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Um ano e meio de trabalho depois, feito a mais de 320 mãos, dispersas pelos cinco continentes, surge o “Dicionário da Invisibilidade”, uma obra da SOS Racismo para dar a conhecer, em mais de 600 páginas, as pessoas invisíveis.
O projeto começou a ser pensado em 2018, disse à Lusa José Falcão, membro da direção da SOS Racismo, na sequência de toda a discussão sobre “distinção racial e a visibilidade dos corpos negros, ciganos, mulheres”.
“A invisibilidade desta questão está na boca do dia, a toda a hora” e isso deu à SOS Racismo a ideia de criar um dicionário que contasse a história e a vida de tanta gente anónima que pelo mundo fora travou lutas sociais, como ativistas ou revolucionários ou como cientistas ou filósofos.
José Falcão sublinhou que não se trata de um trabalho académico, mas sim militante, que reflete a forma como a própria SOS Racismo tem travado as suas lutas, e que está agora materializado num volume de mais de 600 páginas e mais de três mil entradas, representativas dos cinco continentes.
O dirigente da SOS Racismo explicou à Lusa que na obra os cinco continentes estão divididos em seis capítulos, porque a opção foi a de separar a América Latina dos Estados Unidos e do Canadá, aos quais se juntam África, Ásia e Médio Oriente, Oceânia e Europa.
Dentro de cada capítulo há um grupo dedicado às lutas sociais, onde se incluem os temas feminismo, independências, políticas e racismo, e outro sobre cultura e ciências onde estão as entradas sobre arte, ciência e tecnologia, cinema e teatro, desporto, filosofia, teoria política, ciências sociais, literatura e música.
“Tudo isto está nos cinco continentes com nomes que estão relacionados com estas temáticas”, salientou José Falcão, que destacou o facto de todo o trabalho ter sido feito graças ao esforço voluntário de 160 pessoas, em pleno período de pandemia e confinamento, espalhadas pelos cinco continentes.
“Na austrália conseguimos que dezenas de chefes aborígenes fizessem parte deste dicionário e tratassem das entradas sobre a Oceânia. Cento e tal pessoas de origem aborígene estão no dicionário”, revelou.
A obra seria para assinalar os 30 anos da associação, no ano passado, mas a pandemia provocada pela covid-19 obrigou a atrasar a apresentação, que está agora marcada para 19 de junho.
O livro é de venda ao público e estará à venda nas livrarias ou por encomenda à SOS Racismo e, segundo José Falcão, o objetivo é que daqui por um ano ela possa estar acessível online.
Entretanto, a associação quer que a obra chegue a todas as escolas do país e já lançou o repto às câmaras municipais, havendo já “uma vintena de autarquias” que encomendaram o dicionário, tal como o Alto Comissariado para as Migrações (ACM), que também “comprou muitos livros”.
Por não haver nada parecido e com esta amplitude, o nome “Dicionário da Invisibilidade” está patenteado e traz “histórias incríveis e absolutamente alucinantes” como a da indiana Phoolan Devi (1963-2001), que ficou conhecida como “rainha dos bandidos”, mas também de dirigentes do movimento Panteras Negras, dos Estados Unidos, ou outros dirigentes nas revoltas da América Latina, na guerra civil de Espanha ou outras lutas civis.
Para Portugal existem mais de 200 entradas, de Zeca Afonso a Alcino Monteiro, ou Fernando Castro, “um dos primeiros dirigentes negros na Assembleia da República”.
“Tem a primeira pessoa assassinada pela GNR em 1911, quando a GNR aparece, que tem uma estátua em Setúbal e que tem a ver com a luta das conserveiras”, exemplificou José Falcão.
O dicionário conta ainda com a colaboração do cartoonista e ilustrador André Carrilho, responsável não só pela capa, mas também pelas 20 ilustrações que integram a obra.
Além da apresentação pública do próximo sábado estão ainda previstas uma apresentação na Universidade do Porto, em setembro, e outra em Beja.