Marta F. Reis, in Sol
Há 11 dias que morrem diariamente no país mais de 500 pessoas. Mortes por todas as causas, que incluem a covid-19, outras doenças, descompensadas ou não pelo frio intenso que vive no país, cancros, ataques de coração, AVC, acidentes. As causas não estão ainda codificadas, o que só acontece mais tarde, mas não há registos de um período com uma mortalidade diária desta magnitude. Dados dos últimos 40 anos, fornecidos ao Nascer do SOL pelo Instituto Nacional de Estatística, mostram que desde 1980 tinha havido apenas 12 dias com mais de 500 óbitos no país. Registos de quatro décadas que, a manter-se a tendência da última semana e meia, serão hoje ultrapassados, em apenas 16 dias de um mês de janeiro mais frio do que o habitual e com a epidemia de covid-19 em níveis extremamente elevados de disseminação.
Mais mortes por covid-19 do que as que constam nos boletins?
O número de óbitos tem estado em patamares tão elevados que o sistema nacional de vigilância de mortalidade sofre diariamente, quase hora a hora, atualizações maiores do que é habitual. A plataforma do Ministério da Saúde regista em tempo real certificados de óbitos, que geralmente só são consolidados ao fim de alguns dias. Durante esta semana houve acertos de dezenas de óbitos de uns dias para os outros. A última segunda-feira registava já na terça-feira ao final do dia 630 óbitos, mais do que os reportados no próprio dia. Entretanto os registos foram atualizados e ontem os registos já apontavam 659 mortes nesse dia. Há agora cinco dias com mais de 600 mortes desde o passado domingo, quando, em 40 anos, apenas em junho de 1981, numa vaga de calor, houve dois dias em que esse patamar foi ultrapassado. Comparando com há um ano, com uma época de gripe de intensidade baixa – este ano a gripe continua ainda mais residual – morreram diariamente nos últimos sete dias mais 221 pessoas do que na mesma semana de 2020.
O Nascer do SOL tentou esclarecer junto da Direção Geral da Saúde se, perante os acertos diários que têm estado a ser registados no SICO, o sistema de registo de óbitos na base da plataforma de vigilância de mortalidade, estão também a ser reportadas mortes adicionais de covid-19 em relação às que são reportadas diariamente nos boletins que ‘fecham’ à meia-noite do dia em causa, questão que não foi respondida até ao final da semana. Ao longo dos últimos dias, as mortes associadas à epidemia passaram os máximos dos últimos 10 meses mas, havendo atrasos no reporte, poderão ser superiores. Este quinta-feira registou um recorde de 159 mortes associadas à epidemia. Só desde o início de janeiro contabilizam-se 1571 mortes de pessoas infetadas com covid-19, quando o recorde tinha sido em dezembro, quando se registaram 2395 óbitos relacionados com o SARS-CoV-2. Manuel Carmo Gomes adiantou ao Nascer do SOL que as projeções apresentadas na reunião do Infarmed estão já ultrapassadas e que neste momento não conseguem projetar quando poderá verificar-se o pico de óbitos e qual a magnitude. Na altura, previram que até 9 de fevereiro o país poderia chegar às 12 mil mortes associadas à epidemia, o que implicaria mais 4 mil mortes até lá. Receia-se que sejam mais.
O número de idosos infetados é um dos preditores e este mês os diagnósticos neste grupo etário estão também a aumentar. Desde o início do ano contabilizavam-se ontem nos dados facultados pela DGS já mais de 16 mil idosos com 70 ou mais anos infetados, quando em novembro e dezembro o recorde neste grupo etário aproximou-se de 20 mil infeções diagnosticadas. Só nos primeiros 14 dias do ano foram diagnosticados com covid-19 mais de 9 mil idosos com mais de 80 anos quando em todo o mês passado foram 11 mil. Na reunião no Infarmed, o epidemiologista Henrique Barros referiu os primeiros 3 mil casos, estimando que poderiam morrer 600. Agora são mais do triplo, o que significa que são expectáveis 1800 mortes só entre os idosos acima dos 80 diagnosticados nas últimas duas semanas. Os médicos já alertaram para um aumento da letalidade quando existe maior pressão sobre os serviços, como a que se vive.