JOAQUIM FORTE, in Jornal de Notícias
Estudo da UM diz que, apesar da antiguidade do bairro, não existe integração
Vivem no Bairro da Atouguia, em Guimarães, há cerca de 23 anos - tantos quantos os blocos habitacionais - mas nem por isso os ciganos são bem aceites pelos "não ciganos". A conclusão é de um estudo da UM.
"Racismo? Aqui no bairro? Não conheço. Eu não sou racista, nunca fui! Entendo que todo o ser humano deve ser respeitado. Às vezes há uns desacatos, entre ciganos mas também entre nós, os da maioria". Cigarro na boca, saco de supermercado na mão, Adriano Costa, 50 anos, de estatura meã, segue a caminho de casa por uma das ruas que atravessam o Bairro da Atouguia - 2000 pessoas distribuídas por centenas de habitações, num ponto elevado com vista sobre a cidade. Ali está o Estádio. Mais ao fundo o Castelo. "Temos boas vistas, não há dúvidas", diz o ex-padeiro, inquilino do bairro "vai para 23 anos".
O racismo de que se fala tem a ver com um estudo de investigadores da Universidade do Minho (UM) com base num trabalho de campo no bairro (ver caixa). "Tenta compreender as lógicas de exclusão social do Bairro da Atouguia, bem como a existência de racismo para com o grupo étnico cigano", refere Sónica Gomes, autora do trabalho. Uma das conclusões refere que a incidência da criminalidade é semelhante nas populações cigana e não cigana do bairro, e que a etnia não é um factor influente nas práticas criminosas. "As condições sócio-económicas e a exclusão social - comuns a quase toda a população do bairro - ajudam a perceber que a incidência de práticas ilegais seja semelhante nos dois grupos estudados. Existem ciganos delinquentes, mas o racismo latente pode fazer recair sobre eles algumas culpas alheias decorrentes de imagens distorcidas da realidade", conclui Sílvia Gomes.
As centenas de entrevistas feitas a moradores, no local, permitiram concluir que "os ciganos são rejeitados, excluídos, vistos com desconfiança e despertam uma sensação de insegurança e de receio na população em geral".
Não é o que pensa Maria Ferreira. "Moro aqui há 20 anos e nunca tive qualquer problema com ninguém, incluindo os ciganos. Os únicos problemas que conheço prendem-se com as casas, com a falta de água e de condições em muitas delas. Quanto a racismo, não conheço", diz. Cristina Dias, cigana, diz que nunca sentiu qualquer entrave "e essas coisas" do racismo. "E mais estou cá no bairro há alguns anos. O problema maior é que a casa onde vivo não tem portas", acrecenta.
O Bairro da Atouguia - tal como o da Nossa Senhora da Conceição, a poucos metros, e o da Emboladioura, em Gondar - pertence ao Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado, que já desafiou a Câmara a assumir a sua gestão. "A Câmara faz bem em aceitar a gestão dos bairros só se o instituto fizer obras. Estamos a falar de uma batelada de massa para deixar isto em condições", defende Adriano, que parece saber do que fala.
Mas não se pense que o bairro é uma harmonia. "Pudera, vive cá gente pobre", justifica Adriano. "Isto é caótico. Há problemas de manutenção das casas, há prostituição e droga mas não há policiamento, e olhe que a esquadra fica a 100 metros", sublinha. No bairro, desemprego e pobreza não são palavras ocas. "Há muitas famílias que só se aguentam com o Rendimento Mínimo Garantido, umas precisam, outras habituaram-se", remata o antigo padeiro.


