5.8.20

Depois do Pingo Doce, vídeo denúncia comida no lixo de super da Auchan

Ana Marcela, in Dinheiro Vivo

Face às dificuldades de recolha das doações sentidas pelas IPSS, Auchan está a reorganizar para garantir que tem sempre instituições disponíveis. 

Depois de terem denunciado num vídeo que comida prestes a terminar o prazo estava a ser atirada para o lixo por um supermercado do Pingo Doce em Lisboa, Hugo Breda e João Relógio, da produtora Swag On, voltaram a fazer uma ronda pelos supermercados da cidade e, mais uma vez, encontraram alimentos em condições para consumo no lixo, desta vez da Auchan. A cadeia assegura que a “redução do desperdício é um compromisso da Auchan Retail Portugal” e que, face às dificuldades das IPSS, geradas pela pandemia, em recolher as doações, estão a reorganizar para garantir ter “sempre associações disponíveis para a doação.”

“Ontem fomos dar mais uma volta (pelos supermercados), chegamos a uma loja do Auchan e é melhor ver o vídeo”, diz Hugo Breda. O vídeo, que só no Instagram já acumula cerca de 39 mil visualizações, mostra pacotes de saladas, vários quilos de legumes e fruta retirados de um contentor de lixo de um supermercado da Auchan, em Lisboa. A situação encontrada, acredita Hugo Breda, “é um pouco mais recorrente do que as grandes superfícies querem achar. Por mais esforços que façam há muito a ser feito. Isto é uma gota no oceano”. 

O número de mensagens que recebeu desde que publicou um vídeo a denunciar o ocorrido num supermercado do Pingo Doce leva-o a acreditar que, efetivamente, há muito a fazer no que se refere ao combate ao desperdício no retalho alimentar. “Recebemos mensagens de muitos colaboradores, e não só do Pingo Doce, a dizer que isto é prática comum diária. Que são obrigados a deitar lixívia para contentores, a trancá-los, a deitar detergente em pó para evitar que vão lá pessoas buscar comida”, descreve. “Não podem levar comida para casa. Temos relatos de pessoas que se despediram de lojas porque não conseguiam compactuar mais com isso. De todas as cadeias”, assegura. 

“Não temos a informação toda do nosso lado, não somos especialistas no assunto, isto foi quase uma bomba que nos explodiu nas mãos por acaso, certamente haverá pessoas que terão respostas ou teses sobre este assunto. Nós só demos um testemunho”, diz João Relógio, referindo que aguardam resposta de algumas organizações que fazem recolha de alimentos, que contactaram depois da avalanche de mensagens que receberam com pedidos de ajuda e oferta de voluntariado. 

“Temos do nosso lado centenas de pessoas a se oferecerem para voluntariado a pedirem mais informações, temos centenas de testemunhos de colaboradores e ex-colaboradores horríveis de se ler, centenas de mensagens de pessoas e famílias à beira do desespero a nos tratarem como salvadores e a nos pedirem comida. E nós não queremos fazer isto, não queremos ir ao lixo, não é digno de ninguém, nem seguro”, diz João Relógio.

“Isto é um acaso na nossas vidas, quisemos foi mostrar com este acaso que este é um problema um bocadinho maior do que pensamos. Este é um assunto sério. Estamos a falar da sobrevivência de pessoas, a comida tem de ser tratada quase como sagrada e não como possível lixo”, lamenta Hugo Breda. 

O que diz a Auchan? 

“A redução do desperdício é um compromisso da Auchan Retail Portugal. Por isso mesmo, procuramos sempre novas soluções que combinem a prevenção de desperdícios alimentares com a conveniência do melhor preço para o consumidor, sem prejuízo da qualidade dos produtos”, reage fonte oficial do retalhista, quando contactada pelo Dinheiro Vivo. 

Um combate ao desperdício que passa por doações, a entidades como a Refood e a Dar i Acordar, “que servem de intermediários com as associações, sendo facilitadores nestas doações de produtos em aproximação de fim de validade”. O ano passado, a cadeia doou 2,4 mil toneladas de produtos alimentares, num total de mais de 2,5 milhões de euros, a cerca de 80 IPSS e 30 associações de apoio a animais. 

Mas, face ao impacto disrutivo da pandemia no circuito, está a reorganizar. “Neste contexto específico de pandemia, verificamos que, em situações pontuais, algumas das IPSS com que temos uma parceria estão a ter dificuldades em recolher os alimentos. Nestes casos específicos, estamos a reorganizarmo-nos no sentido de garantirmos que temos sempre associações disponíveis para a doação”, adianta fonte oficial. 

Recentemente, firmaram uma parceria com a Too Good To Go, a aplicação que combate o desperdício alimentar, para a venda de excedentes alimentares em Magic Boxes. “Disponibilizamos as Magic Boxes em 32 Hiper/Supers e 26 lojas de proximidade (MyAuchan). Este projeto arrancou na Auchan de Almada em novembro de 2019, em teste, e foi desmultiplicado nas restantes, em junho deste ano. Conseguimos já salvar cerca de 8 mil refeições e evitámos a emissão de 20 mil kg CO2 equivalentes”. 

Estão igualmente a promover a venda de produtos de economia circular. “É o caso do bolo de banana, vegan, disponível em todas as lojas de fabrico próprio, que é feito com as bananas demasiado maduras da loja. Temos também disponível a venda de pão do dia anterior, para culinária, com desconto, bem como de pão ralado, feito com pão com mais de dois dias”, refere. 

Para diminuir o número de alimentos desperdiçados, a Auchan tem em marcha o projeto Desperdício Zero. Uma estratégia que passa por “uma oferta comercial que oferece ao cliente a possibilidade de comprar apenas a quantidade que necessita, como a venda avulso, a venda na área self-discount de frutas e legumes com características estéticas que, por norma, retiram estes produtos do circuito comercial, e a venda de produtos cuja data de validade se aproxima do fim a preços de desconto, identificados com uma etiqueta laranja”. Mas, também, por uma “gestão operacional rigorosa (como o controlo da temperatura dos alimentos) para minimizar qualquer desperdício e apostamos na formação e sensibilização dos colaboradores para esta questão.” 

A cadeia tem ainda um “serviço que contratualizamos a uma empresa de valorização de resíduos, que recolhe alguns dos nossos excedentes, sendo estes usados para produzir ração de animais, fertilizantes, entre outros fins.”