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23.5.22

Há mais mulheres a trabalhar em Portugal mas continuam a ganhar menos. 20% vive em risco de exclusão social

in SapoLifeStyle

Este ano, o Dia do Trabalhador e o Dia da Mãe celebram-se na mesma data. Para assinalar esta coincidência, a Pordata, a base de dados estatísticos da Fundação Francisco Manuel dos Santos, compilou uma série de dados que caracterizam o perfil atual da mulher trabalhadora portuguesa.

Há, hoje, mais mulheres a trabalhar em Portugal do que em décadas anteriores mas continuam a ganhar menos do que os homens e cerca de um quinto vive mesmo em risco de pobreza e exclusão social. Estas são algumas das principais conclusões dos dados compilados pela Pordata, a base de dados estatísticos da Fundação Francisco Manuel dos Santos, no âmbito de um relatório que pretende assinalar o Dia do Trabalhador e o Dia da Mãe, que hoje, dia 1, se comemoram.

"A evolução histórica é notória, mas ainda há caminho a percorrer no que respeita à situação laboral das mulheres e mães portuguesas", alerta a instituição em comunicado de imprensa. "Estes são também dados que permitem verificar as diferenças que as mulheres em Portugal apresentam face às dos restantes países da União Europeia e a sua vulnerabilidade face à pobreza e ao desemprego", refere ainda o documento. Os números recolhidos atentam-no.

Existem atualmente 2,4 milhões de mulheres trabalhadoras em Portugal. Representam metade da população empregada. Dessas, segundo o Instituto Nacional de Estatística, 88% trabalha por conta de outrem, 8% são trabalhadoras por conta própria isoladas e apenas 3% são empregadoras. 10% trabalha apenas a tempo parcial. Desses 2,4 milhões, 82,6% presta funções na área dos serviços, 15,8% trabalha na indústria e 1,6% subsiste da agricultura e das pescas. Das trabalhadoras por conta de outrem, 83% estão efetivas e 14% têm contrato a prazo.

Em termos de população empregada, a diferença numérica não é grande. Em 2021, o número oficial de homens era 2.428.600 e o de mulheres 2.383.700. Mas, ao fim do mês, eles não levam para casa o mesmo do que elas. "Elas ganham, em geral, menos 220 € por mês. Mas a diferença acentua-se nos níveis mais elevados. Nos quadros superiores, elas ganham menos 700 € que os homens e menos 326 € entre os profissionais altamente qualificados", sublinha.

"É nas atividades financeiras e nos seguros que a diferença é maior. Elas ganham menos 624 €. Segue-se o setor da saúde com uma diferença de mais de 380 € e a educação com 349 € de diferença", informa ainda a instituição. Ainda assim, as coisas têm evoluído. Hoje, elas estão mais presentes nos cargos de decisão empresariais. "Quase um terço dos cargos dos conselhos de administração das empresas cotadas em bolsa são ocupados por mulheres", constata a fundação.

"Portugal é o décimo-primeiro país da UE27 com maior peso das mulheres nos conselhos de administração das empresas. A evolução em Portugal tem sido notória. Antes de 2010, o peso das mulheres era inferior a 5%", recorda esta entidade. O peso das empregadoras também aumentou. Em 1974, eram cerca de 12.000. Hoje, rondam os 76.500. "No contexto da UE27, Portugal é o segundo país onde o peso das empregadoras é mais elevado", regozija-se esta entidade.

Na política, também há mais mulheres eleitas. A percentagem de representantes femininas nas assembleias legislativas atingiu os 40,9% em 2021. Em 2003, não ia além dos 20,5%. Apesar dos avanços positivos, mantêm-se os alertas. As mulheres continuam a ser mais vulneráveis à pobreza e à exclusão social do que os homens. Uma em cada cinco corre esse risco, alerta a fundação. "A percentagem do número de adultos, mulheres a viverem sozinhos com crianças ou filhos no total das famílias monoparentais, em Portugal, em 2020,é de 85,4%", sublinha a instituição.

O desemprego também as afeta mais. Mais de metade dos desempregados inscritos no Instituto do Emprego e da Formação Profissional são mulheres, 57%. "São também elas que estão em maioria enquanto beneficiárias dos subsídios de desemprego (56%) e do subsídio social de desemprego (61%)", refere. As dificuldades sentidas acabam por levar muitas mulheres a adiar a maternidade. Em 1960, tinham o primeiro filho aos 25. Hoje aos 30,7 anos.

"As mulheres têm vindo a optar por serem mães pela primeira vez numa idade mais tardia. Portugal é o oitavo país da UE27 onde as mulheres têm o primeiro filho mais tarde. Este adiamento reduz a probabilidade de famílias numerosas. O número médio de filhos por mulher é de 1,4 crianças, o oitavo valor mais baixo da UE27. Para que a substituição de gerações seja assegurada, é preciso que cada mulher tenha em média 2,1 filhos", avisa o relatório da fundação portuguesa.

9.3.22

60 segundos Resultados Legislativas 2022 Pordata Fosso salarial entre homens e mulheres está a agravar-se

Marisa Silva, in JN

Dados da Pordata mostram que desigualdade subiu para 11,4% em 2020. Nove em dez mulheres cuidam sós dos filhos.

A pandemia agravou a desigualdade salarial entre homens e mulheres. De acordo com os dados da Pordata, o fosso subiu de 10,9% para 11,4% em 2020. Trata-se do segundo ano consecutivo a aumentar. Os dados mostram, ainda, que há mais mulheres do que homens a viverem sozinhas com os filhos. Quase nove em cada dez famílias monoparentais têm como único adulto a mulher.

Contra as desigualdades e para assinalar, hoje, o Dia Internacional da Mulher, a Rede 8 de Março agendou para o final desta tarde uma marcha no Porto, em Lisboa e em Braga. Há, ainda, outras manifestações em várias zonas do país. "Por mim, por ti, por todas" é o mote da iniciativa que marcará a apresentação do Manifesto Feminista 2022.

Liliana Rodrigues, presidente da UMAR, explicou, ao JN, que as reivindicações abrangem, entre outros temas, os direitos laborais, o reconhecimento do trabalho sexual e o maior impacto da pandemia nas mulheres.

Frisando que "os anos passam e as desigualdades persistem", também a CGTP tem agendada para hoje uma marcha em Lisboa. "As mulheres em Portugal são elogiadas pelas qualificações e discriminadas nas retribuições. Empobrecem ao longo da vida pelo trabalho precário, pelos baixos salários, prestações sociais e pensões de reforma".

No campo laboral, segundo a Pordata, a pandemia fez aumentar o fosso salarial entre géneros. A par de Portugal, entre 2019 e 2020, a Letónia e Finlândia foram os únicos casos de aumento da disparidade salarial.

Ainda assim, a presença de mulheres no mercado de trabalho cresceu. Atualmente, diz a Pordata, "as mulheres já superam os homens em algumas profissões". Há mais médicas, advogadas e magistradas. Também na investigação, elas representam 42% do total de investigadores.

No domínio pessoal, as mulheres têm o primeiro filho cada vez mais tarde. "Desde 2013 que é aos 30 anos e, desde 2019, aos 31. A média da idade da mãe aumentou cerca de quatro anos desde o início deste século", detalha, revelando que, apesar de nasceram mais homens, as mulheres vivem mais. No entanto, "os anos de vida saudável são inferiores para elas".

Bancos de jardins lembram mulheres inspiradoras

Os bancos da Avenida da Liberdade (Lisboa) foram forrados com 72 imagens de mulheres inspiradoras nas áreas do desporto, artes e política, entre outras. Rosa Mota, Paula Rego, Agustina Bessa-Luís, Maria Barroso ou Maria de Lourdes Pintassilgo são nomes que podemos encontrar. Outros 16 bancos terão espelhos, para que qualquer mulher se sinta representada na iniciativa da Junta de Santo António.


27.10.21

Pandemia faz aumentar disparidade salarial entre homens e mulheres em Portugal

Almerinda Romeira, in Negócios on-line

As mulheres ganham menos do que homens, acumulam mais horas de trabalho não remunerado e são mais atingidas pelo desemprego, segundo estudo. Fórum Económico Mundial concluiu que a paridade de género só será atingida daqui a 135 anos.

Os últimos 18 meses levaram a um aumento da desigualdade salarial entre os géneros, consequência da pandemia por Covid-19, alertou esta terça-feira, 26 de outubro, a Willis Towers Watson, empresa de consultoria, corretagem e soluções com clientes em todo o mundo.

No webinar “Igualdade Remuneratória sob várias perspetivas: implicações da pandemia, impacto na reforma e ESG”, Ana Amado, Director, Retirement-Non Actuarial da Willis Towers Watson em Portugal, afirmou que o índice de igualdade de género da União Europeia, na pré-pandemia, era de 67,9% e, em Portugal, de 61,3%, com uma “clara recuperação face a 2010”.

A disparidade salarial entre homens e mulheres, acrescentou, atinge os 20% a nível mundial (dados do último trimestre de 2020). Na Europa é de 14,1%. Em Portugal, em 2018, o gap situava-se nos 14,4%.

Também no desemprego, os homens levam vantagem sobre as mulheres. Apesar da população portuguesa ativa ser composta por 51% homens e 49% mulheres, quando no primeiro trimestre de 2020 se verificou um decréscimo de cerca de 50 mil empregos, 45 mil eram de mulheres. A distribuição da população desempregada, salienta aquela responsável, é mesmo menos vantajosa para o sexo feminino: 43% dos desempregados são homens contra 57% de mulheres.

“Concluímos que, efetivamente, as mulheres foram bastante afetadas pelas consequências da pandemia, uma vez que tipicamente têm uma situação laboral mais frágil e têm mais trabalhos informais, que podem incorrer mais facilmente numa situação de desemprego”, explicou Ana Amado, falando no impacto da pandemia sob outra perspetiva: a distribuição desigual das responsabilidades domésticas e de trabalhos não remunerados em casa.

A este respeito, citou o Relatório Anual de Igualdade de Género (2021) da Comissão Europeia, segundo o qual, as mulheres, em média, gastam 62 horas por semana, em média, a tomar conta das crianças e 23 horas semanais com tarefas domésticas, em comparação com as 36 horas e 15 horas, respetivamente gastas pelos homens.

Os dados do inquérito do Eurofund, salientou Ana Amado, “mostram que a Covid 19 teve um impacto mais significativo nas mulheres com filhos pequenos, que dizem ter mais dificuldade em concentrar-se no trabalho, em comparação com os homens”. Tudo somado – teletrabalho, encerramento das escolas e quarentenas profiláticas – conduziu a um aumento do volume de trabalho das mulheres, devido ao seu papel de cuidadoras e responsáveis pelas tarefas domésticas e a uma maior dificuldade da conciliação da vida pessoal com a profissional, justificou a responsável da Willis Towers Watson em Portugal.

O mais recente estudo do Fórum Económico Mundial revela que a paridade de género só será atingida daqui a 135 anos, o que representa um aumento de 35 anos face ao relatório anterior devido à pandemia, salienta ainda Ana Amado.




20.10.21

Salários das diferentes gerações pouco fogem aos 600 euros

Maria Caetanoin DN

Compressão pode ser explicada por contratação coletiva e salário mínimo nacional, diz estudo da Fundação Calouste Gulbenkian.

As gerações mais novas estão em vantagem numa maior escolaridade, e em pior posição em aspetos como a permanência dos vínculos de trabalho ou o acesso a prestações com o subsídio de desemprego. Mas, a nível salarial, não há muitas diferenças. Há uma mediana salarial de 600 euros, em termos reais, a atravessar várias gerações.

A conclusão é do estudo "A equidade intergeracional no trabalho em Portugal", do investigador Pedro S. Martins, para a Fundação Calouste Gulbenkian, que analisou o percurso de diferentes gerações portuguesas no mercado de trabalho ao longo do tempo.

No que toca a salários, a conclusão é a de que há uma forte convergência nos rendimentos de trabalho para todas as gerações nascidas entre os anos 20 e os anos 90 do século passado, num período que vai de 1986 a 2018, mas esta é uma convergência "num patamar particularmente baixo".

Afinal, "grande parte das gerações, ao longo do período considerado, apresentam salários medianos mensais reais de 600 euros", aponta o estudo que teve como base principal de trabalho os microdados dos quadros de pessoal que reúnem a informação anual transmitida pelas empresas ao Ministério do Trabalho.

Aqui, está em causa o salário base, com poucas exceções no posicionamento neste patamar, mas também no sentido descendente. As medianas são mais baixas que os 600 euros indicados no caso dos jovens nos anos iniciais do mercado de trabalho e dos trabalhadores mais velhos já nos anos finais. Já no salário total, que inclui complementos, as medianas salariais das diferentes gerações andam em torno dos 700 euros, mas com maior dispersão.

As conclusões são semelhantes quando se analisam valores médios de remunerações. Os salários base convergem para 900 euros, e os salários totais para 1100 euros.

O estudo aponta diferentes causas para a compressão salarial verificada. Por um lado, a maior escolaridade entre as gerações mais novas tende a ser compensada pela maior antiguidade e experiência das gerações anteriores, equilibrando os rendimentos, admite-se. Mas, o autor aponta também ao papel da contratação coletiva e à evolução recente do salário mínimo para explicar o nivelamento salarial das diferentes gerações. "Se o valor deste instrumento de política económica e de rendimentos for relativamente elevado, a diferenciação salarial entre gerações poderá sair reduzida", defende.

Quanto à prevalência do salário mínimo, o estudo conclui que durante a segunda metade da década de 2010, verifica-se o crescimento do peso do salário mínimo em praticamente todas as gerações. Em particular, entre as novas gerações, 30% recebem o salário mínimo nos anos de entrada no mercado de trabalho, com a percentagem a cair anos mais tarde. Com uma exceção: os nascidos nos anos 90, onde o peso do salário mínimo se mantém nos 30%.

Maria Caetano é jornalista do Dinheiro Vivo

14.12.20

A desigualdade salarial é um mito? 6 argumentos

Bárbara Reis, in Público on-line

Nova ronda à volta do vídeo negacionista de Christina Hoff Sommers e alguns argumentos para desfazer o mito de que a desigualdade salarial é um mito.

Uma das mais célebres defensoras da ideia de que a desigualdade salarial não existe é a professora norte-americana Christina Hoff Sommers. O seu vídeo mais popular teve seis milhões de visualizações no YouTube e por isso vale a pena desmontá-lo. Sommers diz que as feministas “não são más a matemática, mas sim más a dizer a verdade”. Eu diria que o seu vídeo mostra como é fácil enganar as pessoas. Vamos por pontos.

1. Dantes, o trabalho infantil também era “normal” e uma “tradição”.

Quem fala da desigualdade salarial — Banco Mundial, ONU, governos progressistas e conservadores, Fórum Económico Mundial, etc. — não está a ceder à pressão do “activismo identitário moderno”, como um leitor aqui defendeu, mas a falar de uma injustiça. O gender pay gap fez um percurso semelhante ao de outras injustiças. Proibir as mulheres de votar é uma aberração, mas já foi a regra. Que empresa em Portugal contrataria hoje crianças para as vindimas? É inaceitável e ilegal. Mas nas vindimas mantém-se a tradição de os homens receberem mais do que as mulheres. Dirão: sempre foi assim e eles é que carregam os cestos, é a tradição. Justamente. A tradição é valorizar o esforço físico de carregar os cestos das uvas. Porque será que a tradição é desvalorizar o esforço físico de cuidar de idosos acamados? Porque será que levantar, carregar, lavar e vestir pessoas sem mobilidade vale pouco? Será que é por os cuidados sociais serem uma profissão sobretudo ocupada por mulheres? São ambos mal pagos, os trabalhadores das vindimas e os dos lares. A questão é outra: num caso, o esforço físico é valorizado, no outro o esforço físico é desvalorizado.

2. As profissões “tradicionalmente femininas” são mal pagas porque são tradicionalmente femininas.

Hoff Sommers diz que as mulheres ganham menos porque escolhem profissões mal pagas. Num tweet, fez até uma piada: “Queres acabar com a diferença salarial? Passo um: muda o teu curso de terapia de dança feminista para engenharia electrónica.” Palmas. Não lhe ocorre perguntar porque é que o mercado desvaloriza quase todas as profissões maioritariamente ocupadas por mulheres. Isso é visível nas profissões muito competitivas e nas pouco competitivas. Alguém acredita que é por acaso que as especialidades médicas mais mal pagas nos EUA são as que têm sobretudo mulheres? Falo da pediatria, psiquiatria infantil e obstetrícia. Estas são as três especialidades mais escolhidas por mulheres e as três especialidades mais mal pagas. Devem ser mesmo tontas estas mulheres que escolhem profissões tão irrelevantes para a sociedade. Agora a sério: Sommers vê o problema do avesso. Alguma coisa está errada numa sociedade que acha que cuidar da saúde das crianças é menos importante do que tratar dos dentes ou da perna partida de um adulto.

Acontece o mesmo nas profissões que exigem poucas qualificações. Porque é que “os funcionários dos parques de estacionamento que trabalham a tempo inteiro (geralmente homens) são mais bem pagos para tomar conta de carros do que os cuidadores de crianças a tempo inteiro (geralmente mulheres) são pagos para tomar conta de crianças”? Encontrei esta pergunta no site da American Association of University Women (AAUW), a organização que Sommers cita no vídeo como fonte do argumento central — deve ser credível.

3. É estranho citar estudos obscuros e sem rasto.

A propósito da AAUW, ao minuto 1’12, Sommers diz: “Até um estudo da AAUW mostra que o verdadeiro gap salarial reduz para 6,6 cêntimos quando se introduzem [nos cálculos] as diferentes escolhas que os homens e as mulheres fazem.” Tradução: diz-se por aí que as mulheres ganham menos 23 cêntimos em cada dólar que os homens ganham, mas até as feministas dizem que a diferença é só de 6,6 cêntimos. Caro leitor, não é isso que a AAUW diz — ou, se diz, está muito bem escondido. O mais próximo dessa ideia que vejo no site da organização é um estudo onde, ao fazer cálculos incluindo variáveis como o nível de escolaridade e o sector económico, a AAUW diz que há uma diferença de 7% nos rendimentos dos homens e das mulheres. Bingo para Sommers? Não me parece. Na frase seguinte percebe-se que é um inquérito a recém-licenciados sobre o salário no primeiro emprego e que “o hiato salta para 12% dez anos depois”.

4. Todos sabem que para calcular o gender pay gap é preciso incluir variáveis.

Sommers diz: isto é muito complicado, é preciso incluir variáveis para calcular o gender pay gap, não podemos ser simplistas. A professora faz de conta que descobriu que o tema é complexo e que faz o favor de nos revelar a verdade. Amigos: há anos que toda a gente séria calcula o gap salarial em subgrupos — idade, educação, antiguidade, características das empresas e sector económico. Estas são as variáveis mais comuns, mas há outras. Uns atrás dos outros, estudos e relatórios dizem que é preciso ir além dos cálculos simples das disparidades salariais e que é preciso ver de forma pormenorizada as disparidades em subgrupos homogéneos.

5. Quando incluímos as variáveis, o hiato salarial é ainda maior do que os “números simplistas”.

Estudo atrás de estudo — da OIT à Câmara dos Comuns britânica — mostram que os cálculos “ajustados” revelam um gender gap maior do que os cálculos simples. “Quando o diferencial é ajustado” e se observam de forma isolada os salários em subgrupos por idade, nível de escolaridade e antiguidade, “o diferencial (ganhos mensais e por hora) é consideravelmente elevado — cerca de 21% e 20%” (para tempo inteiro e todos os trabalhadores), lê-se num estudo coordenado pelo ISEG-Universidade de Lisboa, em parceria com o Centro de Matemática Aplicada à Previsão e Decisão Económica e o Centro de Estudos para a Intervenção Social, que acaba de ser apresentado. No cálculo simples, o gap em Portugal é de 17,7% e 20,6%.

6. E mesmo depois de calcular as variáveis, o “não explicado” é enorme.

Tendo lido tantos estudos, Sommers deve ter reparado nas tabelas que dizem “não explicado”. O fleumático Banco de Portugal diz no trabalho Sobre a discriminação sexual na formação de salários (Ana Rute Cardoso, Paulo Guimarães, Pedro Portugal e Pedro S. Raposo) que a “componente não explicada do diferencial salarial [...] é a convencionalmente associada à noção de discriminação sexual”. O que é o “não explicado”? Duas coisas: é a subvalorização do trabalho das mulheres — que recebem menos pelo mesmo trabalho, menos por trabalho equivalente e menos nas empresas “altamente feminizadas” — e é a disparidade salarial na maternidade. As mulheres que são mães recebem menos do que as que não são mães. A OIT diz que a diferença salarial na maternidade varia entre 1% (Canadá) e 30% (Turquia). De novo, há variáveis a equacionar: os salários mais baixos para as mães podem ser explicados pela interrupção da licença de maternidade, redução das horas, preferência por empregos “mais amigos da família, que pagam menos” (palavras da OIT) ou “decisões estereotipadas de contratação e promoção que penalizam as carreiras das mães”. Não sabemos. Portugal não é excepção. Num relatório recente da OIT, a maior fatia para explicar o gender gap português é “inexplicado”.

Tudo isto são pormenores maçadores que não interessam à professora Sommers. No próximo sábado, proponho mais seis argumentos. O primeiro é o mito da bravura.

30.11.20

Confinamento. Teletrabalho, precariedade e rendas vão agravar brutalmente desigualdade em Portugal

Luís Reis Ribeiro, in Dinheiro Vivo

Durante o período da troika, a desigualdade aumentou, mas desde 2015 que estava a melhorar. Estudo citado pelo FMI avisa Portugal: vai ser das sociedades mais dilaceradas pelo confinamento.

Portugal trilhou um caminho nos últimos anos em que conseguiu reduzir o nível de desigualdade na distribuição de rendimentos (índice de Gini ou IG). Mesmo com este progresso, em 2019, o País continuava a ser o nono mais desigual da Europa, isto é, tem o nono fosso mais fundo entre ricos e pobres. Um pouco mais cavado do que em Chipre, ligeiramente menos que no Luxemburgo.

Apesar dos avanços desde 2015, a crise pandémica pode virar totalmente este tabuleiro, empurrando a desigualdade para perto de níveis considerados perigosos para a paz e a coesão social. De acordo com uma análise apresentada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), a economia portuguesa é das mais vulneráveis e arrisca a enfrentar um dos maiores agravamentos da desigualdade da Europa; o País pode estar perante uma bomba relógio social.

Segundo um estudo citado pelo FMI, as medidas de confinamento estão a empurrar para as margens os que não têm possibilidade de adotar regime de teletrabalho, os mais precários, sobretudo os mais jovens, e os mais expostos ao mercado do arrendamento.

O referido artigo intitulado "Desigualdade salarial e os efeitos da pobreza e do distanciamento social na Europa" mostra que Portugal, Espanha e Chipre são os três países da Europa que enfrentam a maior ameaça que é o alastramento da desigualdade. Os autores são Juan Palomino, da Universidade de Oxford, e Juan Rodríguez e Raquel Sebastian, ambos da Universidade Complutense de Madrid.

Os economistas decidiram calcular o impacto no Índice de Gini na sequência de um período de confinamento, seguido de aberturas graduais. Assumiram um período de confinamento de dois meses e depois disso seis meses de reabertura das atividades, ainda parcial.

Os efeitos no tecido social e no fosso entre ricos e pobres são devastadores. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), o coeficiente ou índice de Gini "é um indicador de desigualdade na distribuição do rendimento sintetiza num único valor a assimetria dessa distribuição". "Assume valores entre 0 (quando todos os indivíduos têm igual rendimento) e 100 (quando todo o rendimento se concentra num único indivíduo)", sendo que "este indicador é construído com base no rendimento monetário anual líquido das famílias".

No estudo divulgado pelo FMI, em Chipre, o aumento "previsível" da desigualdade na sequência do binómio confinamento/abertura parcial é de quase oito pontos, o que colocaria o IG cipriota em quase 39 pontos.

Espanha e Portugal surgem logo a seguir, registando o segundo pior impacto, com o coeficiente da desigualdade de ambos os países a piorar quase seis pontos. No caso de Portugal, significa que o nível de desigualdade, que durante os anos da troika se agravou, mas que desde 2015 estava a melhorar, pode facilmente chegar aos 38 pontos.

O Banco Mundial considera que até aos 40 pontos a situação de desigualdade é relativamente comportável, mas que de 40 para cima a situação passa a ser preocupante, problemática, causadora de fissuras sociais ameaçadoras.

Ou seja, por causa da pandemia e das medidas restritivas subsequentes, Portugal ficará à beira desse limite crítico. Espanha também.

O mesmo trabalho também mostra que a desigualdade tende a piorar na maioria dos países mais ricos, embora essa evolução assuma uma menor gravidade nos muito ricos, claro. Na lista de impactos previsíveis, os economistas espanhóis consideram que a Dinamarca será o território menos afetado pelo fenómeno. Mesmo assim, o respetivo IG sobe 3 pontos. É cerca de metade do caso português.

O que explica que alguns países sofram mais do que outros?

Para o FMI, é claro que a pandemia alargue o fosso da inclusão social em alguns territórios, como Espanha e Portugal.

"O impacto da pandemia será particularmente agressivo para os trabalhadores com baixas qualificações e temporários", sobretudo para os que estão envolvidos nos setores do turismo e da hospitalidade, observa o Fundo.

A Comissão Europeia e o Banco de Portugal fazem o mesmo tipo de aviso. O ajustamento à pandemia na economia portuguesa tende a ser mais duro e difícil por causa da exposição ao turismo (hotéis, restaurantes), setor onde não é possível trabalhar à distância.

Os trabalhadores com menor nível de qualificações são também aqueles que se defrontam com "menos opções de teletrabalho", um canal que amplifica o efeito devastador da pandemia numa parte muito específica da população e com elevada dimensão.

Segundo o INE, no terceiro trimestre, apenas 13% dos trabalhadores em Portugal estavam em teletrabalho, cerca de 644 mil pessoas num total de quase 4,8 milhões de empregados. Com a abertura gradual das atividades, o número de teletrabalhadores afundou quase 40% face aos três meses mais marcados pelo confinamento (abril a junho). Quase 400 mil voltaram ao trabalho presencial ou ficaram sem emprego pois muitas empresas simplesmente faliram ou foram esmagadas por uma forte quebra na procura.

A análise do FMI, com base no artigo dos economistas espanhóis, refere que o índice de teletrabalho na camada dos trabalhadores com menos qualificações é muito baixo em países como Portugal, Itália, Espanha e Grécia. E bastante mais elevado na Escandinávia (Noruega, Dinamarca, etc.), o que ajuda a amortecer o impacto negativo num quadro de confinamento, em que se limita o trabalho presencia.

Isto significa que os trabalhadores menos qualificados, com salários mais baixos (mais pobres, por assim dizer) e mais precários em Portugal são os que mais facilmente ficam sem trabalho ou são obrigados a parar, logo ficam sem sustento sempre que o confinamento aperta.

O FMI refere ainda que "as perdas de rendimento" decorrentes desta situação podem tornar a vida desses trabalhadores ainda mais difícil pois tendem a "agravar" o fardo do custo da habitação, que é fixo. Por exemplo, "se os preços do arrendamento não ajustam em simultâneo", esta população trabalhadora será ainda mais marginalizada, alimentando o problema da desigualdade.

9.9.20

Que país tem menor diferença salarial entre homens e mulheres?

Sara Calado, in Ecoonline
A igualdade de oportunidades entre os homens e as mulheres é crucial para garantir a sustentabilidade de uma economia e de um país. Contudo, ainda serão necessários 257 anos para eliminar a desigualdade de género no mundo, de acordo com a previsão feita pelo Fórum Económico Mundial no período pré-Covid. A desigualdade com base no género manifesta-se em vários níveis, sendo uma delas a disparidade salarial.

A pandemia está a agravar estas desigualdades, já que há mais mulheres a trabalhar no setor dos cuidados informais e, igualmente, devido às características das suas profissões e aumento do trabalho não pago durante o confinamento. Mas afinal, qual o país onde há menor diferença salarial entre os homens e as mulheres? O Global Gender Gap Report 2020, do Fórum Económico Mundial destaca, pelo 11.ª ano consecutivo, a Islândia como o país do mundo com menores níveis de desigualdade de género quando se trata de analisa os valores dos salários.

Em abril deste ano, o salário mínimo na Islândia estava fixado nas 335.000 coroas islandesas (ISK), o equivalente a cerca de 2.072 euros. Até agora, a Islândia já conseguiu fechar quase 88% das disparidades de género. A este país seguem-se, por ordem decrescente, a Noruega, a Finlândia, a Suécia, Nicarágua, Nova Zelândia, Irlanda, Espanha, Ruanda e, finalmente, a Alemanha, em décimo lugar. Portugal surge em 35.º lugar da lista: no nosso país as mulheres ainda têm de trabalhar mais 54 dias para ganhar o mesmo salário de um homem, apesar da evolução positiva dos últimos anos.

Em nenhum dos 153 países analisados pelo Fórum Económico Mundial se conseguiu atingir a igualdade de salários para homens e mulheres. O fosso, a nível global, é de 69%.

Menos remuneração por funções semelhantes, mais mulheres em funções com salários mais baixos e pouca representação de mulheres em cargos de chefia e na política estão entre as várias razões que agravam o fosso salarial entre géneros. O Fórum Económico Mundial refere que são necessários 95 anos para eliminar a desigualdade na representação política.

A pandemia parece ter vindo piorar as previsões, pois são as mulheres o grupo que está mais vulnerável a uma situação de insegurança económica devido à Covid-19. Em média, nos países da OCDE, as mulheres representam mais de 50% dos profissionais em serviços de venda de produtos alimentares e restauração, 60% na hotelaria, e mais de 60% no setor do retalho, refere o relatório OECD Employment Outlook 2020 – Worker Security and The Covid-19 Crisis.
Portugal com caminho por percorrer

Em Portugal, os homens continuam a ganhar 14,4% mais do que as mulheres, de acordo com os últimos dados do Barómetro das Diferenças Remuneratórias entre Mulheres e Homens, do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.

Em junho deste ano, o Comité dos Direitos Sociais do Conselho da Europa acusou Portugal de violar o compromisso que assumiu de promover a igualdade de género a nível salarial. Referia-se ao artigo 20.º c. da Carta Social Europeia Revista — assinada por Portugal em 1996, ratificada em 2001 e com entrada em vigor em 2002 — que determina que deve ser garantido o direito a oportunidades e tratamentos iguais no emprego, sem discriminação salarial de género.

Mas começam a ser dados os primeiros passos: em maio deste ano, o Banco Central Europeu decidiu estabelecer a meta de atingir uma quota de mulheres em cargos diretivos e em diferentes níveis entre 40% e 51% até 2026. Algumas destas medidas colocam a Europa Ocidental no topo da lista do mesmo relatório do Fórum Económico Mundial, sobre o tempo necessário para eliminar as desigualdades de género: 54 anos. A pior previsão vai para a região Ásia Pacífico, onde faltam 163 anos para atingir a igualdade de género.

14.11.19

O dilema de ser feminista e ter vontade de mandar certas mulheres dar uma volta

Patrícia Reis, in Sapo.pt

Ser lixada por uma mulher que quer apenas ser just one of the boys [um dos rapazes] é uma coisa que me perturba e, ao fim de 31 anos de vida profissional, não há maneira de aceitar que assim seja.

Paridade salarial? Promoção de carreiras? Divisão de trabalho em casa? Com os filhos? Sim, e ainda liberdade de acção e de discurso. Tudo isto é uma causa, tudo isto significa que, por ser necessário manter a causa, ainda há muito que fazer. Na semana passada, surgiram uma série de artigos no jornal Público sobre a disparidade salarial entre homens e mulheres.

Nos últimos 54 dias do ano, as mulheres em Portugal trabalham à borla. Porque a disparidade está a reduzir, mas ainda não é suficiente. Portanto, para que não haja dúvidas, sou feminista, como tantas outras mulheres e homens, porque não entendo que o género defina qualquer superioridade. Ao longo da minha vida profissional – e pessoal, já agora acrescento por ser rigorosamente verdade – tenho visto e vivido situações infelizes com homens. E com mulheres.

Há umas semanas livrei-me de uma destas mulheres a que chamo “machistas” e que são tudo aquilo que me repugna: incapazes de serem mulheres por inteiro comportam-se como homens sempre que podem e, numa posição de liderança ou de poder, diminuem qualquer acção de uma outra mulher. É muito enervante. E, pior ainda, os homens à sua volta pareciam viver pacificamente com estas atitudes. O que importa se ela trata mal as outras mulheres? Deve ter sido com este desdém que alguns homens à volta da mesa onde nos reunimos há semanas pensaram no assunto, se é que pensaram no assunto. O cenário profissional é intrincado e complexo e são muitos os sapos que temos de engolir, para usar essa expressão que me parece bastante leve, mas tudo bem, diremos que são sapais inteiros que somos obrigadas a engolir porque a vida real é mesmo assim, não é para princesas. Com esta realidade, eu vivo de forma confortável, estou habituada.

Ser lixada por uma mulher que quer apenas ser just one of the boys [um dos rapazes] é uma coisa que me perturba e, ao fim de 31 anos de vida profissional, não há maneira de aceitar que assim seja. Portanto, há umas semanas livrei-me de uma mulher com estas características, uma mulher que na verdade, repito, não sabe nada sobre ser mulher e que despreza as outras mulheres, que as considera menores, e que é capaz de manter uma cena de sedução permanente com os homens à sua volta, sobretudo aqueles que ela entende que têm um poder maior ou significativo para o futuro que ela projectou para si própria. Desejei-lhe sorte e fui à minha vida. Foi um alívio imenso e pensei que a vida continua e que, preferencialmente, não teria encontros destes tão cedo. Ontem, numa reunião de trabalho, lá estava outra mulher-machista a olhar-me como se eu fosse... não vou terminar a frase, não vale a pena, vocês percebem. Desta vez consegui livrar-me da criatura em 15 minutos. Fiquei com pena da assistente que, pareceu-me evidente, é agredida várias vezes ao dia por uma mulher que deveria ser, hierarquicamente superior, mas solidária, justa e decente. Por uma vez, suspirei de alívio e pensei na minha imensa sorte, posso sempre dizer que não quero trabalhar com pessoas assim. Infelizmente é dizer que não quero trabalhar com algumas mulheres? Pois é. Faz de mim menos feminista? Nem por sombras.

6.11.18

Desigualdade salarial entre homens e mulheres não era tão baixa desde o início da década

Rita Marques Costa, in Público on-line

A diferença corresponde a 58 dias de trabalho pago. E é maior entre profissões mais qualificadas e com maior nível de escolaridade.

As mulheres ainda ganham 15,8% menos do que os homens. Uma diferença que corresponde a 58 dias de trabalho pago. É como se, a partir de 4 de Novembro, as mulheres deixassem de ser remuneradas pelo seu trabalho, enquanto os homens continuavam a receber o seu salário até ao final do ano. Esta diferença é referente à remuneração média mensal base e corresponde a menos 157,1 euros por mês para as mulheres.
Os dados, relativos a 2016, foram divulgados esta sexta-feira pela Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), a propósito do Dia Nacional da Igualdade Salarial, que se celebra a 4 de Novembro.

As melhores fotografias de 2018 pelos Siena International Photo Awards
Apesar das diferenças entre homens e mulheres, “a evolução do indicador de disparidade salarial de género ao longo dos últimos anos sugere uma melhoria relativa das condições de equidade salarial”, diz a CITE. Entre 2012 e 2016 a desigualdade entre géneros diminuiu 2,7 pontos percentuais. Entre 2015 e 2016 a redução foi de 0,9 pontos percentuais.

“É de notar que, ao contrário do que aconteceu em 2013 e em 2014 (anos em que a disparidade salarial baixou fundamentalmente devido à desvalorização dos salários dos homens), em 2016, ocorreu num contexto de valorização dos salários [de ambos os géneros], devendo-se ao facto de as remunerações médias mensais das mulheres terem crescido (1,9%), neste ano, de modo mais significativo do que as dos homens (0,7%)”, detalha a CITE em comunicado.
Mesmo assim, no contexto europeu, Portugal continua a “sobressair por apresentar níveis de disparidade salarial comparativamente elevados”.
A disparidade entre homens e mulheres é maior nos níveis de escolaridade e de qualificação profissional mais elevados.
No grupo dos trabalhadores com habilitações inferiores ao ensino básico corresponde a uma diferença de 11,1% na remuneração base. Entre quem tem uma licenciatura, a disparidade na remuneração média mensal é de 29,5%.

Ao nível dos “Quadros superiores”, a remuneração média mensal de base das mulheres ficava 26,2% abaixo da dos homens”. Nos níveis de qualificação profissional mais baixos, a diferença é menor. No grupo dos “Praticantes e aprendizes” as mulheres auferiram menos 4% do que os homens em 2016.

Partilhar a tarefa do cuidar é essencial para a igualdade de género
Segundo a CITE, “a incidência de baixos salários é mais acentuada entre as mulheres do que entre os homens: em 2016, 7,3% mulheres tinham rendimentos inferiores ao limiar de baixos salários, o que compara com uma incidência de 4,2% nos homens”.

“As causas para as disparidades salariais entre homens e mulheres são múltiplas, complexas e muitas vezes interligadas, podendo ser de natureza estrutural, social, cultural e económica”, clarifica a CITE.

28.5.18

Como brincar com bonecas agrava o risco de pobreza na velhice

Natália Faria, in Público on-line

Mais escolarizadas do que os homens, as mulheres portuguesas estão em maioria na engenharia, na medicina, na magistratura. Mas, seja qual for a profissão, ganham sempre menos. A desigualdade de género, que chega a atingir os 600 euros, inculca-se no jardim-de-infância e redunda depois numa maior exposição à pobreza.

Como é que o facto de nos jardins-de-infância as meninas brincarem com cozinhas e os meninos com foguetões contribui para a persistência de desigualdades penalizadoras para as mulheres e ajuda a que estas cheguem à velhice com reformas mais baixas e mais expostas ao risco de pobreza? A resposta está no estudo Igualdade de Género ao longo da Vida, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, que é apresentado esta segunda-feira e que conclui, por exemplo, que, logo à chegada ao mercado de trabalho, as mulheres entram a ganhar menos e são mais frequentemente contratadas em regimes precários, apesar de se apresentarem mais escolarizadas e com currículos mais completos.


“As diferenças salariais são brutais e absolutamente chocantes. Nas profissões menos qualificadas, chegam a ultrapassar os 200 euros, o que é muitíssimo porque estamos perante salários miseravelmente baixos”, adiantou Anália Torres, socióloga e coordenadora do estudo que aponta ainda disparidades salariais a rondar os 600 euros entre os representantes do poder legislativo e de órgãos executivos. À discriminação feminina no trabalho pago – as mulheres jovens têm um salário médio/hora de 5,8 euros, contra os 6,1 euros auferidos por eles – soma-se a sobrecarga nas tarefas do “cuidar”, da casa e dos filhos, às quais as mulheres dedicam o dobro do tempo.

A discriminação e a sobrecarga feminina nos cuidados com os filhos e com a casa não é novidade, num país que remunerou sempre mais a função produtiva do que a reprodutiva. O que este estudo faz é mostrar, quantificando, que as desigualdades se impõem logo no início da idade adulta, entre os 15 e os 29 anos de idade. Aliás, este estudo distingue-se dos restantes porque, ao longo de mais de 400 páginas, sete investigadores mediram as desigualdades no arco temporal 2000-2016, numa perspectiva comparada com outros países europeus, em três diferentes fases da vida: até aos 29 anos; entre os 30 e os 49 anos de idade, altura em que homens e mulheres (mas mais as mulheres) correm entre o trabalho pago e os cuidados da casa e dos filhos, por isso chamada “rush hour of life”; e, por último, na fase tardia da idade activa, entre os 50 e os 65 anos.
No momento da contratação a mulher é vista como potencialmente menos disponível para o trabalho. Mesmo que não haja filhos, a mulher será potencialmente mãe. É como se levasse uma marca na testa
Anália Torres

Apesar das gigantescas conquistas do século XX – em que, por via de inovações como a pílula contraceptiva, mas também de factores como a emigração masculina e até mesmo das guerras que empurraram as mulheres para fora do reduto doméstico e permitiram “a massificação dessa possibilidade de homens e mulheres terem vidas mais parecidas”, conforme sublinha Anália Torres –, as desigualdades de género persistem: “Quando comparamos os salários, as diferenças são brutais.” Na rush hour of life, as disparidades salariais agudizam-se: elas ganham em média 10,3 euros/hora e os homens 11,4 euros. E, a partir dos 60 anos de idade, ainda mais: elas ganham em média 8,93 euros/hora contra os 12,88/hora auferidos pelos homens. Logo, prossegue a investigadora, “é bom que reconheçamos que o problema existe e que não é só na Arábia Saudita”.

Engenheira, mas sem negligenciar a casa
A diferença é que as desigualdades se tornaram mais subtis, reproduzindo-se num pano de fundo onde subjaz uma “desvalorização simbólica e material daquilo que as mulheres fazem e produzem e das suas capacidades, especialmente na dimensão produtiva e no espaço público”. E, mais do que isso, tendem a agravar-se ao longo da vida. “Uma mulher começa [entra no mercado de trabalho] logo em desvantagem, chega à fase da ‘rush hour’, ganha menos e continua a ser duplamente penalizada com o dobro do trabalho não pago e depois, na fase tardia, abandona o mercado de trabalho, não porque ficou desempregada ou chegou ao fim da carreira contributiva, mas porque tem de tomar conta dos pais ou dos netos. Descontou menos, porque ganhou menos, e acaba por ter uma reforma muito baixa também porque teve uma carreira contributiva mais curta. Logo, a probabilidade de as mulheres caírem na pobreza – e mesmo que não caiam, de terem um ganho suficiente para terem uma vida com dignidade – é muito maior.”

Da educação ao trabalho, a desigualdade de género atravessa gerações
E onde é que tudo isto começa? No jardim-de-infância. “No pré-escolar, no recreio e na sala de aula, meninos e meninas vão ajustando o seu comportamento a uma visão normativa de género que também acentua diferenças e assimetrias entre géneros”, lê-se no estudo. “As pessoas tendem a achar que isso de haver brinquedos para meninas e brinquedos para meninos é uma questão menor, mas não: qualquer criança vai querer criar um sentido de pertença e adequar-se àquilo que acham que esperam dela, a assumir o seu papel em função do estereótipo. E se a mensagem que lhe passam vai no sentido de que o natural é que as meninas brinquem com cozinhas e com bonecas ela interioriza e incorpora, consciente ou inconscientemente, a ideia de que é natural serem elas a ocupar-se das tarefas domésticas, mesmo que aspirem a ser engenheiras ou físicas”, explica Anália Torres.
Não surpreenderá tanto assim a constatação de que, entre os 15 e os 29 anos, Portugal bata, juntamente com Espanha, o recorde da assimetria entre o tempo que eles e elas investem no trabalho do cuidar – da casa e dos filhos: elas dedicam em média 32 horas por semana à casa e à família e eles apenas 17 horas. E esta aculturação adquirida na infância revela-se igualmente no momento de contratação para um emprego.
“Em circunstâncias de igualdade de currículo, homens e mulheres contratam preferencialmente homens. Apesar de elas chegarem ao mercado de trabalho mais escolarizadas e mais preparadas do que eles, no momento da contratação a mulher é vista como potencialmente menos disponível para o trabalho. Mesmo que não haja filhos, a mulher será potencialmente mãe. É como se levasse uma marca na testa, enquanto o homem, mesmo tendo família, é encarado como alguém mais disponível porque tem um background de apoio, quase sempre uma parceira, para lhe fazer o trabalho doméstico.”

Mulheres correm mais no meio da vida
Isto ocorre apesar de a mobilidade educacional ascendente ser em Portugal “fantástica”. Sobretudo para elas. “Somos dos países da Europa que têm mais mulheres cientistas e em áreas como a informática e a matemática. E a maioria dos médicos não são médicos, são médicas. A maioria dos juízes não são homens, são mulheres. Ainda assim, vive-se essa contradição brutal entre o que é o desempenho objectivo das mulheres no mercado de trabalho e uma certa inércia acerca da imagem do que é uma mulher”, precisa a coordenadora da Unidade de Sociologia do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, para voltar ao tema da disparidade salarial: “É admissível que uma engenheira, por exemplo, ganhe menos 600 euros do que um engenheiro? Não é.”

No escalão etário seguinte, as portuguesas com filhos destacam-se por uma taxa de empregabilidade acima da média europeia: 80%, contra os 70% da União Europeia a 27. E, ainda assim, elas continuam a dedicar 18 horas por semana a cuidar da casa, contra as oito deles. Quanto ao cuidar da família, sobretudo filhos, a disparidade atenua-se ligeiramente nesta fase: eles passam 10 e elas 16 horas por semana. Na prática, “elas passam a vida a correr entre o trabalho e a casa”. “E como a mulher ganha efectivamente menos do que o homem, acaba também por achar normal assumir mais responsabilidades em relação à casa e aos filhos. Se o casal se dá bem, menos mal. Agora, se daí a alguns anos se separam, ela, que ficou agarrada e não foi promovida profissionalmente, fica prejudicada, enquanto ele está muito mais à vontade em termos de recursos.”
Esta divisão de papéis não é imperativo biológico nem algo a que o país esteja condenado. Como inverter o cenário? “Valorizando a dimensão do cuidar”, opina Anália Torres. “Mesmo em países como Portugal, que se destaca no contexto europeu pela ampla cobertura dos equipamentos de apoio à segunda infância, o aumento da participação masculina no cuidar, da casa e família, tem ainda investimento social e político a ser feito com o objectivo de promover a igualdade de género”, sugere o estudo. Na Suécia, por exemplo, a educação sexual chegou às escolas em 1958. “Isto ajuda a perceber por que é que os suecos têm indicadores de igualdade melhores do que os nossos”, reforça a socióloga.

Empurradas para os netos
Voltando ao caso português, quando o olhar dos investigadores se foca no grupo dos 50 aos 65 anos de idade, o que sobressai é que as mulheres abandonam mais precocemente o mercado de trabalho. “Quase um quinto das mulheres está nesta fase da vida principalmente dedicada às responsabilidades familiares”, precisa o estudo. Quando se poderia esperar que, emancipados os filhos, as mulheres poderiam reinvestir nos seus projectos profissionais, a realidade puxa-as para cuidar dos ascendentes idosos ou dos netos, o que desemboca numa taxa de emprego entre os 50 e os 64 anos de idade que não vai além dos 53,2%, no caso das mulheres portuguesas (64,4%, no caso dos homens).
É certo que “a pressão para sair no mercado de trabalho por exigências familiares “não é sentida por todas as mulheres da mesma forma”. As que passaram pela universidade, por exemplo, tendem a manter-se nos seus empregos durante mais tempo. Porquê? “São situações que podem corresponder a salários mais elevados e à externalização da prestação de cuidados.” Em média, porém, numa geração bastante menos escolarizada do que a juventude, o que prepondera é uma disparidade salarial entre eles e elas que se traduz no facto de elas ganharem em média 9,85 euros por hora contra os 12,19 euros auferidos por eles.

Automatização e crescimento tecnológico agravam desigualdade entre géneros
Tudo conjugado, chega-se ao fim da idade activa com um marcado aumento do risco de pobreza que “é mais penalizador para elas”, apesar das melhorias dos últimos anos: em 2005 o risco de pobreza das mulheres portuguesas nesta fase da vida era de 30,5%, em 2015 esse valor baixou para os 26%. E, tal como no jardim-de-infância, são elas quem mais se dedica à cozinha e às tarefas do cuidar. Quando se trata da família, por exemplo, elas despendem nisso 22 horas por semana e eles apenas seis. São 16 horas de diferença. Um recorde europeu.

9.3.18

Portuguesas ganham em média menos 17,5 cêntimos por hora que os homens

in o Observador

Por cada euro que os homens ganharam em 2016, por uma hora de trabalho, as mulheres receberam apenas 82,5 cêntimos. As desigualdade salarial em Portugal agravou-se nos últimos anos.

As mulheres portuguesas com mais de 65 anos ganham menos 43,4% do que os homens, avança o Público. Portugal posiciona-se assim no terceiro lugar da tabela de diferenças salariais mais elevadas da Europa, a seguir ao Chipre e à Espanha. É o país onde a diferença salarial entre homens e mulheres mais se agravou nos últimos anos.

Ainda que em Portugal a participação das mulheres no mercado de trabalho seja equiparada “aos países europeus mais igualitários em termos de género”, o mesmo não se reflete nas condições económicas das portuguesas que continuam afastadas dos cargos de liderança. Estas conclusões podem ser lidas num dos capítulos do livro Desigualdades Sociais — Portugal e a Europa, das investigadoras Sandra Palma Saleiro e Catarina Sales de Oliveira do

Também os dados lançados na quarta-feira pelo Eurostat demonstram que as trabalhadoras portuguesas ganham, em média, 82,5 cêntimos por hora, ao passo que os homens ganham um euro para o mesmo tempo de trabalho. Uma diferença de 17,5 cêntimos que fica acima da média de 16 cêntimos a menos que as mulheres recebem a nível europeu.

Apesar de não se encontrar entre os piores no ranking europeu do gender pay gap — ou de diferenças salariais entre homens e mulheres — destaca-se por ter sido o país onde este indicador mais se agravou: entre 2011 e 2016 aumentou 4,6 pontos percentuais contra uma média europeia de desagravamento em 0,6 pontos percentuais.

Diferenças na escolaridade e áreas vocacionais
As desigualdades entre homens e mulheres vão muito para lá dos salários: em 2016, 20,4% das mulheres tinham o nível superior contra apenas 14,9% homens. Entre 2003 e 2015 aumentou o número de mulheres a fazer doutoramentos, pelo que Portugal se destaca no que ao número de investigadoras diz respeito: 44% contra uma média mundial de apenas 28,4%. Contudo as mulheres permanecem “em maior número na população analfabeta”.

67,4% das mulheres trabalham a tempo inteiro face a 74,2% dos homens e as assimetrias são claras: se as mulheres se fazem representar mais em profissões ligadas ao cuidado e trabalho com pessoas dependentes (serviço social, educação, saúde) é certo que os homens dominam nas áreas tecnológicas, da construção ou dos transportes.

8.3.18

Portuguesas com mais de 65 anos ganham menos 43,4% do que os homens

Natália Faria, in Público on-line

Por cada euro pago aos homens em 2016, as mulheres portuguesas receberam apenas 82,5 cêntimos, aponta o Eurostat. Mas as desigualdades de género em Portugal também se revelam no facto de, entre os 18 métodos contraceptivos existentes, apenas um ser totalmente masculino.

As mulheres portuguesas com mais de 65 anos ganham menos 43,4% do que os homens. É a terceira diferença salarial mais elevada da Europa, a seguir ao Chipe e à Espanha, como sublinham as investigadoras Sandra Palma Saleiro e Catarina Sales de Oliveira, num capítulo sobre desigualdades de género inserido no livro Desigualdades Sociais – Portugal e a Europa, lançado ontem para assinalar os dez anos do Observatório das Desigualdades.

Conclusão imediata: “A participação das mulheres no mercado de trabalho, que equipara Portugal aos países europeus mais igualitários em termos de género, não se reflectiu equitativamente nas condições económicas” das portuguesas que continuam arredadas das esferas de liderança e de poder. E as estatísticas divulgadas ontem pelo Eurostat, para todas as faixas etárias, reforçam este tese ao mostrarem que as trabalhadoras portuguesas ganham em média 82,5 cêntimos por cada euro que um homem ganha por hora. É uma diferença de 17,5 cêntimos, acima dos 16 cêntimos pagos a menos às mulheres na média europeia.
Pior: apesar de Portugal não estar entre os piores no ranking europeu do chamado gender pay gap, destaca-se por ter sido o país em que esta desigualdade salarial mais se agravou. Entre 2011 e 2016, aumentou 4,6 pontos percentuais, contra uma média europeia de desagravamento em 0,6 pontos percentuais no mesmo arco temporal.

Voltando ao estudo, as investigadoras do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) do Instituto Universitário de Lisboa levaram a análise das desigualdades persistentes entre homens e mulheres muito além das diferenças salariais. Começando pela escola, as investigadoras recuperam estatísticas de 2016 para lembrar que 20,4% das mulheres tinham o nível superior face a apenas 14,9% dos homens. Entre 2003 e 2015, o número de mulheres a fazer doutoramento aumentou 15%. Não surpreende assim que Portugal se destaque positivamente, ao somar uma elevada percentagem de investigadoras (44%), superior à média mundial de apenas 28,4%. Esta é uma nota positiva. A negativa é que são ainda as mulheres “quem permanece em maior número na população analfabeta, num claro efeito geracional” que remete para um passado “em que o privilégio da educação era concedido aos rapazes”. Por outro lado, insistem, “o forte aumento das habilitações das mulheres ainda não corresponde a uma melhoria equitativa das suas condições de vida, nomeadamente na esfera laboral”.

O forte aumento das habilitações das mulheres ainda não corresponde a uma melhoria equitativa das suas condições de vida, nomeadamente na esfera laboral

Sandra Saleiro e Catarina Oliveira
Num mercado de trabalho em que 67,4% das mulheres trabalham a tempo inteiro face a 74,2% dos homens, há assimetrias claras nas áreas vocacionais: as mulheres fazem-se representar mais nas profissões ligadas ao cuidado e ao trabalho com pessoas dependentes, como o serviço social, a educação e a saúde, os homens dominam nas áreas tecnológicas, da construção ou dos transportes, áreas com remunerações mais elevadas e com mais procura. Mudar esta visão dicotómica entre homens e mulheres beneficiaria ambos, segundo as investigadoras. Isto porque estes estereótipos de género afastam os homens de profissões socialmente representadas como femininas: em 2016, não chegavam a 1% os homens a trabalhar como educadores no ensino pré-escolar.

Pilula também traduz desigualdade
Quanto aos tectos que impedem as mulheres de ascender a cargos de chefia, o estudo percorre alguns dos passos dados para os derrubar: em 2006 foi aprovada a lei da paridade ao nível político que ajudou a que, em 2016, as mulheres representassem já 34,8% do Parlamento nacional (79 deputadas eleitas em 2016) e a que existam hoje dois entre os cinco partidos mais votados liderados por mulheres. Ainda assim, apenas 7,5% dos municípios têm uma liderança feminina. Mais recentemente, em Junho de 2017, foi aprovada a lei da paridade nos cargos de direcção para as empresas cotadas em bolsa, empresas do sector público e administração directa e indirecta do Estado.

A lente do género é hoje uma lupa sobre o mundo
Visíveis são também as diferenças na esfera doméstica e no uso do tempo pessoal, com diferentes estudos a concluírem que elas despendem em média o dobro do tempo dos homens na gestão da casa e no cuidado a dependentes. Ou seja, “os homens não passaram a participar na esfera familiar na mesma proporção que as mulheres na esfera profissional”.

Menos óbvias são as desigualdades que se escondem por detrás da “representação estereotipada dos corpos masculinos e femininos” que contribui para naturalizar as diferenças de papéis entre homens e mulheres na forma como são construídas a sexualidade e a reprodução. “A feminização do planeamento familiar é explícita quando verificámos que dos 18 métodos contraceptivos existentes apenas um é totalmente masculino — o preservativo”, notam Sandra Saleiro e Catarina Oliveira, para acrescentar: “O contraceptivo mais utilizado no nosso país é o de toma oral, ou seja, a pílula feminina, recaindo sobretudo sobre as mulheres a responsabilidade do planeamento familiar e sobre o seu corpo a contracepção, por vezes com consequências graves, sendo que o método mais usado não as protege contra as doenças sexualmente transmissíveis.” A própria despenalização do aborto, “marco simbólico dos direitos das mulheres”, é “igualmente reveladora das resistências à autonomia das mulheres em Portugal”, já que foi conquistado mais de 30 anos volvidos sobre o advento da democracia e Portugal foi “um dos últimos países europeus a fazê-lo”. O mesmo se poderá dizer da Procriação Medicamente Assistida, já que até à entrada em vigor da lei, em 2016, as mulheres só eram elegíveis quando casadas ou em união de facto, o que excluía, ou empurrava para outros países, mulheres solteiras e casais de lésbicas.
tp.ocilbup@airafn

20.6.16

Há limites para a desigualdade nos salários?

José Soeiro, in Expresso

Há quem entenda que as regras de exceção sobre os salários dos administradores da Caixa Geral de Depósitos, aprovadas na semana passada pelo Governo, são melhores que as anteriores. Mas mesmo que fossem, é isso que interessa? Ou o que importa é saber se este tipo de remunerações é justo e legítimo?

A decisão do Governo reacendeu um debate mais vasto sobre a desigualdade salarial e os limites às remunerações. António Costa falou na importância de pagar a estes gestores de acordo com “os valores que se praticam no mercado”. A esquerda criticou e opôs-se à decisão. Alguma Direita, que acha normal que um gestor de um Banco ganhe 200 vezes mais que um trabalhador da mesma instituição (são as leis do mercado, alegam...), tentou apanhar a boleia das críticas. Mas de forma inconsequente e até oportunista. Na verdade, se na sua opinião não é razoável esta desigualdade na Caixa, por que a aceitam noutros bancos ou empresas privadas? Por exemplo: é aceitável que na Sonae, uma empresa que teve mais de 1000 milhões de faturação e 30 milhões de lucro so no primeiro trimestre deste ano, um gestor ganhe 90 vezes mais que um trabalhador, que é quem produz a riqueza da empresa e a quem se paga menos de 600 euros por mês para funções peníveis e desgastantes? Ou que na Efacec essa diferença seja de 60 vezes?

Portugal é um dos países com maior desigualdade social da Europa e tem taxas de pobreza assalariada acima dos 10%. Ao mesmo tempo que nos últimos anos se multiplicaram salários milionários para poucas centenas de gestores, um décimo dos trabalhadores ganha tão pouco que, mesmo tendo emprego, não consegue sair do limiar de pobreza. Limitar a diferença entre salários é uma forma de combater esta ofensa. Se o salário de um gestor não pudesse ser mais do que x vezes o do trabalhador da mesma empresa, isso seria uma forma de os salários mais baixos subirem e de os mais altos terem algum limite.

Na Suíça, em 2011, mais de cem mil cidadãos propuseram um referendo sobre este assunto. A proposta era que numa empresa ninguém pudesse ganhar num ano menos que o salário mensal mais alto. Ou seja, nenhum salário deveria ser mais do que 12 vezes o salário mais baixo pago na mesma empresa. O projeto, que foi considerado constitucional e legítimo, não se transformou em lei, mas lançou um debate importante que, na Europa e não só, está longe de se encontrar concluído.

Os defensores dos salários ilimitados invocam normalmente três argumentos para se oporem a uma medida deste tipo.

O primeiro é a necessidade de remunerar a competência. Porém, como é sabido, foram os gestores privados com salários e prémios milionários quem afundou o sistema financeiro português. Para os que achassem que remunerações principescas eram indicador de competência (nomeadamente para gerir a Caixa Geral), estamos conversados.

O segundo argumento é o da soberania do mercado: o que deveria definir o preço a pagar pelo exercício de determinada função seria a pura lei da oferta e da procura. Sucede que o mercado, como se sabe, não é democrático, não tem critérios de justiça e não é racional. Além de frequentemente resultarem de mecanismos de influência questionáveis e de contribuírem para a desigualdade, os salários e prémios abusivos canibalizam as receitas das empresas e estimulam comportamentos de risco dos gestores que, frequentemente, põem em causa a própria sustentabilidade daquelas.

O terceiro argumento é o da “liberdade económica”: o Estado interferir nesse tipo de matérias seria um atentado à liberdade da iniciativa privada. Ora, como se sabe, toda a atividade económica, pública e privada, é regulada pelo Estado, desde o funcionamento das assembleias de acionistas até ao valor do salário mínimo. A que propósito não poderia a democracia ter uma palavra a dizer sobre o limite das desigualdades salariais?

Se o combate à desigualdade não é só uma expressão bonita para dias de festa, então ele deve traduzir-se em decisões e regras concretas. Claro que um sistema de impostos progressivos, serviços públicos universais e a redistribuição de rendimento através de transferências sociais são instrumentos estruturantes desse combate. Mas por que não atacar também uma das principais fontes do problema, que é a desigualdade no salário?

24.4.15

Mulheres ganham mais do que os homens... em nove empregos

por DN.pt

De 342 empregos analisados, em apenas nove as mulheres ganham mais do que os homens nos EUA. Há ainda outra área onde os ordenados delas tendem a ser superiores: a pornografia.

Os dados dos Census divulgados nos EUA, relativos a 2013, demonstram o que já não é uma novidade: na maioria dos empregos, os homens ganham mais do que as mulheres. O que os novos números revelam são quais os empregos em que as mulheres até conseguem superar o sexo masculino a nível salarial: num universo de 342, apenas em nove isso se verifica.

Entre produtores e diretores, as mulheres ganham uma média de 66 226 dólares por ano (cerca de 61 mil euros), enquanto os homens ficam-se pelos 62 368 (cerca de 58 mil euros), segundo os dados dos Census, publicados pelo Washington Post. A maior diferença é mesmo nestas profissões, sendo também as que as mulheres ganham mais, entre as que superam os homens.

Seguem-se as responsáveis pela limpeza de veículos e equipamentos: 24 793 dólares por ano (cerca de 22 mil euros ) e os homens 23 605 dólares, uma ligeira diferença, que vai diminuindo nas próximas profissões da lista.As grossistas e retalhistas ganham 42 990 dólares (cerca de 40 mil euros) e os homens 41 619 dólares (cerca de 39 mil euros). Os agentes de segurança responsáveis pela revista dos passageiros nos transportes, as mulheres recebem 41 751 dólares (cerca de 39 mil euros) e os homens 40 732 dólares (cerca de 38 mil euros).

As assistentes sociais recebem um salário anual de 35 766 dólares (cerca de 33 mil euros) e os homens 34 967 euros (32 mil euros). Os professores de ensino especial ganham 46 932 euros (cerca de 44 mil euros) e as mulheres 47 378 euros por ano. As gestoras de transporte, armazenamento e distribuição recebem um salário médio anual de 52 259 dólares (cerca de 49 mil euros) e os homens 52 017 dólares (cerca de 48 mil euros).

Nos salários mais baixos desta lista específica, as responsáveis pela lavagem da loiça ganham 17 322 dólares por ano (cerca de 16 mil euros) e os homens 17 302 dólares. São os profissionais de aconselhamento que têm uma diferença menor no vencimento: os homens recebem 42 299 dólares/ano (cerca de 39,2 mil euros) e as mulheres apenas levam mais 70 dólares para casa.

A título de curiosidade e fora dos números do Census, há uma outra profissão em que as mulheres ganham mais do que os homens: as atrizes pornográficas. Segundo o Hollywood Reporter, as mulheres podem ganhar 200 mil dólares (cerca de 184 mil euros) ou mais. No entanto, lê-se que os homens têm normalmente carreiras mais longas.

5.3.15

Diferença de salários entre homens e mulheres aumentou em Portugal

in Público on-line

Mulheres ganham menos 13% do que os homens. Entre 2008 e 2013, Portugal registou o maior aumento da União Europeia na disparidade salarial entre homens e mulheres, de 3,8 pontos, para os 13%, segundo o Eurostat.

A disparidade salarial entre homens e mulheres diminuiu 0,9 pontos percentuais na União Europeia (UE) para os 16,4% entre 2008 e 2013, mas Portugal registou o maior aumento, de 3,8 pontos, para os 13%, segundo o Eurostat. O gabinete oficial de estatísticas da UE revela ainda que, em 2013, a Eslovénia era o país com menor disparidade salarial entre géneros em 2013 (3,2%), com a Estónia a ocupar o outro extremo da tabela, com 29,9%.

A disparidade salarial entre homens e mulheres representa a diferença de remuneração horária bruta entre os trabalhadores homens e mulheres em percentagem. Face a 2008, a disparidade salarial aumentou em 2013 em nove Estados-membros da UE, com Portugal à cabeça (3,8 pontos percentuais de 9,2% para 13%), seguindo-se a Espanha (3,2 pontos de 16,1% para 19,3%), a Itália (2,4 pontos de 4,9% para 7,3%) e a Estónia (2,3 pontos de 27,6% para 29,9%).

No período considerado, as principais descidas verificaram-se na Lituânia (-8,3 pontos percentuais, passando de 21,6% em 2008 para 13,3% em 2013), na Polónia (-5 pontos, de 11,4% para 6,4%), em Malta (-4,1 pontos de 9,2% para 5,1%), na República Checa (-4,1 pontos de 26,2% para 22,1) e no Chipre (-3,7 pontos de 19,5% para 15,8%).

Em 2013, a disparidade salarial entre géneros era menor do que 10% na Eslovénia (3,2%), em Malta (5,1%), na Polónia (6,4%), em Itália (7,3%), na Croácia (7,4%), no Luxemburgo (8,6%), na Roménia (9,1%) e na Bélgica (9,8%). Acima de uma diferença de 20% estão a Estónia (29,9%), a Áustria (23%), a República Checa (22,1%) e a Alemanha (21,6%).

O Eurostat divulga estes dados no âmbito do Dia Internacional da Mulher, que se assinala no domingo.

2.2.15

Fosso diminuiu, mas mulheres ainda recebem menos 20% do que os homens

por Ana Margarida Pinheiro, in Dinheiro Vivo

Em 2011, o salário das mulheres representava 77,6% o dos homens. No ano passado, representava já 79,6%

Portugal tem merecido os alertas de Bruxelas por causa da diferença entre o que recebem os homens e as mulheres. Para trabalhos idênticos, qualificações semelhantes e funções da mesma responsabilidade, as mulheres portuguesas são as que recebem valores mais pequenos em relação aos homens.

O salário das mulheres é ainda, de acordo com os dados do Gabinete Estratégico e Estudos do Ministério da Economia (GEE), 20,4% inferior ao recebido pelos homens. Quer isto dizer que, por exemplo, se um homem receber mensalmente 700 euros, a mulher deverá ter um salário de apenas 557,2 euros.

A diferença ainda é notória ao fim do mês. No entanto desde 2011, este fosso tornou-se mais pequeno e permitiu alguma recuperação salarial para as mulheres portuguesas, também pela via de uma queda do que agora é pago aos homens. Em 2011, a mulher recebia, em média, 77,6% do salário do homem e no ano passado este valor passou para 79,6%.

Se a repartição tivesse revertido apenas para o lado das mulheres, isto significaria que para um salário de 700 euros pago a um homem, a mulher teria recuperado em média de 14 euros mensais nos últimos três anos.

Mas não foi isto que aconteceu: o fosso diminuiu também pela diminuição da remuneração paga aos homens. O GEE mostra que a remuneração base média mensal era, em 2011, de 1051,9 euros para os homens e de 842 euros para as mulheres. Em 2014, o salário pago a um homem caiu para 1026,2 euros, enquanto o da mulher avançou quatro euros para 846,5 euros.

10.3.14

Governo defende combate à desigualdade salarial entre homens e mulheres

in Jornal de Notícias

O Governo determinou a adoção de "medidas específicas" pelas empresas para contrariar a desigualdade salarial "penalizadora para as mulheres" e promover uma "efetiva igualdade de género", segundo uma resolução publicada, esta sexta-feira, em "Diário da República".

"Os dados que vão sendo conhecidos revelam que a disparidade salarial entre mulheres e homens continua a ser uma realidade persistente, difícil de combater, por assentar em desigualdades estruturais resultantes da diferente participação, ao longo da história, de homens e mulheres no mercado de trabalho", sublinha o Governo.

Na resolução, adotada em Conselho de Ministros na quarta-feira e agora publicada, o Governo afirma que "é necessário intensificar medidas específicas que possam contrariar a tendência histórica de desigualdade salarial penalizadora para as mulheres".

Esta matéria será inserida no debate da concertação social sobre o relatório referente às diferenciações salariais por ramos de atividade, adianta a resolução, publicada na véspera de se assinalar o Dia Internacional da Mulher.

Já as empresas do setor empresarial do Estado devem promover, de três em três anos, a elaboração de um relatório, a divulgar internamente e a disponibilizar no respetivo sítio na Internet, sobre as remunerações pagas a mulheres e homens, tendo em vista "o diagnóstico e a prevenção de diferenças injustificadas naquelas remunerações".

Na sequência destes relatórios, as empresas devem tomar "medidas concretas", a integrar nos planos para a igualdade, para acabar com as situações de desigualdade salarial detetadas.

O Governo recomenda ainda às empresas privadas com mais de 25 trabalhadores que elaborem "uma análise quantitativa e qualitativa" das diferenças salariais entre mulheres e homens.

Na sequência desse diagnóstico, as empresas devem conceber uma estratégia para correção de eventuais diferenças injustificadas naquelas remunerações.

Por outro lado, a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego deve disponibilizar às empresas, através da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, uma ferramenta eletrónica que possibilite que permita "medir o grau das diferenças salariais existentes nas empresas e identificar situações concretas de diferenciações salariais entre mulheres e homens que não podem ser explicadas por fatores objetivos".

Disparidade salarial de 18,5%

Os membros do Governo responsáveis pelas áreas da Igualdade de Género, das Finanças, da Administração Pública, do Desenvolvimento Regional e do Emprego devem adotar as iniciativas necessárias para que estas medidas sejam concretizadas.

Segundo dados do Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia, em 2012, a remuneração média mensal das mulheres correspondia a 81,5% da dos homens, pelo que a disparidade salarial se traduzia em 18,5% em desfavor das mulheres.

No conjunto da União Europeia, entre os 26 países para os quais existem dados, 13 apresentam maiores diferenças salariais do que Portugal, e 12 têm diferenças menores.

Portugal tem uma posição mais favorável do que, por exemplo, a Estónia, a Alemanha, e a Espanha, que apresentam uma diferença salarial de, respetivamente, 30%, 22,4% e 17,8%.

6.3.14

Mulheres trabalham mais 65 dias para ganharem o mesmo que os homens

in Jornal de Notícias

Para conseguirem ganhar num ano o mesmo que os homens, as mulheres portuguesas têm de trabalhar mais 65 dias, até 6 de março, data escolhida este ano para assinalar o Dia Nacional da Igualdade Nacional.

Tal como no ano passado, as mulheres portuguesas continuam a ganhar em média menos 18% de remuneração de base que os homens, à semelhança do que se passa no resto da Europa, e esta diferença salarial aumenta (21,9%) quando se calcula o ganho.

"A óbvia falta de equilíbrio entre homens e mulheres na partilha das responsabilidades domésticas e familiares, assim como enraizadas tradições e estereótipos, continuam a condicionar a escolha", admite a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), em comunicado divulgado.

A comissão salienta que, atualmente, o fenómeno da diferença salarial entre homens e mulheres assume "predominantemente" uma natureza de discriminação indireta, tornando-o "tão difícil de identificar e corrigir".

As circunstâncias em que se observam maiores desigualdades salariais de género ocorrem, segundo a comissão, quando se comparam salários de diferentes categorias profissionais que, embora correspondendo a conteúdos funcionais distintos, são profissões de igual valor, tendo em conta o grau de experiência, de penosidade, de perigosidade, de duração, de formação e do grau de responsabilidade que exigem".

Para combater esta desigualdade salarial, a União Europeia instituiu o Dia da Igualdade Salarial que, em cada país deve representar o número de dias extra que as mulheres devem trabalhar num ano para atingirem o mesmo salário que os homens ganharam no ano anterior.

Em Portugal, este dia é celebrado a 6 de março, para lembrar que aos homens bastaria começarem a trabalhar neste dia para ganharem o mesmo que as mulheres, em média, auferem num ano.

Em Portugal, para assinalar o dia, a CITES vai disponibilizar na sua página da internet um inquérito de autoavaliação, através do qual as empresas podem avaliar o seu risco de desigualdade salarial.

"Este inquérito de auto-avaliação é a primeira parte de uma ferramenta informático de cálculo on line de disparidades salariais, que a CITE irá disponibilizar na sua página gratuitamente, a partir de junho de 2014", revelou a comissão à Lusa.

Segundo dados da Comissão Europeia, de outubro de 2012, em Portugal apenas 6% de mulheres ocupavam lugares nos conselhos de administração das empresas incluídas no PSI20, um número bastante abaixo da média europeia, que rondava os 13,7%. Nos lugares de presidente executivo e não executivo, a percentagem desceu para 0%.

Os dados revelaram também que as mulheres portuguesas representavam 5,4% nos lugares de diretores não executivos e 7,6% nos lugares de diretores executivos no conjunto das maiores empresas nacionais cotadas em bolsa, além das que compõem o PSI20.

2.2.13

Homens chegam a ganhar em média mais 800 euros do que as mulheres

Ana Cristina Pereira, Público on-line

Disparidades salariais entre sexos têm aumentado em Portugal, indica relatório Igualdade de Género em Portugal 2011.

Desengane-se quem julga que a desigualdade se atenua nas camadas mais escolarizadas. Os quadros superiores femininos ganham, em média, menos 801 euros do que os masculinos, indica o relatório Igualdade de Género em Portugal 2011.

Segundo o relatório da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, divulgado nesta quinta-feira, “a remuneração média mensal de base recebida pelas mulheres em 2010 foi de 801,81 euros e a dos homens 977,56”. Quer isto dizer que lhes pagam, em média, menos 175,75 euros por mês.

As diferenças notam-se dos mais baixos aos mais elevados níveis da hierarquia profissional: nos quadros superiores, a remuneração média de base feminina é 1725 e a masculina 2402; a diferença cresce quando se olha para os ganhos médios mensais: as mulheres levam, em média, 1972 euros para casa e os homens 2773.

Nos profissionais qualificados a diferença é de 800 para 922; nos não qualificados de 588 para 696.

“Em toda a economia da UE [União Europeia], as mulheres ganham, em média, cerca de 16% menos do que os homens”, refere o documento.

“Embora a generalidade das disparidades salariais entre homens e mulheres tenha decrescido na última década, em alguns países as disparidades salariais entre homens e mulheres a nível nacional têm aumentado, como é o caso de Portugal.”

9.7.12

“Diferença de salário entre homens e mulheres torna economia mais pobre”


Por Ana Rute Silva, in Público on-line

Quando a discrepância salarial não é justificada pela produtividade, um país perde dinheiro, afirma o professor e investigador José A. Tavares.

José A. Tavares, 46 anos, analisou os custos da discriminação salarial entre homens e mulheres, em conjunto com Tiago Cavalcanti, professor na Universidade de Cambridge. O professor associado da Universidade Nova de Lisboa, investigador do Centre for Economic Policy Research, em Londres, e membro do conselho científico da Fundação Francisco Manuel dos Santos, acredita que o aumento do desemprego e a pressão para baixar salários pode reduzir a desigualdade de ordenados, mas “pelas piores razões”. Ter uma economia com ordenado mínimo e igual para todos não é o modelo a seguir.

Na União Europeia as mulheres ganham em média menos 17,5% do que os homens. Quanto é que custa esta desigualdade?

O maior custo é o custo social associado à discriminação. São custos diários e comezinhos, como o facto de as mulheres terem uma proporção mais elevada das tarefas domésticas a seu cargo. Mas se falarmos a nível económico, de um ponto de vista macro, verificamos que há economias onde esses custos explicam grande parte da diferença de produtividade e de produto por trabalhador em relação a outros países, como os Estados Unidos. Essas são as sociedades que mais discriminam e não são, em geral, europeias. São sobretudo do Médio Oriente e algumas só não são pobres porque têm a bonança do petróleo.

Nos países onde hoje se verifica uma grande crescimento económico, como o Brasil e a China, detectaram alguma diminuição da desigualdade salarial?

Olhamos mais para experiências de longo prazo, mas o que se sabe é que os países emergentes têm em geral grandes taxas de criação de empresas. O Brasil é mais empreendedor do que os EUA. Países muito pobres da África subsariana são muito mais empreendedores do que o Japão. É uma reacção à falta de instituições de governo da sociedade. A boa notícia é que quando há mais empreendedorismo, há uma maior participação das mulheres. Numa sociedade desenvolvida, como a portuguesa, as mulheres são uma minoria de empreendedores. Nas menos desenvolvidas acaba por ser uma forma de emancipação.

Podemos dividir o mundo por blocos? Quanto mais desenvolvido menos desigualdade salarial?

A discriminação está associada a várias coisas, nomeadamente a questões culturais. Em geral, em países mais desenvolvidos há menos discriminação salarial. O empreendedorismo de que falámos pode até ser uma compensação dessa realidade, mas parcial. A verdade é que se pode explicar a mudança de atitude dos homens por questões de desenvolvimento. Ou seja, se o parceiro decide que não é apropriado a parceira trabalhar, isso implica um custo de rendimento para o casal. Se a economia é mais desenvolvida, o custo é mais alto.

Porque há um patamar de produtividade maior, conseguido por mais mulheres integradas no mercado de trabalho?

Ter uma pessoa em casa tem um maior custo de oportunidade. Mesmo que culturalmente uma sociedade seja inclinada a discriminar, felizmente à medida que a economia seja mais produtiva e rica, os agentes que discriminam pensam duas vezes. A cultura também é endógena. Se pensarmos na Primavera Árabe, por exemplo, na Tunísia, se as mulheres começarem a ter mais poder isso vai alterar a atitude da sociedade e tornará a economia mais robusta.

No estudo que fez com Tiago Cavalcanti concluiu que um aumento de 50% no desequilíbrio salarial reduz 25% o rendimento per capita. Como chegaram a esta conclusão?

O nosso modelo explica três variáveis: o crescimento, a natalidade e participação feminina. A discriminação é uma variável que não explicamos. Modelamos esta economia como se fosse a economia americana, ou seja, os dados que usamos como referência (como a taxa de juro ou de progresso tecnológico) são dos EUA. Tendo essa base, colectámos, por exemplo, o índice de discriminação de um país como o Egipto e colocámo-lo na simulação da economia americana. É como ter uma economia em tudo americana excepto na discriminação de género, que é a do Egipto. Resultado: altera-se o crescimento económico, a natalidade e a participação. A discriminação de género da Arábia Saudita, por exemplo, levaria uma economia como a americana a níveis de produto inferiores ao observado para esse país do Médio Oriente.

Como se posiciona Portugal face a outros países?

Portugal surge como um dos países em que a discriminação de género “explica” menos. E, de facto, se olharmos as duas consequências de discriminação de género no nosso modelo (baixa participação laboral feminina e alta fertilidade) não são características da nossa economia. Por outro lado, a nossa diferença de rendimento em relação ao país de referência, os Estados Unidos, é demasiado elevada para que um factor tão parcelar como a discriminação “conte grande parte da história”. Com a Espanha e a Itália é diferente, evidenciam maiores perdas com a discriminação, que explica uma parte substancial do seu menor produto per capita em relação aos Estados Unidos da América.

O ganho médio mensal das mulheres portuguesas corresponde a 79% do valor pago aos homens. Esta realidade prejudica o desenvolvimento económico do país?

Historicamente Portugal tem níveis de participação mais elevados do que países com o mesmo nível de desenvolvimento. Há a comparação clássica com a Espanha. São culturas semelhantes mas em Espanha a participação das mulheres é menos elevada. Nesse sentido, Portugal tem um menor custo de discriminação. O facto de a imigração ter sido mais intensa cá, ou a Guerra Colonial, podem ajudar a explicar esta diferença em relação a Espanha.

Há também dados que indicam que quanto mais qualificadas, maior é a desigualdade salarial face aos homens.

Tem também a ver com progressões de carreira, interrompida pela gravidez por exemplo. Essa desigualdade tem a ver com discriminação.

Portugal conseguiria ter uma economia mais robusta se diminuísse o gap salarial?

A diferença salarial relacionada com a produtividade (quer seja entre homens e mulheres, quer entre os trabalhadores em geral) faz parte do funcionamento geral da economia. O que chamamos de discriminação são diferenças que não têm a ver com produtividade. Ou seja, entre uma mulher e um homem igualmente produtivos, a mulher recebe um salário menor. Sempre que isto acontece, é o mesmo que deitar dinheiro à rua. Sempre que há uma diferença de salário sem diferença de produtividade a economia está a tornar-se mais pobre.

Que consequências práticas é que isso provoca?

Se uma mulher tem uma produtividade de 100 e só é paga a 50 e vive num país onde há muita discriminação, pensará duas vezes se quer trabalhar ou não. E ao não trabalhar está a diminuir o produto da economia. Esta mulher estava disposta a trabalhar por 100. Além, claro, das questões de motivação. Se ao longo dos anos, as mulheres verificam que a sua progressão não é a mesma dos homens, desmotivam-se.

O aumento do desemprego, a quebra de rendimento e a pressão para aceitar salários mais baixos podem fazer reduzir a diferença salarial em Portugal?

Pode atenuar-se pelas piores razões. A discriminação não deve ser encarada isoladamente. Se uma economia for feita só de pobres a desigualdade é mínima, mas não é esta a sociedade que queremos. Se tivermos uma economia onde todos ganhem o salário mínimo não há discriminação entre homens e mulheres, mas não é isso que queremos. É preciso equilíbrio.

Quando a retoma chegar, chegará mais para os homens?

A longo prazo, a boa notícia é que a diferença salarial tende a diminuir. As pessoas trabalham mais, há menos discriminação, logo há mais produtividade. Um trabalho muito interessante feito por uma economista da Universidade de Nova Iorque mostra que às vezes há choques culturais que mudam a discriminação. Quando os americanos participaram na II Guerra Mundial, as mulheres foram chamadas a participar. Os homens que observaram as suas mães irem para o mercado de trabalho durante a guerra discriminaram menos.