7.6.10

Dificuldades económicas levam história a repetir-se

Bruno Amorim, in Jornal de Notícias

Os tempos de aperto anunciados pelo Governo, com acordo do principal partido da Oposição, relembram outro período difícil na história da economia nacional. Nos anos 80, uma grave crise financeira juntou PS e PSD no mesmo Governo para solucionar o problema.

Em 1982 o cenário começou a complicar-se para Portugal. Na altura, a inflação e o défice da balança de pagamentos dispararam e o escudo sofreu uma vertiginosa desvalorização (de uma só vez caiu 12%, deslizando depois à média mensal de 1%). A dívida externa de 1199 milhões de contos fez com que, um ano depois, o país deixasse de ter dinheiro para pagar as suas dívidas. Com as linhas de crédito esgotadas e sem divisas, a situação era dramática.

O economista João Loureiro explica que a situação vivida nos anos 80, apesar de ter algumas semelhanças com a actual conjuntura, era um cenário mais grave. "Portugal tinha uma problema de divisas. Ninguém nos emprestava dinheiro e, além disso, a nossa moeda, o escudo, dificilmente era aceite no comércio internacional. Hoje, o nosso país consegue obter crédito. O problema está nas altas taxas de juro que resultam das classificações das agências de rating. E o euro é aceite em todo o lado", diz o docente da Faculdade de Economia do Porto.

Recuando novamente a 1983, e face ao perigo de bancarrota, a solução do país passou por negociar um segundo empréstimo - o primeiro tinha sido em 1978 - junto do Fundo Monetário Internacional (FMI). O Governo do Bloco Central, liderado por Mário Soares (PS) e Mota Pinto (PSD), tinha um acordo de intenções com o FMI que obrigou a um tratamento de choque e à adopção de uma série de medidas duras.

"O FMI, para nos emprestar dinheiro, exigiu contrapartidas, e isso motivou um rigoroso ajustamento orçamental, que acabou por ser obtido através da subida de impostos e a redução das despesas públicas. Foi uma política orçamental contraccionista", frisa João Loureiro.

As decisões tomadas na altura pelo ministro das Finanças, Ernâni Lopes, afectaram diferentes áreas da actividade económica. A fórmula incluiu subidas de preços dos cereais e combustíveis, aumentos salariais da Função Pública abaixo da taxa de inflação, congelamento do investimento público, aumento forte das taxas de juro (saltaram acima dos 20%) e desvalorizações acentuadas da taxa de câmbio e a saída de divisas para o estrangeiro foi contida.

O Governo de então decidiu ainda a cobrança de um imposto extraordinário, rectroactivo - "um empréstimo forçado", sublinha João Loureiro -, de 28% sobre o 13.º mês, que ficou conhecido como o imposto sobre o subsídio de Natal. Muitos defendiam que a medida era anticonstitucional, o que motivou grande contestação.

Este tratamento de choque teve efeitos violentos, para o bem ou para o mal. A despesa pública caiu a pique e a política salarial foi refreada. Por outro lado, um crescimento negativo do PIB (-1%), a inflação recorde de 29,3 % e a subida da taxa de desemprego (8,7%) foram inevitáveis em 1984.

Apesar das críticas, o Governo acabou por tirar Portugal da crise. O Bloco Central, antes de cair, em 1985, por desentendimentos entre os dois partidos que o suportavam, ainda assinou o tratado de adesão à Comunidade Económica Europeia (CEE).

Voltando ao presente, é precisamente a exigência vinda da Europa que levou José Sócrates e Pedro Passos Coelho a encontrarem, juntos, um modo de cumprir os critérios de convergência da União Europeia. "As pressões de Bruxelas para combater o défice obrigam a seguir este rumo", salienta João Loureiro.