Salomé Leal, in Polígrafo
Em resposta ao que deve ser, no essencial, o papel da Presidência da República, Ana Gomes defendeu que “um Presidente da República, uma Presidente da República, deve ser o garante da estabilidade, mas não da estabilidade do bloco central dos interesses que tem sido tão nefasto para o país há décadas”.
Depois de enumerar alguns setores com défice de recursos, como a Saúde e a Educação, a antiga eurodeputada socialista afirmou o seguinte: "O João Ferreira falou dos trabalhadores desempregados em Matosinhos e eu acompanho. Eu posso também falar nas mulheres que trabalham sobretudo no setor social, de que falava o professor Marcelo Rebelo de Sousa, e a maior parte delas a fazerem milagres com o salário minímo. Muitas pessoas a trabalharem e a viverem na pobreza. Temos 20% de crianças e de famílias em risco de pobreza".
Esta percentagem tem sustentação factual?
Sim, de acordo com dados do Eurostat, o gabinete de estatísticas da União Europeia, referentes ao ano de 2019. Os números indicam que os menores de 18 anos constituíam o grupo etário mais exposto ao risco de pobreza ou de exclusão social em quase metade dos Estados-membros da União Europeia.
Sublinhe-se que se considera que alguém está em "risco de pobreza ou exclusão social" se estiver em risco de pobreza após transferências sociais (pobreza de rendimentos), se viver em situação de privação material severa ou se viver em agregados familiares com intensidade laboral muito reduzida.
De facto, em 2019, mais de um quinto (22,3%) dos menores de 18 anos no país encontrava-se em risco de pobreza ou exclusão social, um número ligeiramente abaixo da média da União Europeia (23,4%). Apesar da queda verificada nos anos anteriores (29,6% em 2015; 27% em 2016; 24,2% em 2017 e 21,9% em 2018), no último ano de que há registo, 2019, verificou-se uma subida ligeira no risco de pobreza infantil (de 21,9% para 22,3%).
Quanto às famílias, um estudo do Institudo Nacional de Estatística (INE) indica que a presença de crianças num agregado familiar continua a estar associada a um risco de pobreza acrescido, sobretudo no caso dos agregados constituídos por um adulto com pelo menos uma criança dependente (33,9%) e naqueles constituídos por dois adultos com três ou mais crianças dependentes (30,2%).
Assim, uma em cada três famílias formadas só por uma mãe ou um pai, com pelo menos uma criança, está em risco de pobreza. Face ao ano anterior, a diferença é de 5,6 pontos percentuais, o que faz das famílias monoparentais o grupo em que a pobreza mais se intensificou em 2018.
Ainda em 2018, o risco de pobreza diminuiu para os agregados sem crianças dependentes (16,2%, menos 0,2 p.p. que em 2017) e aumentou para os agregados com crianças dependentes (18,3%, mais 0,2 p.p. que no ano anterior). O risco de pobreza para os "outros agregados com crianças" aumentou de 22,0% em 2017 para 23,6% em 2018.
Assim sendo, e tendo em conta o valor total com crianças dependentes, a percentagem de risco de pobreza familiar em 2018 cifra-se nos 18,3%. Acima verificada, a percentagem de menores de 18 anos em risco de pobreza é de 22,3%, em 2019. Perante estes números, a declaração de Ana Gomes é classificada como verdadeira.