8.3.09

Mais metódicas, implacáveis, rigorosas, ambiciosas e ágeis do que os homens?

Sofia Branco, in Jornal Público

Portuguesas continuam a ganhar menos e a trabalhar mais em casa. Mas há coisas a mudar e as próximas eleições já serão paritárias. E os homens, o que pensam das mulheres?


Elas continuam a ganhar menos do que eles e a serem agredidas dentro da própria casa, mas hoje estão mais protegidas e têm mais consciência dos seus direitos. O Estado tem integrado a igualdade de género em todas as políticas públicas e a legislação portuguesa é das mais avançadas do mundo. E vêm aí as primeiras eleições paritárias de sempre.

Os sucessos dependem sempre da comparação e, aqui, nenhum Estado é perfeito. Há sempre um calcanhar de Aquiles - do apedrejamento ao afastamento dos cargos de chefia. E a realidade pode ser apresentada em invólucro optimista ou pessimista.
Recentemente, noticiámos que Portugal é o quarto país da União Europeia com menor disparidade de salário entre mulheres e homens. Segundo os dados da Comissão Europeia, o fosso salarial é de 8,3 por cento, enquanto os dados nacionais o elevam para 20 por cento (tem diminuído, mas a conta-gotas).

A que se deve a disparidade? Ao indicador usado: o Eurostat compara o preço por hora de trabalho, mas as estatísticas nacionais confrontam salários mensais. "Como as mulheres portuguesas trabalham menos horas do que os homens, porque trabalham mais em casa, a diferença é menor quando contabilizada à hora", explica Elza Pais, presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género.

Amanhã, quando o embaixador de Portugal na ONU usar da palavra na reunião anual da Comissão sobre o Estatuto das Mulheres para descrever a evolução da situação das portuguesas vai falar da Lei da Paridade (que será testada pela primeira vez nos três actos eleitorais deste ano - europeias, legislativas e autárquicas) e do Código do Trabalho (ainda em processo de aprovação, mas que aumenta as licenças de parentalidade de mães e pais). E dirá também que os 83 milhões de euros disponíveis para promover a igualdade entre 2007 e 2013 são "cinco vezes" superiores aos fundos do anterior quadro.

Hoje, as mulheres "têm consciência dos seus direitos", "já não aguentam como aguentavam", avalia Manuela Tavares, autora de uma tese sobre os feminismos em Portugal e membro da União de Mulheres Alternativa e Resposta. Mas, destaca, essa consciência não afasta a passividade e elas "ainda não estão à esquina, prontas para lutar".

Chefes tardias

Subsiste uma "discriminação invisível", que não deixa que as "grandes conquistas formais" se reflictam automaticamente na realidade, sublinha Elza Pais, vincando: "Perguntam-me sempre se me sinto discriminada hoje. Se calhar, se não fosse mulher, teria sido directora-geral mais cedo."

O acesso a cargos de chefia continua a ser-lhes mais dificultado do que aos homens, embora quase todas as profissões estejam a feminizar-se. Aliás, a presença das mulheres no mercado de trabalho está a aumentar e a dos homens a diminuir, embora continue a ser superior. Elas são mais afectadas pela crise, desemprego, pobreza e exclusão social. E continuam a ter de ser supermulheres com "duplas e triplas tarefas" e "muito pouco tempo livre só para elas", diz Manuela Tavares.

Elza Pais prefere não falar em sucesso no combate à violência doméstica - "ainda há muito a fazer" -, mas destaca que, segundo um estudo recente conduzido pelo professor universitário Manuel Lisboa, diminuiu dez por cento entre 1997 e 2007. Já a participação da violência tem aumentado, "em média, 11,2 por cento ao ano", mas em 2008 o salto foi de 30 por cento. "As vítimas têm mais confiança no sistema", interpreta Elza Pais, recordando que o conceito de violência alargou - hoje integra o namoro, os ex-companheiros, as relações homossexuais. Para Tavares, a "mentalidade sexista" condiciona o "comportamento dos agentes sociais", no público como no privado. E a "masculinidade hegemónica" impede os homens de partilharem as responsabilidades familiares. "Falta maior equilíbrio entre mulheres e homens na vida privada. A paridade não acontece só no espaço público."

Depoimentos recolhidos por Andrea Cunha Freitas, Andreia Sanches, Graça Barbosa Ribeiro, Hugo Daniel Sousa, Isabel Coutinho, Luís Miguel Queirós, Natália Faria, Paula Torres de Carvalho e Raquel Almeida Correia