, conforta. E, quando lhe liga um jornalista, não se cansa de denunciar a carga burocrática, a falta de informação e a impreparação dos funcionários. Recomenda à ISS que recorra às juntas de freguesias e às câmaras municipais, à GNR e à PSP para chegar a mais idosos e a quem deles cuida.

No portal da Segurança Social, há uma área dedicada que inclui um Guia Prático, um folheto e os formulários. Nos 18 centros distritais formou-se um Gabinete de Acolhimento ao Cuidador Informal. Abriu-se uma linha telefónica exclusiva para dúvidas e apoio ao cuidador (300 502 502).

Ao que afirma o gabinete da ministra, o ISS está a fazer um esforço para chegar aos cuidadores residentes nos 30 concelhos do projecto-piloto. Está a notificar os beneficiários titulares de complemento por dependência de 2.º grau e do subsídio por assistência de terceira pessoa residentes nos concelhos dos projectos-piloto”. E prevê “o envio de um mailshot destinado a informar e sensibilizar as associações representativas deste público-alvo”.

Nas muitas conversas que vai tendo, Maria dos Anjos Catapirra encontra outras justificações para a míngua de requerimentos entrados até agora. Percebe que muitos cuidadores desistem ao compreender que não terão direito a qualquer subsídio, desvalorizando um conjunto de medidas a desenvolver pela Saúde, pela Segurança Social e pelas autarquias, como a formação e a capacitação dos cuidadores, o apoio psicossocial, as oportunidades de descanso. “O descanso do cuidador é das coisas mais importante que as pessoas vão ter”, salienta.
Associação a estatuto de maior acompanhado

Aquela dirigente associativa também conhece cuidadores que desejam avançar e se deparam com barreiras inesperadas. É preciso que a pessoa cuidada dê o seu consentimento. No caso de ter uma demência ou outra forma de incapacidade psíquica, há que obter o estatuto de maior acompanhado, o que, por si só, é um processo longo e complexo. Já as pessoas que são titulares de Complemento por Dependência de 1º grau têm de sujeitar-se a uma avaliação do Serviço de Verificação de Incapacidade. A pandemia de covid-19 criou atrasos que não se ultrapassaram (embora até ao final do ano, baste a palavra de um médico, não seja necessário uma junta médica).

Recomenda aos cuidadores residentes fora dos concelhos dos projectos-piloto que não deixem de pedir o estatuto, embora lhe cheguem histórias de desencorajados por funcionários da Segurança Social. Servirá para orçamentar a medida no próximo ano. E sempre lhes dará um cartão de identificação com o qual os que estiverem a estudar poderão requerer o estatuto de trabalhador-estudante e os que tiverem filhos a cargo poderão beneficiar do regime de parentalidade previsto no Código de Trabalho. Prevê-se que algumas leis do trabalho venham a ser alteradas para melhor permitir a conciliação