Por Ana Suspiro, in iOnline
Recessão mais profunda e longa, desemprego a disparar e dívida pública fora de controlo, são "falhanços notáveis" do primeiro plano grego
Um porta-voz do Fundo Monetário Internacional (FMI) desvalorizou ontem o alcance de um relatório elaborado por técnicos da instituição que aponta os erros cometidos no primeiro plano de assistência financeira à Grécia, decidido em 2010. O documento "supõe um olhar para o passado", adiantou Gerry Rice, para quem "o novo programa internalizou as lições do primeiro".
Quem acompanha de perto a realidade portuguesa não pode deixar de encontrar grandes coincidências entre os "falhanços notáveis" da aplicação do programa original grego e os resultados obtidos pelo plano português, aprovado em Abril de 2011.
Apesar de alguns "sucessos importantes", como manter o país no euro e limitar o efeito de contágio da crise do euro, o programa grego falhou "objectivos críticos" como a retoma do crescimento económico, a sustentabilidade da dívida pública e o regresso aos mercados. É nos dois primeiros fracassos que os resultados dos programas nacionais mais se aproximam do caso grego. A recessão tem sido muito mais profunda que o previsto e a retoma vai demorar mais tempo. A consequência mais visível é o nível "excepcionalmente alto" que o desemprego atingiu nos dois países, furando todas as previsões. Na Grécia a diferença ultrapassa 10 pontos percentuais, em Portugal vai nos cinco pontos.
Mais recessão, mais défice, é igual a mais dívida pública. Na Grécia, a trajectória descontrolada impôs a reestruturação de dívida, por cá já se ultrapassou o limite que o FMI considera ser o patamar da sustentabilidade: 124% do PIB.
Mas se os técnicos do FMI fazem o mea culpa, num relatório "que não reflecte necessariamente" a posição do Fundo ou da sua direcção, as principais críticas vão para os parceiros europeus da troika.
"Na perspectiva do Fundo, a Comissão Europeia focou as suas reformas mais no cumprimento das regras da UE que no crescimento económico. Não foi capaz de contribuir muito para identificar reformas estruturais promotoras do crescimento. No sector financeiro, o Banco Central Europeu reivindicou a liderança óbvia, mas não era perito em supervisão bancária, ao contrário do Fundo."
Reestruturação de dívida logo O documento reconhece falhas de coordenação numa solução inovadora e aponta o dedo aos sinais contraditórios que vieram da política europeia e que alimentaram a incerteza e a pressão dos mercados.
O relatório defende que a reestruturação da dívida grega deveria ter avançado logo, o que só não aconteceu devido à resistência inicial das autoridades europeias. Esta é a conclusão mais atacada pela Comissão Europeia, que através do porta-voz do comissário dos Assuntos Económicos sublinhou "discordar fundamentalmente" desta conclusão, em particular por não ter em conta o efeitos de contágio da reestruturação sem estarem criados os mecanismos europeus de estabilização financeira.
De resto, o documento não reflecte a posição oficial do Fundo, conclui Simon O'Connor. Já o porta-voz do FMI constata: "O relatório avalia como se podiam ter feito as coisas de maneira diferente. Mas neste momento com a mesma informação teríamos feito o mesmo", afirmou Gerry Rice.