18.3.09

Câmara do Porto condenada a realojar família despejada

Patrícia Carvalho, in Jornal Público

Autarquia vai recorrer da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, referente a um despejo, em 2004, no Bairro de São João de Deus


O Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAFP) considerou nulo um despejo realizado pela Câmara do Porto e condenou-a a realojar o munícipe e respectivo agregado familiar. Confrontada com a decisão, em plena reunião do executivo, a vereadora da Habitação, Matilde Alves, desvalorizou a sentença, garantindo que a câmara "vai recorrer". O caso envolve um morador do Bairro de S. João de Deus, despejado em 2004 por, alegadamente, não possuir título que legitimasse a ocupação da casa.

À semelhança de muitos outros casos no S. João de Deus, Armando N. possuía, como prova do direito à casa que ocupava, um documento do Centro Claretiano, representante do Projecto de Luta Contra a Pobreza no bairro. A Câmara do Porto não reconheceu este título como legítimo, pelo que procedeu ao despejo. O TAFP teve um entendimento diferente. A sentença, a que o PÚBLICO teve acesso, lembra que "o próprio município aceita que as habitações foram atribuídas pelo Projecto de Luta Contra a Pobreza" e, por isso, "não pode dizer agora que o autor não tem título legítimo de ocupação do fogo". Além disso, continua: "O município era conhecedor de toda a situação relativa ao autor e seu agregado familiar, conforme se pode ver pelo que consta dos processos administrativos". Por tudo isto, o TAFP conclui que o morador possuía "título legítimo de ocupação da habitação", pelo que decidiu que o despejo "deve ser anulado", condenando a câmara "a realojar o autor e o seu agregado familiar em habitação de tipologia semelhante à que se encontravam a habitar".

Perante a sentença, referida na reunião pelo vereador da CDU, Rui Sá, Matilde Alves reagiu: "Até hoje, não perdemos nenhum processo. Desta acção vamos recorrer". Ao PÚBLICO, Filipa Melo, da administração da empresa municipal DomusSocial, reiterou: "Até à presente data não existe nenhuma acção, transitada em julgado, que condene o munícipio a proceder a um realojamento". Contudo, a mesma fonte não indicou se, à semelhança deste caso, existem outras acções, pendentes de recurso, desfavoráveis à autarquia. Recorde-se que a ausência de um título legítimo de ocupação está entre os principais motivos apresentados pela autarquia para o despejo de moradores.

No tempo destinado aos munícipes, Rogélia Cabreira, outra ex-moradora do S. João de Deus, reclamou também da ordem de despejo, de Agosto de 2008, por não concordar com a razão apresentada. De acordo com a notificação, o despejo de Rogélia e família realizou-se porque, lê-se no documento: "Demonstram possuir meios bastantes para prover à sua própria habitação, já que chegou ao processo a indicação de que Rogélia Cabreira é proprietária de uma viatura automóvel da marca Mercedes Benz, modelo E 220 CDI, cujo valor comercial oscila entre os 25 mil e os 35 mil euros, sem que sobre a mesma impendam quaisquer ónus ou encargos". O motivo foi considerado "extremamente preocupante" por Rui Sá, mas Matilde Alves garantiu que o trabalho desenvolvido não lhe "pesa nunca na consciência".