Dados do relatório "Balanço Social", divulgado esta terça-feira, mostram ainda assim uma pequena melhoria nos indicadores de pobreza persistente em 2019, ano anterior à pandemia.
A pobreza persistente atingia em 2019 um em cada dez cidadãos do país, ou 9,8%.
A pobreza em Portugal mantém-se, maioritariamente, um fenómeno persistente, com seis em cada dez indivíduos pobres a não conseguirem melhorar rendimentos ao longo de pelo menos três anos no período que vai de 2016 a 2019.
A indicação é dada pelo relatório "Portugal, Balanço Social 2021", apresentado nesta terça-feira pelo centro de conhecimento Economics for Policy da Nova SBE, em parceria com a Fundação La Caixa e BPI. O documento, de caráter anual, analisa, entre outros dados, informação detalhada do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento produzido pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), permitindo acompanhar a evolução dos rendimentos das famílias ao longo de vários anos.
Desta vez, a análise incide sobre os dados relativos ao rendimento dos portugueses em 2019, ano em que se observaram melhorias nos indicadores de pobreza entretanto revertidas por impacto da pandemia. A percentagem da população que vive com valores de rendimento abaixo dos quais um indivíduo é considerado pobre no país (540 euros mensais nesse ano) desceu então aos 16,2% (foi já de 18,4% em 2020, em dados provisórios avançados em dezembro pelo INE e que no próximo verão já poderão ser analisados na sua forma completa por investigadores).
O estudo Nova SBE, de Bruno Carvalho, Mariana Esteves e Susana Peralta, analisa vários indicadores de caracterização da pobreza nacional, incluindo a sua persistência. Conclui que 60% daqueles que eram pobres em 2019 o tinham sido também em pelo menos dois de entre os três anos anteriores. Trata-se de uma melhoria ligeira face aos dados do relatório relativo ao ano anterior, quando 62.5% dos pobres do país não conseguiam mudar de vida.
Quando considerado o conjunto da população, a pobreza persistente atingia em 2019 um em cada dez cidadãos do país, ou 9,8%, que comparam com 12,5% da população que se manteve pobre na maioria dos anos de 2015 a 2018.
No que diz respeito aos dados de 2016 a 2019, "o número mais preocupante é a percentagem substancial de pessoas (6%) que, durante os quatro anos em análise, nunca saiu da situação de pobreza". Esta percentagem foi de 8,6% no período de 2015 a 2018.
À semelhança do que referiam já na edição deste estudo divulgada no ano passado, os investigadores alertam para "bolsas de pobreza persistente em Portugal que devem ser objeto de especial atenção no desenho de políticas públicas".
O documento nota também que este "quadro de pobreza persistente é especialmente agravado nos desempregados, com uma prevalência de mais do dobro da da população em geral". Quase um quarto dos desempregados, 23,7%, mantinha-se na pobreza em 2019 e na maioria dos anos anteriores.
Mas a pobreza persistente também atinge 5% dos trabalhadores do país, segundo o relatório.
Crianças e idosos continuam a empobrecer
É também elevada a pobreza persistente entre crianças, entre as quais - à semelhança dos indivíduos com 65 ou mais anos - se agravou a pobreza em 2019, apesar de uma melhoria de indicadores globais. Nesse ano, 19,1% dos menores do país encontravam-se na pobreza (18,5% em 2018), e eram 11,4% aqueles que viviam em situação prolongada de pobreza de 2016 a 2019.
O estudo destaca, aliás, que uma em cada três crianças se manteve na pobreza em pelo menos um ano ao longo de todo esse período.
É, de resto, entre as famílias com filhos que mais prevalece a pobreza em Portugal, sendo sobretudo elevada entre famílias monoparentais (em 2019, atingia 25,5% das famílias nas quais há apenas um adulto) e naquelas que têm três ou mais filhos (39,8%).
Já para a população idosa, não há indicadores quanto à persistência da pobreza, mas este mantém-se como o segundo grupo mais vulnerável, a seguir ao das crianças, com uma taxa de pobreza de 17,5% em 2019, agravada em duas décimas face aos dados do ano anterior.
É também entre os mais velhos que é maior a privação material, com 59,9% a não conseguirem fazer face a uma despesa inesperada (33,3% na população em geral) e 43% incapazes de manter a casa adequadamente aquecida com os rendimentos que têm (24,1% na população em geral), nos dados relativos a 2019.
Entre a população que trabalha, mantêm-se também níveis elevados de pobreza: um em cada dez trabalhadores é pobre em Portugal. E os dados do estudo hoje apresentado mostram que a pobreza não é indiferente ao vínculo laboral que se tem, já que são os trabalhadores precários aqueles que enfrentam maiores dificuldades. A percentagem de trabalhadores pobres entre contratados a prazo atinge os 19,8%, mais do dobro da taxa de pobreza entre quem tem vínculos permanentes (9,3%).
Os dados agora publicados refletem ainda o fim de uma trajetória de melhoria nos indicadores de pobreza que acabou por ser interrompida pela pandemia, com os indicadores preliminares já conhecidos sobre os rendimentos das famílias em 2020 a mostrarem um agravamento acentuado. A taxa de pobreza avançou 2,2 pontos percentuais, passando aos 18,4%, naquela que foi a maior subida registada em toda a série do INE.
Em Portugal e no resto dos países europeus, é considerado pobre quem vive com menos de 60% do rendimento mediano nacional. Esse valor foi de 540 euros mensais em 2019 e de 554 euros em 2020. O rendimento disponível é considerado por indivíduo, sendo distribuído de acordo com o número e situação dos membros dos agregados familiares.