30.7.13

Mães tiram menos tempo de licença

por Sónia Balasteiro, in SOL

Há cada vez mais mulheres a gozar o tempo mínimo previsto para a licença de maternidade: 42 dias. E cada vez mais mães partilham a licença com os pais. Aliás, é isso mesmo que fará Assunção Cristas – a primeira ministra na história do país (e apenas a terceira da UE) a tornar-se mãe em pleno exercício de funções, com a tutela da Agricultura e do Mar.
Segundo dados da Segurança Social, a que o SOL teve acesso, nos últimos cinco anos, o número de mães trabalhadoras a ficar em casa apenas 42 dias após o parto quase duplicou: só nos primeiros seis meses deste ano, 245 mulheres optaram por esta licença mais curta, quase tantas como em todo o ano de 2008. O fenómeno intensificou-se a partir de 2010, ano em que quase meio milhar de mães ficou em casa com os filhos apenas seis semanas.

A par desta situação, verificou-se também um aumento do número de pais que substituem as mães, ficando eles em casa. Este ano, por exemplo, e apenas até Junho, já 704 homens ocuparam o lugar das progenitoras – um número muito superior ao verificado nos 12 meses de 2008, em que 590 o fizeram. Foi a partir de 2009 que mais homens começaram a ficar sozinhos com os filhos (1290). A grande parte opta por estar quatro meses e receber o ordenado por inteiro.

Licenças partilhadas dispararam

Devido às alterações à lei, tem aumentado também a quantidade de licenças partilhadas entre os dois progenitores. Em 2009, ano em que foi introduzida essa opção, 6591 famílias aderiram à ideia.

Um número largamente ultrapassado só nos primeiros seis meses deste ano, em que a Segurança Social já atribuiu 8569 licenças partilhadas. Estas podem durar quatro ou cinco meses, tendo depois um bónus de mais um mês. Ou seja, o apoio social é dado durante cinco ou seis meses, sendo o último a escolha da maioria dos casais.

Mães devem ficar quatro meses

A verdade é que a opção de diminuir o tempo dispensado para estar com os filhos ou fazer-se substituir pelo pai não é pacífica: uns consideram que as mães devem ficar o máximo de tempo com os bebés, outros defendem a liberdade de escolha da mulher. Outros ainda lembram as dificuldades económicas do país que forçam as famílias a não poder abdicar do trabalho.

"Idealmente a licença de maternidade deveria ser pelo menos de quatro meses ou mais se a alternativa for creche", defende Maria do Céu Machado, directora do serviço de Pediatria do Hospital de Santa Maria, em Lisboa. Para a médica, mesmo no caso em que a licença é partilhada, a mãe deve ficar com o recém-nascido os primeiros três a quatro meses: "Por causa da amamentação e porque é mais difícil lidar com um bebé nos primeiros meses".

O pediatra Libério Ribeiro tem a mesma opinião. "A mãe deve ficar entre quatro a seis meses com o bebé, pois isso traz vantagens psicológicas, nutricionais e imunológicas", diz o clínico, considerando que uma criança amamentada com leite da mãe é muito mais resistente a gastroenterites e doenças infecciosas.

Já o pediatra Mário Cordeiro é um defensor acérrimo da licença partilhada. "Os pais deveriam ter dois meses em conjunto – os dois primeiros. Quando pensamos que uma pessoa trabalha 40 anos, 12 meses, e nas vantagens pessoais e sociais de construir pessoas emocionalmente equilibradas e estáveis, não seriam esses meses que perturbavam os 480 meses que trabalhamos ao longo de uma vida", diz.

E o médico Gomes Pedro considera que tem de se analisar caso a caso: "Não se pode ser simplista na avaliação do tempo que as mães devem ficar em casa. Depende muito da rede que está estabelecida". Para o pediatra, neste momento de crise, o período que a mãe pode disponibilizar para o filho depende da vulnerabilidade do emprego existente em cada lar, No entanto, também defende que, idealmente, a mãe deve estar o maior tempo possível com o bebé.

Aliás, é isso mesmo, políticas sociais mais protectoras da maternidade, que reivindicam as associações de defesa dos direitos das mulheres. "As licenças em Portugal são bastante inferiores a países como Inglaterra ou como a Alemanha", nota Regina Marques, do Movimento Democrático de Mulheres (MDM), considerando que, além disso, no país há uma forte pressão sobre as mães: "Há muitos casos em que os contratos, quando uma mulher engravida, não são renovados, e isto num contexto em que o trabalho é vital para as famílias".

Para a responsável da MDM, o facto de mulheres como Assunção Cristas gozarem licenças mais curtas tem alguns riscos: "Esperamos que não sirva aos patrões para pressionar as mulheres para voltarem mais cedo ao trabalho", alerta, acrescentando: "A ministra é uma excepção porque dispõe de meios que lhe permitem escolher o tempo e a forma como quer gozar a licença".

Também Ana Cansado, da União de Mulheres Alternativa e Resposta – UMAR, o facto de Assunção Cristas optar por menos tempo de licença de maternidade é "um mau exemplo para a generalidade das mulheres".

"Os estudos comprovam que o tempo passado entre a mãe e o bebé é muito importante. E em Portugal, as mulheres adiam ainda a maternidade para não perderem prestígio nas suas carreiras", lembra a activista.

Mais governantes deram à luz em funções

Catarina Vaz Pinto, vereadora da Câmara de Lisboa, que ficou grávida quando era Secretária de Estado da Cultura, em 1998, admite que as mulheres que ocupam certos cargos políticos têm mais poder para gerir o tempo, mas também maior responsabilidade de voltar mais cedo ao trabalho pelo lugar que ocupam.

Só gozou um mês e meio de licença, mas na sua opinião, as outras mulheres não devem regressar tão cedo. Para ela, é urgente que se lancem medidas para facilitar a possibilidade de as pessoas terem filhos e manterem a actividade laboral. Uma das soluções, lembra, seria a criação de locais para os bebés «nas empresas e instituições públicas». Vaz Pinto lembra o caso de um casal que conhece em que a mãe, advogada, teve de gozar a licença mínima, ficando o pai, funcionário público, em casa com as crianças: «Apesar de tudo, o sistema público é mais favorável ao gozo das licenças de parentalidade».

Não é só em Portugal que esta questão divide opiniões. Em Espanha, a ministra da Defesa Charme Chacón causou polémica, em 2007, ao tornar-se a primeira governante no país grávida em funções. Em Janeiro de 2009, também a ministra da Justiça francesa, Rachida Dati, chocou o país ao regressar ao trabalho apenas cinco dias após o parto.