Paulo Ferreira, Ana Carrilho (RR) e Daniel Rocha (fotos, in Jornal Público
O líder da UGT defende que o Código do Trabalho é um bom instrumento de combate à crise e aceita a suspensão da medida que penaliza os contratos a prazo com mais Taxa Social Única
A uma semana de mais um congresso da União Geral dos Trabalhadores (UGT), João Proença explica por que é que as intenções de renovação da liderança da central sindical não seguiram em frente. Em entrevista ao Diga Lá, Excelência, do PÚBLICO, Rádio Renascença e RTP2, fala das dificuldades dos trabalhadores e dos sindicalismo em tempos de crise e defende que, neste ano eleitoral, o mais importante é garantir a governabilidade do país.
Há uns meses, dizia que não queria ficar à frente da UGT depois do congresso. Mas agora tudo indica que vai mesmo continuar. O que é que mudou?
Eu exprimi essa vontade clara de renovação na UGT. Dos 10 cargos mais importantes da UGT a tempo inteiro, oito estão em funções há um mandato ou menos. Só eu e outro permanente é que estamos há mais tempo. Portanto, houve uma profunda renovação, mas queremos continuá-la e ela passa muito pela imagem do secretário-geral. Vou recandidatar-me porque houve muitas solicitações de muitos sindicatos de muitas tendências e, por outro lado, neste momento de crise, penso que seria mau deixar a UGT quando os trabalhadores e os sindicatos enfrentam dificuldades.
Vai levar o mandato até ao fim?
Sim, tenho intenções claras de cumprir aquilo que é a decisão do congresso. Mas é o último mandato e até vamos introduzir uma alteração nos estatutos para haver uma limitação no número de mandatos.
A sindicalização está a aumentar ou a diminuir?
Está estável. Há uma grande movimentação de sindicalizados. Nos últimos quatro anos, nos sindicatos da UGT houve 60 mil entradas e 50 mil saídas. Portanto, a UGT passa de 510 mil do último congresso para cerca de 520 mil. O número de sindicalizados não muda muito, mas muda a situação dos sindicatos em termos financeiros, porque os novos sindicalizados pagam uma quota muito inferior aos que estão a sair para a reforma. E isto tem provocado problemas financeiros aos sindicatos.
Mas esta situação de crise não seria a altura de aumentar a sindicalização, uma vez que as ameaças aos trabalhadores e ao emprego aumenta?
Esperemos que sim, mas a experiência histórica é um pouco negativa, em momentos de crise. Em época de crise, perdem-se sindicalizados. Muita gente dessindicaliza-se porque faz um esforço financeiro para pagar a quota, que é de cerca de um por cento do salário. Ainda há dias estava com um sindicato de cerâmicos de Aveiro que dizia que estavam a perder sócios porque o dinheiro da quota faz falta às pessoas. E em época de crise as pessoas estão preocupadas com o seu posto de trabalho e muitas vezes acham que tornar visível a sindicalização provoca uma maior instabilidade no direito ao emprego.
Isso é um paradoxo...
É, mas é a realidade. Em crise também cresce a individualização da relação de trabalho e é um pouco o salve-se quem puder. Mas a sindicalização também está ligada à capacidade de os sindicatos chegarem aos trabalhadores. No mesmo sindicato pode ter uma empresa com uma sindicalização muito alta e outra ao lado com uma sindicalização muito baixa.
E os sindicatos da UGT têm mais dificuldade?
Acho que todos têm dificuldade. Têm que reforçar a participação nos locais de trabalho. Há também atitudes anti-sindicais de muitas empresas. Em muitas PME mas também em grandes empresas. Vemos com alguma preocupação alguns grandes empresários fazerem declarações anti-sindicais.
Quer nomear alguém?
Não. Mesmo nos Estados Unidos, onde o movimento sindical tem mais dificuldades, está provado que as empresas que têm maior competitividade são as que têm presença sindical e negociação colectiva, que é um instrumento fundamental para conciliar interesses nas empresas. Por vezes, também a elevada precaridade dificulta a sindicalização. Um em cada três trabalhadores em Portugal tem um vínculo laboral precário. E sobretudo os jovens entram no mercado de trabalho com vínculos precários.
O Códido do Trabalho tem algumas medidas de combate à precaridade. Nesta altura de crise essas são boas medidas?
Uma das linhas fundamentais no Código do Trabalho é o combate à precaridade que está traduzido em várias medidas. E uma das medidas que é do acordo tripartido que deu origem ao Código é a que diz que os contratos a prazo devem pagar mais três por cento de Taxa Social Única com redução de um por cento nos trabalhadores permanentes.
Mas essa medida será adiada.
Nós estamos de acordo com o adiamento, mas não com a possibilidade de não ser posta em vigor. Queremos a legislação já e aceitamos que em época de crise não seja já aplicada.
Em época de crise, é preferível haver trabalho precário a nenhum trabalho?
Não, não. Nada disso. O problema é que, quando olhamos para a subida acentuada do desemprego, qual é, de longe, a origem dos desempregados? A não renovação dos contratos precários. Portanto, a medida podia incentivar a não renovação desses contratos.
Há quem defenda que o Código do Trabalho não deveria entrar em vigor em época de crise.
Mal de nós quando fizermos uma legislação de trabalho para a crise. Quando se fizer uma medida específica para a crise tem que ser temporária, não pode ser um código. Eu diria que o Código do Trabalho, se tem um mal, foi ter entrado em vigor demasiado tarde. E poderá ser um instrumento importante também para combater a crise com uma das medidas fundamentais que é o reforço da negociação colectiva. E se, nas empresas, trabalhadores e empregadores discutirem a resposta à crise.