Por Eduardo Oliveira Silva, in iOnline
Não podemos aceitar que os medos se instalem para sempre
O medo passou a ser o companheiro mais presente da maioria dos portugueses, substituindo o excesso de confiança que alguns protagonizaram em finais dos anos 80 e em quase toda a década de 90 de forma um tanto irresponsável, como se vê agora.
Hoje todos temos medo de qualquer coisa, consoante a nossa idade, profissão ou núcleo familiar. A reflexão sobre esse medo ocupa sistematicamente a nossa cabeça.
Para quem já perdeu o emprego, há o medo de deixar de receber as prestações sociais com que conta para atenuar o pesadelo e o pavor de não voltar a arranjar trabalho. Esse medo gera por vezes a força de pegar na trouxa e zarpar, coisa que não deixa de se fazer sempre com algum medo do que se vai encontrar noutras paragens, próximas ou distantes.
Há o medo de quem tem trabalho mas vive a pensar no drama por que pode passar se a empresa acaba ou deixa de pagar. Há o medo dos reformados e dos que vivem de magros subsídios de os verem cortados mais uma vez ou de os perderem definitivamente. E há talvez o pior de todos os medos: ficar sem recursos, apoios e um mínimo de condições e de atenção na velhice ou na fase terminal da vida.
Há o medo angustiante daqueles que não temem por si mas pelo que pode acontecer aos filhos ou aos pais, a que somam a angústia de não ter condições para lhes valer na dificuldade ou na doença.
Há o medo de perder a saúde e saber que já não se pode contar com um sistema que era tido como exemplar e que hoje se vai reduzindo e restringindo, chegando ao ponto de afectar doentes crónicos.
Há o medo de não poder pagar a casa, as prestações das coisas ou, no limite, o medo de que o sistema bancário e financeiro praticamente virtual em que vivemos se afunde.
Há o medo de assumir posições fora do politicamente correcto porque se pode ser enxovalhado à direita ou à esquerda com violência inaudita e normalmente cobarde e anónima, como a que se pratica através da net.
São apenas exemplos entre os muitos possíveis os que se referem aqui ao correr das teclas e sem procurar sequer hierarquizá-los.
Já vão longe os anos 90, em que os medos praticamente se limitavam à morte, à saúde pessoal ou da família, porque a ideia é que tudo iria sempre crescendo, se não exponencial pelo menos regularmente.
A época dos medos não é, naturalmente, um exclusivo português, mas há que reconhecer que talvez em toda a Europa do euro somos os mais nitidamente pessimistas, depois de termos sido induzidos a um optimismo tão frenético como artificial por um sistema financeiro ganancioso e uma classe política globalmente incompetente para vislumbrar o que aí vinha.
Hoje já aprendemos quase todos a viver com os novos medos, mas se há coisa que não podemos fazer é aceitar que eles se instalaram em nós para sempre. Alguma coisa tem mesmo de se fazer para ganharmos uma confiança responsável no futuro.