16.6.10

"O direito a não ser pobre"

in Diário de Notícias

No XI Encontro Nacional de Fundações, que discutiu “o problema da inclusão social e a melhor forma para o seu combate no actual contexto de crise económica”, Rogério Roque Amaro, do ISCTE, sugeriu que “o direito a não ser pobre” deve ser integrado na Constituição Portuguesa.

Interessante e muito pertinente esta questão. Mas de duvidosa prática quando implementada na sociedade real. Todos nós sabemos que muitos dos direitos constitucionais não passam de ?escritos sem vivência?, presos de tal forma ao documento em que se inserem que não conseguem ?fugir para a rua? onde estão as pessoas?Porquê? Todos sabem e todos fingem não saber.

Numa sociedade bem organizada, a distância entre ricos, classe média alta, classe média e pobres está mais ou menos visível e, quiçá, próxima. Neste momento da História das civilizações - que é uma réplica de muitos outros - os pobres estão cada vez mais pobres, a classe média diluiu-se e a riqueza encontra-se concentrada, na sua maior parte, nas mãos de gente corrupta e sem escrúpulos.

Como atrás foi dito, este não é um fenómeno novo. É mais um tempo de aproveitamento de alguns no interior do caos em que nos encontramos todos.

Embora esteja de acordo com a proposta de Rogério Roque Amaro, penso que existem motores mais eficientes do que o próprio sugere. Um deles, sobre o qual reflectirei hoje, é a educação/instrução.

Na medida da degradação dos costumes, a ?educação para todos?- tão apregoada pelos políticos - é uma fraude. Todos vão à Escola e nenhum aprende. Os programas são medíocres, as exigências nulas. E as crianças e jovens apercebem-se disso, fazendo o aproveitamento que mais lhes convêm.

Ora, há algum tempo, ouvi uma frase de uma mulher japonesa que conseguiu quebrar o circuito da pobreza em que a sua família vivia há décadas - ?Conhecimento é poder? - dizia ela. E lá estava, então, à frente de um grande laboratório de produtos químicos, após anos e anos de estudo e luta. Sofreu, quebrou barreiras e tabus, estudou até à exaustão e conseguiu o que almejava.

Repare-se que estou a falar de “estudar a sério”. Não é a brincadeira que vemos, todos os dias, nas medidas tomadas pelos nossos superiores no que concerne à Educação Pública.

Entretanto, e no meio de tanta confusão e da necessidade urgente de pessoas bem qualificadas, surge esta magnífica notícia: quem tiver 15 anos e não conseguir, através do estudo, ultrapassar a barreira do 8º ano, poderá seguir directamente para o 10º ano, após ser submetido a exame… Notícia interessante e muito conveniente para engrossar a fileira dos analfabetos com grau académico.

Continuamos no caminho errado. A política e os seus agentes não mostram ter vontade real de mudar. É vê-los no Parlamento aos gritos uns com os outros em vez de conjugar esforços numa luta sã que faça sair o País do impasse grave a que chegou.

E, um dos motores para essa saída é apostar na educação. Na verdadeira educação. Naquela que transforma as consciências abafadas em consciências críticas, que oferece ao País e ao mundo homens e mulheres, saídos das nossas Universidades, capacitados para gerir os destinos do povo de um tempo diferente e actual.

Olhemos os nossos deputados. Muitos deles nem profissão têm. Alguns só conhecem as matérias de que falam através dos debates televisivos, jornais, e/ou revistas mais ou menos sérias.

Como é possível mudar de rumo com esta gente? Eça de Queirós diria: eduquemo-los, eduquemo-los… Mas será que eles o querem?

Então, levem a instrução/educação das novas gerações a sério. Sem isso, o fantasma da pobreza não abandonará a nossa casa comum - o nosso País.

Ponto 2 - O mendigo, deitado no seu colchão de cartão, dormia o sono profundo dos justos. Transeuntes passavam evitando olhar aquele homem tranquilo, que sabia o segredo de dormir em paz. Eles tinham esquecido, há muito, o que isso era. Viviam demasiado agitados para conseguir algum momento de serenidade verdadeira. Os tempos eram de buscar riqueza para garantir lugares reservados nos salões dos políticos e dos ?nobres?. Então, esqueciam os filhos e os pais. Os primeiros eram colocados em creches, aulas de dança, escolas de futebol; os segundos em lares. Por vezes, um rebate de consciência a magoar, bem lá no fundo. E o sono que não vinha. Pobre mendigo! - afirmavam?com inveja.