Hugo Bragança Monteiro, Diretor de Comunicação e Marketing da Whitestar Asset Solutions, in Económico
Falar de dinheiro não tem que ser necessariamente mau ou negativo. O estigma que criámos deve dar lugar a conversas construtivas e explicativas, que consciencializem os mais novos para a necessidade de pouparem.
Há um par de anos, durante um programa de voluntariado em Literacia Financeira com a Junior Achievement Portugal, com quem temos uma parceria, estava a lecionar o programa “Economia para o Sucesso” junto de alunos do 9º ano, onde abordámos temas como a poupança e a gestão do orçamento, mas também a diferença entre o que é essencial e o que é frívolo. Um dos temas que mais impactou os miúdos foi a explicação da diferença entre comprar a pronto e a crédito, assim como os custos finais (que desconheciam) de cada uma destas opções.
Após cinco semanas, um dos alunos veio ter comigo no final da aula e explicou-me que tinha consciencializado os pais para a realidade do “crédito fácil” e da iliteracia existente. Aquele aluno viu a luz ao fundo do túnel e ajudou os pais.
É curioso que um estudo da Universidade do Alabama tenha concluído que uma das razões para os pais evitarem falar sobre dinheiro com os filhos deve-se ao facto de recearem saber, eles próprios, pouco sobre dinheiro. A sugestão é que aprendam também com os filhos e que convertam uma conversa pesada em algo divertido, formativo e entendível.
A Literacia Financeira é muito importante no desenvolvimento dos mais jovens e deve abordar-se o tema do dinheiro, o seu uso e, claro, a sua boa gestão, para que não afete a nossa saúde e o bem-estar.
Infelizmente, o dinheiro e a Saúde dão, frequentemente, as mãos provocando consequências negativas. É conhecido que o endividamento ou o sobre-endividamento levam ao aumento do stresse, da preocupação, do nervosismo, da ansiedade, provocam distúrbios do sono e depressão, entre outros. E nas crianças e jovens estes distúrbios também ocorrem muito por nossa culpa, adultos e pais, que tendemos a não falar de dinheiro com eles por considerarmos que é algo negativo ou porque estigmatizámos o tema.
Felizmente, por estes dias já só olhamos para a frente, para o fundo do túnel porque estamos a ver – queremos muito ver! – a luz. O desbloqueio gradual das nossas vidas e da Economia têm sido muito suportados pela vontade já descontrolada de voltarmos ao que éramos. De comprarmos tudo. E isso vê-se nos centros comerciais, nas esplanadas e em todos os espaços entretanto abertos. Estão a abarrotar.
Pode dizer-se que, no geral, estamos otimistas com a evolução da pandemia. É normal, como é normal que nos esqueçamos que, pelo meio deste otimismo, há – e haverá mais – desemprego; empresas a fecharem portas; dificuldades para uma economia pequena como a nossa; que as famílias terão de fazer ainda mais contas. São as contas da pandemia.
Ainda assim, e mesmo que as contas sejam difíceis, é importante que falemos dos assuntos do dinheiro com transparência, em casa, mas também no local de trabalho. Não é por acaso que surgem cada vez mais programas nas televisões, nas plataformas online e nas próprias empresas, com o objetivo de formar e literar as pessoas.
Falarmos de dinheiro não tem que ser necessariamente mau ou negativo. O estigma que criámos deve dar lugar a conversas construtivas e explicativas, onde se consciencialize os mais novos para a necessidade de, por exemplo, pouparem. A título de curiosidade, os dados da Pordata mostram que a taxa de poupança das famílias em Portugal era de 7,2% em 2019 (último ano disponível), tendo crescido três décimas face a 2018, mas correspondendo a praticamente metade dos valores que se registavam no início dos anos 2000.
Lembremo-nos da história do miúdo que alertou o pai para as reais necessidades de comprarem algo e de o fazerem a pronto ou a crédito. Recordem-se das conclusões a que chegou: sabermos o verdadeiro preço das coisas e o que custa a vida faz toda a diferença.