6.4.21

Investigadores esperam mudança de políticas públicas após sondagem

Christiana Martins, in Expresso

Pesquisa nacional vai permitir conhecer a real condição de vida das populações imigrantes e dos seus descendentes em Portugal

Em abril de 2019, especialistas reunidos pelo Governo discutiram a possibilidade de no próximo Censos — a realizar ainda no primeiro semestre deste ano — o INE perguntar se os residentes em Portugal se consideravam brancos, negros, ciganos ou asiáticos. O debate rachou ao meio o grupo de trabalho criado para discutir o assunto e, embora na altura tenham sido ouvidos peritos e até encomendada uma sondagem, o Instituto Nacional de Estatística decidiu que não avançaria com a pergunta inédita no país, comprometendo-se a realizar um inquérito nacional sobre as questões de discriminação étnico-racial e as origens da população.

Passados exatamente dois anos, o INE apresentou um projeto de inquérito-piloto a um novo grupo de trabalho, desta vez nomeado para apresentar até junho propostas sobre as temáticas da prevenção e combate ao racismo e à discriminação. A composição deste novo núcleo de especialistas é distinta da anterior, embora alguns dos elementos tenham participado nas duas discussões. Há uma semana, a secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, anunciou que o INE tinha já pronto um projeto de testagem do inquérito nacional e que um documento tinha sido apresentado ao grupo de trabalho para o combate à discriminação.

“Tivemos um prazo curto para avaliar o documento enviado pelo INE e não emitimos um parecer conjunto, embora alguns participantes tenham enviado os seus comentários ao ‘Inquérito às Condições, Origens e Trajetórias da População Residente’”, explica Jorge Malheiros, geógrafo e participante dos dois núcleos criados pelo Governo. Embora sublinhe a necessidade de se respeitar a independência e a capacidade técnica do INE, o professor da Universidade de Lisboa defende que para a preparação do projeto-piloto deveria ter sido ouvido um grupo reduzido de pessoas ligadas à área da discriminação étnico-racial.

O fundamental para Malheiros é que, “com este inquérito, o INE cumpre o compromisso assumido e avança com uma questão relevante da sociedade portuguesa, que desta forma terá de discutir os problemas da discriminação”. “Este projeto é difícil e sensível, mas representa um salto para a estatística nacional, acabando com o argumento de que não existe informação estatística oficial para se avançar com políticas públicas positivas de combate à desigualdade”, completa.

“Esta é uma primeira iniciativa e é importante porque em Portugal faltam dados sobre a composição étnica da população imigrante, que tem vindo a se intensificar nas últimas décadas e através deste inquérito será possível perceber as trajetórias dos seus integrantes e descendentes na sociedade portuguesa”, afirma Nuno Filipe Oliveira, do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia e membro do grupo de trabalho para a Prevenção e o Combate ao Racismo e à Discriminação. “Pela primeira vez, esse inquérito dará uma radiografia aproximada da diversidade social de Portugal e, sobretudo, da evolução no tempo dessas trajetórias, comparando as condições das várias comunidades”, completa o investigador.