Por Ana Suspiro, in iOnline
A Comissão Europeia estima que as reformas estruturais podem induzir um crescimento da economia portuguesa de até 4,6% em dez anos
Depois das dúvidas do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre a execução e o efeito das reformas estruturais que o governo diz já ter feito, a Comissão Europeia fez as contas ao impacto de uma agenda reformista na economia portuguesa e no emprego. Há pelo menos duas conclusões a reter.
A primeira é que se deve esperar algum tempo, os técnicos de Bruxelas partem de cinco anos, para avaliar a implementação e a produção de resultados. Esta premissa ainda é mais verdadeira quando se faz a avaliação de medidas de aumento do nível de qualificação dos trabalhadores. A segunda conclusão revela que os maiores ganhos potenciais para o crescimento da economia resultam de reformas nos mercados de produtos, sobretudo quando incidem na descida de margens das empresas, e logo dos preços.
As simulações realizadas pelos técnicos da Comissão Europeia no relatório da décima avaliação ao programa de assistência indicam que as reformas estruturais geram "grandes ganhos potenciais" que podem atingir a 3% do produto interno bruto (PIB) ao fim de cinco anos. A percentagem face ao nível de partida sobe para 4,6% do PIB em dez anos.
A curto prazo, as principais contribuições resultam das reformas no mercado do produto concentradas na descida das margens das empresas, com reflexos nos preços, mas que passam também por mais concorrência e uma regulação mais eficaz. Este factor representa mais de metade do crescimento induzido pelas reformas a cinco e a dez anos.
O FMI já tinha sublinhado que, na ausência de reformas estruturais, o fardo do ajustamento cairá excessivamente sobre os trabalhadores. Bruxelas também pede mais reformas para aumentar a concorrência, a flexibilidade laboral e transferir recursos dos sectores não transaccionáveis para os transaccionáveis.
A Comissão não é tão céptica como o FMI, mas admite que os resultados na economia são mistos. O relatório insiste que as medidas adoptadas são insuficientes para reduzir as rendas da electricidade e eliminar o défice tarifário até 2020 e avisa que pode ser preciso aumentar o preço real acima do previsto, chegando a 2% por ano. Bruxelas diz que há o risco da nova taxa sobre o sector passar para o consumidor e neutralizar o efeito de outras medidas para baixar o défice. O governo anunciou cortes adicionais para baixar custos na energia, mas terá de os explicar nesta avaliação.
Apesar de defender maior racionalização e eficácia da administração pública, a reforma do Estado fica de fora da avaliação ao impacto das reformas estruturais. O choque das alterações no mercado laboral também é positivo, mas demora mais tempo a produzir efeitos. As políticas activas de emprego e a transferência de impostos do rendimento do trabalho para o consumo são as iniciativas com mais impacto. As reformas que mais tempo demoram a dar resultados são as orientadas para o reforço da qualificação. No entanto, este é o vector que mais pesa no crescimento de 23% do PIB que a adopção de uma agenda reformista pode induzir num prazo de 50 anos.
As mexidas no mercado do trabalho poderiam conduzir ao crescimento adicional do emprego de 2,6% a cinco anos e de 2,9% a dez anos, face ao nível de 2013. Esta rubrica inclui mexidas na "generosidade" do subsídio do desemprego e incentivos à participação de alguns grupos no mercado do trabalho. Desviar os impostos do trabalho para o consumo e a baixa das margens das empresas também fazem crescer o emprego, concluem os técnicos da comissão que, no entanto, avisam que alguns resultados podem ainda não reflectir o efeito reformas recentes.