Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico diz que algumas medidas tomadas para apoiar o rendimento dos trabalhadores e o emprego durante o confinamento poderão ter impacto negativo no valor das pensões futuras
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) alerta que medidas como o adiamento ou redução das contribuições para a Segurança Social e a possibilidade de resgatar antecipadamente os Planos de Poupança Reforma (PPR) como resposta à crise provocada pela pandemia poderão ter impactos negativos nos rendimentos dos futuros pensionistas, pondo em causa a sua adequação.
“Algumas das medidas implementadas, embora proporcionem um alívio no curto prazo, podem ter um impacto duradouro no bem-estar dos futuros reformados, em particular na adequação dos seus rendimentos. Essas medidas incluem aquelas que permitem que empregadores e trabalhadores adiem, reduzam ou interrompam as contribuições para os sistemas de pensões, assim como as que permitem que os indivíduos resgatem antecipadamente as suas poupanças para a reforma”, lê-se no Pensions Outlook 2020 divulgado nesta segunda-feira.
Se olharmos para os sistemas públicos de pensões, nota a OCDE, os apoios à retenção de emprego (que em Portugal se traduziram em apoios extraordinários à manutenção dos contratos de trabalho) e o alargamento da protecção no desemprego amorteceram, de um modo geral, a transmissão da queda do mercado de trabalho aos sistemas de protecção social em comparação com recessões anteriores. Isso, acrescenta a organização, permitirá “suavizar o impacto [da crise] da covid-19 nos sistemas de protecção social” e “amortecerá o impacto deste choque nas pensões futuras”.
O problema, é que “permanece uma grande incerteza quanto à duração desta desaceleração económica cíclica e quanto aos eventuais impactos nas pensões no longo prazo”, alerta a organização.
A OCDE espera que a crise provocada pela pandemia seja relativamente curta do ponto de vista da carreira contributiva de um trabalhador normal, limitando o impacto negativo sobre o valor das pensões. Contudo, é espectável que o desemprego permaneça em níveis elevados “por vários anos”, relançando o espectro do desemprego de longa duração. A OCDE estima que um trabalhador com um salário médio que enfrente cinco anos de desemprego terá uma redução de 6% na sua pensão em comparação com um trabalhador com a carreira contributiva completa, sendo que em alguns países a quebra pode ultrapassar os 10%.
A redução da oferta de emprego também torna difícil a vida dos trabalhadores mais velhos, que terão menos oportunidades para voltarem ao mercado de trabalho. Estas pessoas, frisa o relatório, “podem debater-se com dificuldades em encontrar emprego e podem sentir-se tentados a reformar-se mais cedo, o que levará a uma redução permanente dos benefícios” e um problema que é particularmente relevante nos países que aplicam taxa de redução significativas às pensões antecipadas. Em Portugal, os trabalhadores que se reformem antecipadamente em 2021 terão uma penalização de 15,5% no valor da pensão só por via do factor de sustentabilidade.
Pandemia retira dez anos de vida à almofada das pensões
Do lado da poupança, a pandemia também traz desafios importantes. Desde logo, a probabilidade de as taxas de juro e o crescimento económico permanecerem baixos por um longo período, o que pode levar a uma redução da poupança.
A OCDE sublinha ainda que a crise teve impacto na capacidade de trabalhadores e empregadores contribuírem para fundos de pensões e destaca as disrupções criadas pelo teletrabalho. Finalmente, há ainda o risco de as pessoas darem prioridade às suas necessidades imediatas em detrimento do bem-estar no longo prazo, reduzindo ou adiando as contribuições para fundos de pensões e antecipando o resgate dos PPR.
No relatório, a organização presidida por Angel Gurría alerta também para a situação dos trabalhadores atípicos, atingidos com mais violência pelo confinamento e pelas dificuldades económicas que se lhe seguiram, e que têm menos direitos e pior acesso às pensões.
“A crise provocada pela covid-19 atingiu com mais violência os trabalhadores atípicos, que estão altamente expostos a perdas de emprego e de rendimentos após o confinamento, ao mesmo tempo que são menos propensos a beneficiar de apoios ao rendimento em caso de perda de emprego ou de rendimento, doença ou confinamento obrigatório. Esta circunstância pode afectar a sua capacidade de poupar para a reforma”, referem os autores do relatório.
A OCDE destaca que os sistemas públicos de pensões foram criados para responder ao grupo dominante de trabalhadores que têm contratos permanentes a tempo inteiro. E defende que uma forma de ajudar a resolver as dificuldades dos trabalhadores atípicos, que representam um terço do emprego total da OCDE, é ajustar o desenho dos sistemas de pensões com capitalização complementar, “tendo em consideração as necessidades específicas dos trabalhadores atípicos para os ajudar a poupar para reforma”.