Filipe Barros Pinto, Joana Morais e Castro (Opinião), in Público on-line
Colaboradores e voluntários das IPSS são diretamente afetados, expostos ao cansaço físico e emocional, muitas vezes até, sendo vítimas desta nova doença.
Há homens que lutam um dia, e são bons;
há outros que lutam um ano, e são melhores;
há os que lutam muitos anos, e são muito bons;
Porém há os que lutam toda a vida,
Esses são os imprescindíveis.
Bertolt Brecht
A grande maioria das organizações de economia social prestadoras de serviços sociais são as que estão registadas como Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), que são mais de 5000. E, por todo o país, continuamente, as IPSS estão a salvar vidas. Trabalham incansavelmente para assegurar respostas essenciais para o país e melhorar as condições de vida de milhares de pessoas. Para as IPSS e para aqueles que servem, todos os momentos contam – e na pandemia de covid-19 que estamos a viver, cada instante é crucial.
A gravidade da situação levou a que as orientações oficiais nos remetessem ao isolamento, que quem pudesse passasse a teletrabalho, que a maioria das empresas interrompessem ou reduzissem a sua produção e trabalho. No entanto, estruturas residenciais, serviços de apoio domiciliário e outras respostas sociais dirigidas a pessoas idosas, portadoras de deficiência, população sem-abrigo, entre outros, continuaram a responder, atuando onde e quando outros não podiam. À medida que as populações fazem o que lhes “toca fazer” para responder à necessidade de distanciamento social, uma expressiva maioria de IPSS permanece na linha da frente e a agir onde são mais necessárias.
A pandemia também está a conduzir estas organizações por um caminho desafiador. Em vez de responderem apenas às necessidades daqueles que servem, também enfrentam dificuldades dentro de portas. Colaboradores e voluntários das IPSS são diretamente afetados, expostos ao cansaço físico e emocional, muitas vezes até, sendo vítimas desta nova doença.
Sobretudo na fase inicial, recebiam declarações e mensagens provenientes de políticas de resposta à covid-19, que eram alteradas com frequência e que uns dias depois de serem comunicadas expiravam ou evoluíam para novas regras ou diretrizes. Apesar de por vezes se sentirem confusas, as IPSS reagiram celeremente, adaptando-se e respondendo à altura. Para agravar ainda mais estas condições, o impacto de verem algumas das suas respostas sociais fechadas (creches, jardins de infância, centros de dia, entre outros) rapidamente se transformou numa ameaça à sua própria sustentabilidade financeira organizacional.
Ora, é hora de reconhecer a multiplicidade de formas através das quais as IPSS estão a ajudar. São organizações que estão a colocar as suas habilidades para estar na linha da frente com coragem, mesmo estando em risco, e mesmo quando o trabalho que desenvolvem ultrapassa vastamente o que já faziam e lhes era habitual realizarem.
As IPSS estão a responder, em Portugal, de modo efetivo, a necessidades humanitárias agudas.
- coordenando com as Autoridades de Saúde, Segurança Social e Câmaras Municipais para fortalecer a capacidade de resposta às necessidades sociais da sua envolvente;
implementando medidas de prestação de cuidados integrados de saúde e apoio social nas estruturas residenciais para idosos ou pessoas portadoras de deficiência para reduzir o risco de contágio e ajudar a aliviar a pressão nos hospitais;
-adaptando e reforçando os serviços de apoio domiciliário;
- fornecendo refeições e medicamentos para pessoas altamente dependentes e sem retaguarda familiar;
-garantindo a segurança das pessoas idosas nas suas próprias casas, fazendo as compras que estes necessitam para que se reduza a possibilidade de serem infetados e intensificando o contacto através do telefone ou outras formas de comunicar;
-prestando cuidados e apoio à população sem-abrigo, através do reforço dos serviços de assistência nas ruas e albergues, garantindo proteção, alojamento, comida, roupas e apoio à higiene;
-atendendo ao aumento de pessoas que ficaram em situação de desemprego, fornecendo dinheiro de emergência, suporte e orientação;
-mobilizando serviços de saúde mental e de apoio psicossocial;
-trabalhando em medidas de prevenção e tratamento
Não temos todas as respostas em torno da covid-19, nem podemos prever o futuro, mas sabemos que as IPSS estão a enfrentar a pandemia em primeira mão e de frente, com consciência que a incerteza do tempo que vivemos em relação à covid-19, oferece a certeza de um cenário devastador em termos económicos e sociais. Essa é a certeza da incerteza. E, a realidade é que, graças à notável atuação das IPSS, podemos confiar que o cenário catastrófico que anunciam será mitigado, pois estamos certos que permanecerão resilientemente a lutar contra as consequências de um país convalescente e a prestar cuidados dignos e de alta qualidade aos milhares de portugueses que procuram servir. A cada instante.
Apesar de complexo, analisar o impacto da pandemia da covid-19 nas IPSS e seus beneficiários em Portugal, torna-se fundamental de forma a melhor se preparar as necessidades à nova e futura realidade. Por outro lado, a informação sobre o impacto da covid-19 nas IPSS permite dar visibilidade, junto dos atores-chave com quem as IPSS se relacionam e da sociedade em geral, aos recursos mobilizados e às respostas inovadoras adotadas para fazerem face às necessidades (permanentes ou novas) dos seus beneficiários. De forma a contribuir para esta identificação e compreensão dos desafios que as IPSS e seus beneficiários estão a enfrentar, a Área Transversal de Economia Social do Centro Regional do Porto da Universidade Católica Portuguesa vai iniciar um estudo exploratório, procurando oferecer um pequeno contributo para a construção de um futuro com medidas e soluções adequadas às necessidades reais e atuais, reconhecendo que as IPSS e seus beneficiários, na luta da covid-19, continuarão a ser os invisíveis imprescindíveis.