Raquel Martins e Pedro Crisóstomo, in Público on-line
Regras do teletrabalho voltam a mudar em 121 concelhos. Se as empresas alegarem que não têm condições para adoptar este regime e se o trabalhador discordar, decisão final caberá à Autoridade para as Condições de Trabalho. Confira aqui as principais alterações.
Trabalho numa empresa num dos 121 concelhos com maior risco de contágio da covid-19, sou obrigado a ir para casa em teletrabalho?
A proposta de lei torna obrigatória a adopção do teletrabalho em todas as empresas situadas nos territórios em que a situação epidemiológica o justifique, desde que as funções em causa o permitam e o trabalhador disponha de condições para as exercer. Assim, nas próximas duas semanas, o teletrabalho será obrigatório em 121 concelhos e essa lista será actualizada de 15 em 15 dias.
E se morar num dos concelhos de risco mas o meu local de trabalho ficar noutro concelho, também tenho de ficar em teletrabalho?
O diploma fala em trabalhadores que residam ou trabalhem nos concelhos de risco, pelo que a resposta é sim.
É preciso acordo escrito entre o empregador e o trabalhador?
Não. O diploma não exige acordo escrito entre o empregador e o trabalhador. Mas já para recusar o teletrabalho, seja da parte da empresa ou do trabalhador, é necessário fazê-lo por escrito.
Tenho de assinar alguma adenda ao meu contrato?
Pedro da Quitéria Faria, sócio da Antas da Cunha Ecija & Associados, considera que não. “A proposta de lei levada aos parceiros sociais é clara na desnecessidade de celebração de qualquer adenda para efeitos da passagem ao regime de laboração em teletrabalho”, justifica.
A empresa pode entender que não há condições para aplicar o teletrabalho, mesmo situando-se num dos concelhos listados? Sou obrigado a ir presencialmente à empresa?
Se uma empresa entender que não estão reunidas as condições para a adopção do teletrabalho, terá de comunicar “fundamentadamente e por escrito” ao trabalhador, cabendo-lhe demonstrar que as funções não são compatíveis com esta modalidade ou que não tem “condições técnicas mínimas” para o fazer. A proposta de diploma prevê que estas situações sejam excepcionais e permite que o trabalhador, nos três dias úteis após receber a comunicação, peça a intervenção da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), a quem caberá verificar os factos invocados pela empresa e tomar uma decisão no prazo de cinco dias úteis.
No último confinamento estive em teletrabalho, mas agora a empresa diz que não o vai adoptar, mesmo estando nos territórios de risco. O que posso fazer?
Quando os trabalhadores pedem a intervenção da ACT, esta inspecção faz uma avaliação dos argumentos da empresa para não aplicar o teletrabalho e a decisão tem em conta a actividade para a qual o trabalhador foi contratado e o exercício anterior da actividade em regime de teletrabalho ou através de outros meios de prestação de trabalho à distância. Ou seja, se anteriormente a função foi desempenhada de forma remota, é natural que agora possa igualmente ser.
O que acontece se a empresa não cumprir a decisão da ACT?
O incumprimento da decisão da ACT é considerado uma contra-ordenação grave e a empresa pode ser condenada a coimas que oscilam entre os 612 e os 4080 euros, em caso de negligência, e entre os 1326 e os 9690 euros, em caso de dolo.
O empregador pode obrigar-me a ficar em teletrabalho?
O diploma prevê que o trabalhador que não dispõe de condições para exercer as funções em teletrabalho deve informar o empregador, por escrito, dos motivos do seu impedimento.
Trabalho numa fábrica e não posso fazer teletrabalho. O que é que a empresa deve fazer para minimizar os riscos de contágio?
As empresas devem garantir que os locais de trabalho têm condições de higiene e segurança, assegurando o distanciamento entre os trabalhadores (reorganizando os espaços, se for preciso) ou prevendo a higienização e a desinfecção das superfícies. No caso das empresas com 50 ou mais trabalhadores dos concelhos com maior risco de contágio, a lei obriga a medidas especiais. Os empregadores têm de desfasar as horas de entrada e saída entre 30 minutos a uma hora (o trabalhador pode recusar se provar que há um prejuízo sério); nos locais de trabalho, devem criar equipas “estáveis” para diminuir o contacto entre grupos ou departamentos, devem alterar as pausas para as refeições e para descanso. Se o distanciamento não for possível por causa da natureza da actividade laboral, cabe às empresas disponibilizar o “equipamento de protecção individual adequado”.
Nos concelhos fora das zonas de risco o teletrabalho é obrigatório?
Não, o teletrabalho só é obrigatório nos 121 concelhos onde o risco de contágio é maior (essa lista está publicada em Diário da República e poderá mudar quando for revista dentro de quinze dias).
Trabalho e moro num território fora da lista dos 121 concelhos, mas preferia fazer teletrabalhado. O que posso fazer?
Se, por precaução, um trabalhador preferir fazer teletrabalho nesta fase mesmo não estando num concelho de risco, terá de chegar a acordo com a empresa. Aqui aplica-se a regra geral do Código do Trabalho, em que esta modalidade é possível se houver um entendimento entre o empregador e o trabalhador. Neste caso, esse acordo tem de ficar por escrito (pode ser assinada uma adenda ao contrato). Há casos em que a empresa não pode recusar o teletrabalho (já era assim antes da pandemia), como acontece com um trabalhador que tenha um filho com idade até três anos (se a actividade for compatível e a empresa tiver recursos para o teletrabalho).
Quem é responsável pelo pagamento das despesas inerentes ao teletrabalho?
A proposta de lei apenas refere que o empregador deve disponibilizar os equipamentos de trabalho e de comunicação necessários à prestação do teletrabalho. Quando isso não for possível, e com o acordo do trabalhador, o teletrabalho pode ser realizado através dos meios do próprio trabalhador, competindo à empresa assegurar a devida programação e adaptação às necessidades.
Relativamente ao pagamento de despesas inerentes ao teletrabalho, como a luz ou a internet, a lei não diz de forma expressa quem as deve assumir. “Na falta de estipulação no contrato, presume-se que os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação utilizados pelo trabalhador pertencem ao empregador, que deve assegurar as respectivas instalação e manutenção e o pagamento das inerentes despesas”, defende o advogado Pedro da Quitéria Faria, acrescentando que é lícito que as partes possam celebrar uma adenda, onde se preveja quem será o responsável pelo pagamento das despesas de consumo e utilização.
Mantenho o direito ao subsídio de refeição?
Sim, no diploma que deverá entrar em vigor na quarta-feira, fica claro que o trabalhador mantém “o direito a receber o subsídio de refeição que já lhe fosse devido”. Logo em Abril, quando a questão se colocou pela primeira vez, o Ministério do Trabalho tinha deixado claro que essa é a interpretação que resulta da lei. Segundo a Direcção Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT), isso deve ser garantido, salvo se houver uma “disposição diferente resultante de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável ou contrato individual para prestação subordinada de teletrabalho”.
Perco alguns direitos?
O teletrabalho confere os mesmos direitos que o trabalhador já tinha quando exercia as funções presencialmente no posto de trabalho. Entre eles, está o direito à remuneração, os limites do período normal de trabalho, segurança e saúde no trabalho e reparação de danos por acidente laboral ou doença profissional.
A minha empresa tem mais de 50 trabalhadores, o teletrabalho não é possível porque é uma fábrica e não faz parte dos 121 concelhos. O que muda com as novas regras?
Depende do concelho. Se a empresa pertencer à área metropolitana do Porto ou à de Lisboa, nada muda face ao que já se aplicava desde Setembro, quando as empresas com 50 ou mais trabalhadores nos locais de trabalho já tinham de desfasar os horários de entrada e saída. Se a empresa pertencer a um dos concelhos agora incluídos na lista do Governo (como a Figueira da Foz ou Castelo Branco, por exemplo), terá de cumprir o regime transitório de reorganização dos horários entre 30 minutos a uma hora, alteração a que não estava obrigada até agora.
Em que dia entram em vigor estas medidas?
As regras do teletrabalho obrigatório nestes concelhos aplicam-se a partir de 4 de Novembro, a partir das 0h. Para já, estarão em vigor até às 23h59 de 15 de Novembro, sendo que o Governo decidirá entretanto o que se passará a seguir.