por Cristina Sambado, in RTP
A guerra na Ucrânia e a consequente desaceleração da economia atiraram para a pobreza mais quatro milhões de crianças, só na Europa de leste e Ásia central. No Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, a UNICEF adverte que situação pode levar a um acentuado aumento do abandono escolar e da mortalidade infantil.
Um estudo da UNICEF publicado esta segunda-feira, que analisa o impacto da guerra na Ucrânia e a subsequente recessão económica e pobreza infantil na Europa de leste e Ásia central – que representa 22 países nas regiões –, revela que as crianças estão a suportar o fardo mais pesado da crise económica provocada pela invasão russa da Ucrânia, a 24 de fevereiro."Embora as crianças representem 25 por cento da população (dessa região), representam também quase 40 por cento dos 10,4 milhões de pessoas que passaram este ano a viver na pobreza", acrescenta a análise.
A Federação Russa é responsável por quase três quartos do aumento total das crianças que vivem na pobreza devido à guerra na Ucrânia e ao crescimento do custo de vida em toda a região.
Na Rússia, mais de 2,8 milhões de crianças vivem agora em agregados familiares abaixo do limiar da pobreza.
A Ucrânia surge a seguir na lista, com mais meio milhão de crianças a viver na pobreza, à frente da Roménia, que tem agora mais 110 mil crianças pobres.
“Para além dos horrores óbvios da guerra - a morte e mutilação e a deslocação em massa – consequência do conflito militar na Ucrânia estão a ter um impacto devastador nas crianças em toda a Europa de leste e Ásia central”, afirmou o diretor regional da UNICEF, Afshan Khan.
Segundo Afshan Khan, “as crianças dessas regiões estão a ser prejudicadas pelos terríveis efeitos da guerra. Se não as apoiarmos e às famílias, o acentuado aumento da pobreza infantil resultará quase certamente em vidas e aprendizagem perdidas, assim como os futuros”.
O estudo da UNICEF revela ainda que as consequências da pobreza infantil vão muito além das famílias que vivem com dificuldades financeiras. O acentuado aumento poderá resultar na morte de mais de 4.500 crianças antes de celebrarem o seu primeiro aniversário. Já as perdas de aprendizagem podem equivaler ao abandono escolar de mais de 117 mil crianças, só este ano.
Quanto mais pobre for a família, maior será a proporção do seu rendimento comprometida com necessidades como a alimentação e o combustível.
Quando o custo dos bens básicos sobe, diminui o dinheiro disponível para satisfazer outras necessidades, tais como cuidados de saúde e educação.
O estudo frisa que “a subsequente crise do custo de vida significa que as crianças mais pobres têm ainda menos probabilidades de aceder a serviços essenciais e estão mais expostas ao risco de violência, exploração e abuso”.
Para muitos, a pobreza infantil dura uma vida inteira. Uma em cada três crianças nascidas e criadas na pobreza viverão a sua vida adulta nesta situação, o que leva a um ciclo intergeracional de dificuldades e privações.Apelo aos governos
Os desafios enfrentados pelas famílias que vivem na pobreza ou à beira da pobreza agravam-se quando os governos reduzem a dívida pública, aumentam os impostos sobre o consumo ou põem em prática medidas de austeridade num esforço para impulsionar as economias a curto prazo, uma vez que isso diminui o alcance e a qualidade de serviços de apoio dos quais as famílias dependem.
O estudo estabelece um quadro para ajudar a reduzir o número de crianças que vivem na pobreza e evitar que mais famílias caiam em dificuldades financeiras:
- Proporcionar benefícios monetários universais às crianças e garantir um rendimento mínimo de segurança;
- Expandir as prestações de assistência social a todas as famílias com crianças necessitadas, incluindo refugiados;
- Proteger as despesas sociais, especialmente para as crianças de famílias mais vulneráveis;
- Proteger e apoiar a prestação de serviços de saúde, nutrição e assistência a mães grávidas, bebés e crianças em idade pré-escolar;
- Introduzir regulamentos de preços sobre produtos alimentares básicos para as famílias.
A UNICEF estabeleceu recentemente uma parceria com a Comissão Europeia para a iniciativa UE Child Guarantee que visa mitigar o impacto da pobreza nas crianças e proporcionar-lhes oportunidades de prosperar na vida adulta.
Com mais crianças e famílias a serem empurradas para a pobreza, é necessária uma resposta robusta em toda a Europa.
A UNICEF apela, ainda, a um apoio contínuo e alargado para reforçar os sistemas de proteção social nos países de alto e médio rendimento da Europa Oriental e Ásia Central; e a priorização do financiamento de programas de proteção social, incluindo programas de assistência monetária para crianças e famílias vulneráveis.
“As medidas de austeridade irão prejudicar sobretudo as crianças – mergulhando ainda mais crianças na pobreza e dificultando as famílias que já estão a lutar”, acrescentou Khan.
“Temos de proteger e expandir o apoio social às famílias vulneráveis antes que a situação de agrave”, apelou.